Faust @ Teatro Maria Matos, 06/10/2010
Antes de mais convém esclarecer que a formação dos Faust que anteontem aterrou no palco do Maria Matos, e que integra os fundadores Werner "Zappi" Diermaier e Jean-Hervé Péron, é aquela que hoje é legitimada como representante da lenda krautrock dos idos de setenta. Sim, porque, paralelamente e sem quaisquer conflitos, Jochen Irmler lidera outro colectivo com a mesma designação. A acompanhar a dupla de históricos, o casal James Johnston (sim, o dos Gallon Drunk) e Geraldine Swayne (manipuladora electrónica e também pintora que teve ocasião de mostrar a sua arte) são o sangue novo que catapulta a radicalidade dos veteranos para níveis pouco vistos por palcos lusos.
Catalogar a música dos Faust simplesmente como krautrock (eles, tal como outros congéneres, sempre rejeitaram tal rótulo) é simplesmente redutor. Quem acorreu ao MM, pôde constatar in loco um dos mais subversivos espectáculos aparentados de rock à face da Terra. Para o caos controlado, a partir de uma matriz rock, convergem linguagens como o free-jazz, o noise desenfreado, a electrónica mais radical, o industrialismo levado à letra pelo recurso a betoneiras, berbequins, lixadoras, e chapas de metal, e um sentido libertário que não se deixa prender a estereótipos estilísticos. Mas um concerto dos Faust é ainda pluridisciplinar. Pelo menos na quarta-feira, a juntar ao desafio desta música revolta, houve ainda demonstrações de pintura e de artes performativas. Jean-Hervé é o mestre de cerimónias. Ele canta, berra, declama panfletos sócio-políticos, provoca, desafia, e ainda manobra as referidas máquinas. Por complemento, na sua discrição, o imponente Zappi é o barómetro que pauta todo o andamento com a batida de uma precisão maquinal. Neste festim incatalogável, a dupla mais jovem assume um papel que vai muito além do de meros figurantes. Ele, mais na guitarra mas também nos teclados, é o rocker de serviço e o elo a alguma normalidade que nos prende à superfície; ela, mais na manipulação sonora mas também na guitarra, exibe rebelia equiparável à dos mestres. Ao fim de quase duas horas, com direito a dedicatórias pouco ortodoxas a Bob Dylan, sobrevive-se ao confronto com os sentidos saciados em pleno. De tal forma que o disparatado começo com o declamador Tiago Gomes, misto de Luxúria Canibal (na verborreia) e La Ciccone da fase cowgirl (nos adereços), estava já alojado nas memórias distantes.
4 comentários:
Aparte os devaneios metalomecânicos e de construção civil (pronto, não seria bem um concerto, mas mais uma performance, mas não é coisa que me entusiasme por aí além), foi um excelente concerto. Valeu também pela subversão e aquele ritmo da bateria e a leadership da guitarra foi imparável.
Achaste o declamador parecido com a Madonna? Eu diria que pelo porte e cabeleira, nos primeiros momentos que o vislumbrei ainda continuei a pensar no Adolfo. Mas faltava-lhe a inconfundível pronúncia do Norte.
Um abraço
Parecido com a Madonna? Não! Foi o tal adereço na cabeça que me fez lembrar essa dama.
Abraço.
Haha! Eu sei, mas estava só a entrar contigo por causa da comparação algo improvável... a mim nunca me teria ocorrido. ;)
Um abraço
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