"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

sábado, 28 de fevereiro de 2009

10 anos é muito tempo #12



















BUILT TO SPILL
Keep It Like A Secret
[Warner Bros., 1999]

Falar dos Built to Spill (BtS) é falar de Doug Martsch, mentor, único membro permanente, e músico/compositor de inúmeros recursos. Debutantes discretos em pleno período de vigência do grunge, os BtS souberam ao longo destes anos cimentar-se como uma das forças vitais do indie rock norte-americano. Hoje, é um mistério como é possível uma banda que assina obras-primas com a mesma frequência com que obtém falhanços comerciais permanecer no catálogo de um dos mais poderosos grupos editorias do mundo. Nem tudo vai mal na toda-poderosa indústria discográfica...
Ao contrário do habitual, para a gravação de Keep It Like A Secret transita a formação que havia registado o igualmente mui recomendável Perfect From Now On (1997). O midas do indie rock Phil Ek permanece também no lugar de produtor. Eventualmente na tentativa de agradar aos executivos da Warner, a primeira metade de Secret expõe uma faceta exuberantemente pop até aqui desconhecida nos BtS. Os temas são curtos, directos, e viciosamente apelativos, mas em nada beliscam a identidade da banda, comumente vista como "difícil". Para a segunda parte do disco ficam guardados os longos épicos, desta feita subtraídos dos conhecidos devaneios em regime jam que valeriam a Martsch o epíteto de guitar hero, não tivesse esta expressão uma conotoção habitualmente pejorativa. Aparentemente um disco de dupla personalidade, Secret é, no entanto, profundamente coeso, tanto pela simplificação do método compositivo, como pelas letras - misteriosas e enigmáticas - de Martsch.
É vossa/nossa obrigação desobedecer à ordem do título e revelar este segredo ao mundo.


quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Quase no fim da espera
















De uma banda que tem como mote Keep folks waiting... since 1989!, notícias como esta são uma raridade e motivo de celebração para os seus (poucos) seguidores: os The Wrens estão em estúdio a preparar um novo disco. A editora do grupo garante mesmo que planeia lançá-lo em finais da Primavera. Este será apenas o quarto álbum em 20 anos desta banda de New Jersey que se distingue pelo acentuado teor literário das letras de Charles Bissell, um observador atento das minudências do quotidiano. Enquanto não chega, recorda-se um dos muitos pontos altos da obra-prima The Meadowlands.


[Absolutely Kosher, 2003]

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Toca & Foge em 20 passos









Com esta notícia, a malfadada crise económica começa a deixar-me preocupado. Seja o que for que o futuro nos reserve no médio e longo prazo, para já, nem tudo são desgraças: a Touch and Go assegura que a edição do primeiro álbum dos fabulosos Crystal Antlers está salvaguardada.
Nesta hora de incertezas, e em jeito de resumo dos 28 anos de edições do selo de Chicago, decidi elaborar o meu Top 20 T&G de sempre, ao qual acrescento um "postal ilustrado". Para já, recuso a ideia de que este post seja um epitáfio a uma das três melhores editoras independentes da América do Norte.

01. SLINT Spiderland [1991]
02. SHELLAC At Action Park [1994]
03. GIRLS AGAINST BOYS Venus Luxure No. 1 Baby [1993]
04. BIG BLACK Songs Abou Fucking [1987]
05. BUTTHOLE SURFERS Locust Abortion Technician [1987]
06. TV ON THE RADIO Young Liars EP [2003]
07. POLVO Exploded Drawing [1996]
08. THE JESUS LIZARD Goat [1991]
09. BLONDE REDHAEAD Melody Of Certain Damaged Lemons [2000]
10. SHELLAC 1000 Hurts [2000]
11. NINA NASTASIA The Blackened Air [2002]
12. BRAINIAC Hissing Prigs In Static Couture [1996]
13. CRYSTAL ANTLERS Crystal Antlers EP [2008]
14. THE BLACK HEART PROCESSION Amore Del Tropico [2002]
15. RAPEMAN Two Nuns And A Pack Mule [1988]
16. URGE OVERKILL Stull EP [1992]
17. YEAH YEAH YEAHS Yeah Yeah Yeahs EP [2002]
18. THE JESUS LIZARD Liar [1992]
19. BUTTHOLE SURFERS Hairway To Steven [1988]
20. THE FOR CARNATION The For Carnation [2000]

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Duetos #10


Tecnicamente, não deveria classificar como dueto um tema em que a participação feminina se resume a uns sussurros em francês. Mas que se lixe o rigor técnico! Qualquer desculpa é válida para postar este belo vídeo ao melhor estilo nouvelle vague, numa descarada homenagem à obra de Alain Resnais. Um ano depois, este mesmo tema conheceria nova versão, com a estrela da chanson Françoise Hardy a tomar o lugar da moça da gravação original.


Blur w/ Lætitia Sadier "To The End" [Food, 1994]

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Em escuta #37

Novo formato para esta rubrica, com resenhas mais breves.









ASOBI SEKSU Hush [Polyvinyl, 2009]

Apesar de serem frequentemente comparados aos saudosos Lush, parece-me faltar na música dos nova-iorquinos Asobi Seksu (sexo fortuito, em japonês) a densidade que caracterizava os primeiros discos da banda de Miki Berinyi. Neste terceiro álbum, mais do que nunca, nota-se uma ostensiva colagem à pop soporífera dos Blonde Redhead mais recentes (vocalista de origem nipónica incluída), a piscar o olho aos pretensiosismos entediantes que associamos à editora 4AD. Nos dois últimos temas, que fogem à modorra dominante, Hush é salvo por um triz do desatre absoluto: "Me & Mary, com a incursão despudorada das guitarras, e "Blind Little Rain", deliciosamente sinistro.


...AND YOU WILL KNOW US BY THE TRAIL OF DEAD The Century Of Self [Justice, 2009]

Já não restam dúvidas que os músicos dos Trail of Dead são tecnicamente irrepreensíveis. A constatação deste facto só torna mais dispensável este terceiro mergulho consecutivo na pretensa complexidade a pender para o progressivo, onde não faltam as gritarias politizadas e as habituais referências a civilizações ancestrais. No capítulo das novidades, trazem apenas um assomo a esse outro monstro designado por rock celta (cf. "Isis Unveiled"). Na generalidade, mais do mesmo de uma banda que, após o superlativo Source Tags & Codes, tem vindo a desenhar o rasto da própria morte criativa.


JE SUIS ANIMAL Self-Taught Magic From A Book [Perfect Pop / Angular, 2008]

Ao segundo disco - o primeiro, homónimo, conheceu apenas edição entre-muros - os noruegueses Je Suis Animal afirmam-se como mais um nome válido na recuperação das estéticas que marcaram o período áureo do indie pop. Self-Taught... viaja até a um momento imaginário em que os McCarthy de Tim Gane e Lætitia Sadier se metamorfoseiam nos Stereolab. Com os primeiros partilham uma notória ingenuidade, com os segundos a profusão intrumental e as referências francófonas. A bela voz de Elin Grimstad faz-nos crer que este conjunto de canções deliciosas não seriam corpo estranho no catálogo da Sarah Records. Tudo boas referências...


SURF CITY Surf City EP [Arch Hill, 2007 / Morr Music, 2008]

Não obstante o seu distanciamento geográfico e a fraca expressão demográfica, a Nova Zelândia é, desde há décadas, pátria de um significativo número de bandas queridas do público indie ocidental. Estes Surf City prometem, para já, manter viva a chama da melhor pop produzida no país dos kiwis. Tal como os seus antepassados, são orgulhosos praticantes da filosofia DIY. Nestas seis breves canções frenéticas, conjugam na perfeição as guitarras surf, o psicadelismo pop dos Zombies, e a urgência delirante que nos atraiu nos Arcade Fire de outros tempos. Pede-se-lhes um álbum urgentemente.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Discos pe(r)didos #23


















THE HOUSE OF LOVE
The House Of Love [Creation, 1988]

Em 1988 a nação indie recupera ainda do fim abrupto dos Smiths. A rispidez das guitarras e das palavras dos Wedding Present poderão não servir de substituinte à medida das sensíveis canções da dupla Morrissey & Marr. Por seu lado, os londrinos House of Love (HoL) parecem cumprir os principais requisitos para acolher tão vasta orfandade: Terry Bickers é um guitarrista de imensos recursos, e Guy Chadwick é um letrista/vocalista capaz de insuflar de um extremo romantismo dramático os três minutos de duração de uma canção pop.
House Of Love, o álbum de estreia, é manifestação de uma banda de ambição desmedida, muito para além do exíguo reduto dos tops independentes. Abre com aquele que é um dos temas mais conhecidos da banda e único single extraído do álbum. Na distorção da guitarra e na saturação da voz, "Christine" antecipa a cena shoegazer em dois anos. Como veículo promocional, o tema mereceu um "não-vídeo" feito de sombras e imagens em câmara-lenta que, desde o primeiro visionamento no saudoso Rockin' in UK, é objecto de culto por parte deste escriba. Já "Road" é mais melodioso, embora carregue nas palavras a subversão do incitamento à alienação pela estrada fora. "Man To Child" é a Lolita de Nabokov revista à luz dos Bunnymen. O espírito da banda de Ian McCulloch, na sua vertente bigger than life, volta a assomar em "Happy" e "Fisherman's Tale". Movida por uma guitarra circular, e com vários clímaxes abortados, "Love In A Car" é a peça central dos disco e, também, o expoente máximo de uma certa carga erótica que perpassa todas as dez canções. Ou não tivesse o nome dos HoL origem num romance de Anaïs Nin... Após as últimas notas do implorante "Touch Me", enfeitiçados pela imensa beleza contida nos escassos 32 minutos de música, não nos resta outra alternativa senão carregar de novo no botão do play...

Na eventualidade de haver desse lado potenciais interessados em investir na aquisição deste disco sublime, aconselho-vos a não optarem pela recente reedição da Renascent. A compilação 1986-88: The Creation Recordings parece-me ser uma opção mais acertada, pois, além do álbum, contém todos os outros temas (singles e b-sides) editados pelos HoL na editora de Alan McGee, num total de 23 temas. Entre eles, a primeira (e melhor) versão do hit "Shine On" e o delicioso "Destroy The Heart".

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Juventude eterna















Foto: Andrew Kesin

Já não será novidade para ninguém o fim do vínculo contratual dos Sonic Youth (SY) com a Geffen e o consequente regresso ao meio independente com a presente ligação à Matador Records. O primeiro lançamento da mítica banda pela não menos mítica editora nova-iorquina será o álbum The Eternal, com lançamento previsto para 9 de Junho próximo (supõe-se que na Europa ocorra com um dia de antecedência). À semelhança do último Rather Ripped (2006), este novo disco conta com a produção conjunta da própria banda e John Agnello (que já trabalhou com The Hold Steady, Oxford Collapse, Dinosaur Jr., e The Ponys, entre outros). Para além da editora, The Eternal traz também a novidade da estreia do ex-Pavement Mark Ibold em estúdio, na qualidade de membro em full-time (até aqui fazia parte da formação de palco), e das vocalizações conjuntas de Kim Gordon, Thurston Moore e Lee Ranaldo em, pelo menos, um tema. A capa, que se reproduz mais abaixo juntamente com o alinhamento, reproduz uma pintura da autoria do lendário guitarrista John Fahey.

Entretanto, e até 26 de Abril, está já patente em Dusseldorf, na Alemanha, a exposição Sonic Youth Etc.: Sensational Fix, uma espécie de retrospectiva das actividades multi-displinares desenvolvidas pelos SY desde a sua formação, em 1981. A partir de finais de Maio, e até Setembro, a exposição ruma a Malmö, na Suécia, estando ainda aberta a possibilidade de passagem por outras cidades europeias (à atenção dos programadores do Museu de Serralves, digo eu). Sensational Fix é também o nome do livro alusivo à exposição, o qual se faz acompanhar de dois discos de 7" com quatro inéditos compostos em separado por cada um dos membros dos SY (Ibold excluído, obviamente). A edição está prevista para inícios do próximo mês.


01. Sacred Trickster
02. Anti-Orgasm
03. Leaky Lifeboat (for Gregory Corso)
04. Antenna
05. What We Know
06. Calming The Snake
07. Poison Arrow
08. Malibu Gas Station
09. Thunderclap For Bobby Pyn
10. No Way
11. Walkin Blue
12.Massage The History

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Singles Bar #30



















THE JESUS LIZARD / NIRVANA
Puss / Oh, The Guilt
[Touch and Go, 1993]

Um dos maiores fenómenos de massas dos últimos vinte anos, os Nirvana pugnaram sempre por um apego às raízes underground, bem patente nas declarações públicas do seu líder, mas também nos lançamentos conjuntos com nomes mais ou menos obscuros. É o caso deste split captado em estúdio pelo ouvido clínico de Steve Albini e que valeu aos Jesus Lizard uma inédita entrada nos tops de vendas britânicos.
No lado A, "Puss" é um claro manisfesto de intenções da banda de Chicago, seguidora da cartilha noise/math rock visceral desenvolvida anos antes pelo próprio Albini com os seus Big Black. Guitarras abrasivas, bateria de precisão matemática, ritmo fracturado, e um David Yow confrontacional a vociferar invectivas de carácter sexista (é favor não o levar muito a sério), fazem deste tema um autêntico soco nas trombas. As imagens do vídeo promocional, de visionamento desaconselhável a pessoas facilmente impressionáveis, assentam como uma luva na violência gratuita da música e das palavras.
Para o lado B são relegados as estrelas da companhia. "Oh, The Guilt", numa versão gravada ao segundo take, segundo Albini, é demonstrativo do lado mais cru da música de Kurt Cobain & C.ª. Qualquer hipótese de aproximação a uma certa limpidez da produção de Butch Vig no clássico Nevermind é sabotada pela intromissão constante do clique de um isqueiro.



Príncipes e grão-duques

A pretexto da descoberta de duas "novas" bandas, um post de sangue azul:


Os American Princes são um quinteto formado em Nova Iorque mas que, presentemente, assenta arraiais em Little Rock, no estado do Arkansas. Praticantes de um rock de matriz clássica, a tender ligeiramente para o power pop, contam no currículo com quatro álbuns, o último dos quais recentemente eleito pela revista Magnet melhor disco de 2008. Não querendo questionar o merecimento de tal distinção, sempre sujeito a critérios de subjectividade, posso assegurar-vos que Other People é um conjunto de canções directas, honestas, e 100% livres de matéria gorda. As vozes, que são duas, lembram sobretudo Britt Daniel dos Spoon, mas também um tema popularizado pelos Tears for Fears (cf. "Still Not Sick Of You"). Recomendados, sobretudo, a apreciadores de The Hold Steady e afins.
http://www.myspace.com/americanprinces

Chegou hoje ao mercado Petits Fours, o longa-duração de estreia dos Grand Duchy. Se o nome deste projecto não vos diz nada, talvez o caso mude de figura se vos informar tratar-se de um duo constituído por Black Francis (o homem reassumiu em definitivo o nome que lhe deu fama) e respectiva cara-metade. A senhora, Violet Clark de sua graça, canta, toca baixo e teclados.
Aos saudosos de um Francis de inícios de carreira, enquanto integrante de um certo colectivo de Boston, deixo o aviso de que os escassos nove temas que compõem Petits Fours têm muitos ingredientes indispensáveis a uma receita do vosso agrado: vozes masculinas guturais e possuídas por um ente maligno, vozes femininas sensuais ultra-cool, e guitarras surf rock em desalinho. Confirmam-se assim todos os bons augúrios criados por SVN FNGRS, o EP do ano passado que pôs finalmente cobro a um período algo desinspirado deste senhor de peso.
http://www.myspace.com/grandduchymusic

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

The queen is not dead, yet

















Canal 1 da RTP, por volta da nove da noite de terça-feira. O programa é 30 Minutos. José Rodrigues dos Santos, no seu estilo histriónico, apresenta-nos um tal Ricardo Qualquer-Coisa, o primeiro português com um papel principal num musical do West End londrino. A mim, o feito do rapaz, deixa-me tão orgulhoso da nacionalidade como o distinção da FIFA ao CR7, a raça do cão do Obama, as vitórias eleitorais de Alberto João, o sujeito que ocupa o Palácio de Belém, ou aquele outro que está sepultado no Vimieiro. Ainda o jornalista que mais livros vende no Jumbo de Alfragide, faz-nos a sinopse do dito musical que presta tributo a essa aberração que me recuso a pronunciar o nome: Ricardo representa um Freddie Mercury do futuro que combate uma espécie (alienígena?) de malfeitores que veio para matar o rock'n'roll.
O que Rodrigues dos Santos talvez não saiba, ou não quer dizer, é que o rock'n'roll definha lentamente há mais de três décadas. E os responsáveis por este estado moribundo são, precisamente, gente da estirpe dos Freddie Mercurys do passado e dos Ricardos Quaisquer-Coisas do presente.

Uma carreira semi-obscura
















Em parte devido ao envolvimento de Stuart Murdoch como produtor da banda no passado, os escoceses Camera Obscura ainda são olhados como o parente pobre dos conterrâneos - mais velhos - Belle & Sebastian. Nem mesmo a "consagração" com Let's Get Out Of This Country (2006) terá ajudado grandemente a mudar esta ideia-feita no público e na crítica.
My Maudlin Career, o quarto álbum que marcará a estreia pela 4AD (estes agora deram em rentabilizar as descobertas alheias...) a 20 de Abril próximo, parece no entanto apostado em afastar definitivamente aquele estigma, imprimindo às canções uma densidade textural inaudita. Pelo menos é essa a ameaça deixada pelo avanço do tema-título (auto-referencial, who knows?), no qual, sem suprimir as já habituais reverberações spectorianas, as guitarras são chamadas para a linha da frente.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Em escuta #36



















THE PAINS OF BEING PURE AT HEART
The Pains Of Being Pure At Heart
[Slumberland, 2009]

Ainda que a visibilidade não seja a bastante para a proclamação de uma "cena", os sinais são já demasiados para que fiquemos indiferentes: nos Estados Unidos há uma geração de novas bandas apostadas em recuperar a memória da era dourada do indie pop. A lista que compreendia os Manhattan Love Suicides, as Vivian Girls, e os Crystal Stilts, sofreu um valioso incremento com a entrada em cena dos nova-iorquinos The Pains of Being Pure at Heart. Através do seu álbum debute homónimo, que sucede a uma promissora série de formatos mais reduzidos, este quarteto propõe uma viagem até ao Reino Unido da segunda metade da década de 1980, casando o twee pop gerado pelo "fenómeno" C86 com algumas manisfestações de distorção pré-shoegaze. Para o ouvinte familiarizado com este tipo de sonoridades, a audição de TPOBPAT pode revelar-se um interessante indie quiz de referências que, embora descaradas, assumem-se mais como uma homenagem do que como mero copismo. Desta vez não há, portanto, como evitar o facilitismo da comparação. Alguns exemplos em seguida:
- a guitarra jangle que emerge à superfície do muro de distorção em "Contender" traz a marca chapada dos saudosos Shop Assistants;
- "Come Saturday" e "Gentle Sons" são movidos pela mesma energia adolescente que fez dos Ride uma das mais promissoras bandas britânicas da alvorada de noventas;
- apesar da aparente sujidade, tanto na melodia como no intromissivo coro feminino, "Young Adult Friction" remete-nos para os Go-Betweens da fase 16 Lovers Lane;
- além das vocalizações boy/girl à maneira da dupla Kevin Shields-Bilinda Butcher, "This Love Is Fucking Right!" tem também a omnipresença de uma guitarra melodiosa que tanto poderia ser a de Johnny Marr, como a de Bob Mould em "If I Can´t Change Your Mind" dos Sugar;
- "The Tenure Itch" está próximo de uma hipotética colaboração de Stephen Pastel com os The Cure na sua faceta mais luminosa;
- fosse interpretada por uma voz feminina, e "Stay Alive" poderia ser tomada por uma canção dos Lush dos primórdios;
- fuzz à superfície, mas pop açucarada no âmago, "Everything With You" não destoaria no alinhamento de Isn't Anything dos My Bloody Valentine, embora o solo tímido da parte final nos faça lembrar Terry Bickers nos melhores momentos dos House of Love;
- já em "A Teenager In Love" e "Hey Paul" as referências parecem estar mais próximas no tempo: o primeiro segue a tendência up dos Belle & Sebastian recentes, enquanto o último é exemplificativo de uns Los Campesinos! mais contidos.
Injectadas de uma melancolia juvenil agridoce, estas dez canções têm, no entanto vida própria, muito para além da manta de retalhos que a minha análise simplista deixa antever. Para o grupo de cultores do género, nos qual orgulhosamente me incluo, podem até tornar-se um sério caso de amor à primeira vista (ou audição, neste caso). And this love is fucking right!

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Good cover versions #17











ORANGE JUICE "L.O.V.E. Love" (Polydor, 1981)
[Original: Al Green (1975)]

Se o mundo fosse um lugar perfeito e justo, aos Orange Juice estaria reservado um importante capítulo no Grande Livro da História da Pop. Sem eles, provavelmente, não teria havido The Smiths. Também não teria havido The Wedding Present, Belle & Sebastian, ou Franz Ferdinand. Talvez até os Vampire Weekend não soassem como soam, mas isso seria um mal menor... Resumindo: sem os Orange Juice não haveria indie pop.
Oriundos de Glasgow, na Escócia, os Orange Juice vieram acrescentar alguma frescura ao cenário post-punk. Por oposição à maioria dos contemporâneos, eram donos de um romantismo ingénuo e sonhador, muitas vezes traduzido numa atitude anti-machista. Na música, mostravam igual apego à escuridão da cave dos Velvet Underground, à perfeição pop dos Byrds, e ao charme dos mestres da música negra. Perante estas premissas, não surpreende que o single de antecipação a You Can't Hide Your Love Forever (o clássico álbum de estreia cuja capa inspirou o nome dos... hhhmmm... Delfins!) tenha sido este "L.O.V.E. Love", tema originalmente intepretado na voz quente do ícone soul Al Green. Nesta versão com a duração perfeita de 3'33'', por entre sopros ostensivos e coros sumptuosos, do alto dos seus 22 aninhos, a voz de Edwyn Collins exibe uma inusitada maturidade.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Um pedido















Aos senhores programadores de concertos neste país, peço-lhes que façam uma visita ao sítio oficial dos Buzzcocks, mais concretamente à página com as datas da presente digressão pelo Velho Continente, a qual visa promover as reedições dos três primeiros álbuns da banda. Tal como eu, deverão ter constatado que os veteranos de Manchester têm marcados, para a primeira metade de Março, cinco espectáculos para a vizinha Espanha, aos quais se seguem três dias de interregno antes de rumarem a Itália. Havendo vontade da vossa parte, afigura-se esta como uma oportunidade única de trazer Shelley, Diggle & C.ª a este rectângulo na periferia da Europa para duas ou três mão-cheias de clássicos pop punk. Na esperança de ver o meu pedido deferido, deixo-vos uma demonstração das capacidades destes rapazes num passado recente:


[Live @ Late Late Show w/ Craig Ferguson, 24/07/2006]

R.I.P.

LUX INTERIOR
1946-2009

Nascido Erick Lee Purkhiser, mas eternizado na galeria dos notáveis do rock'n'roll como Lux Interior, faleceu ontem na Califórnia, vítima de problemas cardíacos.
A única vez que o vi em palco foi em Agosto de 2006, em Paredes de Coura, já sexagenário ao leme dos "seus" The Cramps. Foi um concerto relativamente morno, pelo menos para os parâmetros crampsianos. Ainda assim, teve energia para dar e vender a alguns jovens que pisaram o mesmo palco.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Questões pertinentes (ou nem por isso)

IMAGEM:
Pieter Brueghel - Paisagem com a Queda de Ícaro (1554-55)
[Museu Real de Belas Artes da Bélgica]

- Porque será que a crítica a Tonight: Franz Ferdinad publicada no último número da revista DN Sábado (Diário de Notícias de 31 de Janeiro) tem tantas semelhanças com esta outra, publicada com algumas semanas de antecedência na Uncut? Mera coincidência de opiniões na análise ao novo (e algo frouxo) disco da banda escocesa? Quero pensar que sim.

- Como é possível que o disco de estreia de uns tais White Lies tenha entrado directamente para o primeiro lugar do top de vendas britânico? Será que o miserabilismo de pose estudada deixou de ser exclusivo de putos imberbes e tornou-se um fenómeno de massas? Entre isto e os My Chemical Romance difere o cheiro.

- Porque será que uma parte considerável de uma certa comunidade dita alternativa, por norma preconceituosa para com o hip hop, não se cansa de bradar as virtudes de "Dancing Choose", tema do último álbum dos TV on the Radio? É que "aquilo" é hip hop. E do mau...

- O que quererá dizer Brandon Flowers, vocalista dos The Killers, com as palavras "are we human, or are we dancer" no refrão de "Human", seguramente a pior canção do ano passado? (E a concorrência era forte).

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Ao vivo #35
















Evangelista @ ZdB, 30/01/2009

Depois de uma discreta passagem em Novembro de 2006, Carla Bozulich regressou este fim-de-semana ao aquário da ZdB. Na altura, promovia Evangelista, disco cujo título daria nome à banda que a acompanha actualmente, projecto mutante no qual, além da mentora, a baixista Tara Barnes é o único membro permanente.
Com uma sala semi-composta, o espectáculo começou com alguns problemas técnicos , motivo para uma troca de palavras bem humoradas entre a cantora, provavelmente ébria, e a baixista. Ao terceiro/quarto tema - uma inspiradíssima versão de "Pissing" dos Low, que arrancou intensos aplausos logo às primeiras notas - os problemas estavam pareciam debelados. No capítulo das canções alheias, haveria novo momento alto com a interpretação do clássico "I Can't Help It (If I'm Still In Love With You)" de Willie Nelson. Mesmo em temas originais, divididos entre as baladas arrepiantes e as descargas sónicas viscerais, Bozulich mostra uma certa reverência pela obra de outrém, com citações óbvias a letras de Sonic Youth e The Doors.
Por vezes enternecedora, outras vezes chocante, Carla Bozulich é mulher amarga e sem papas na língua, descendente directa de uma longa linhagem de provocadoras iniciada em Lydia Lunch. Ao longo do espectáculo, grita a plenos pulmões o direito à escolha, enaltece o poder do amor, interage com o público e causa algum desconforto. Num jogo de contrastes, do belo e do horrível, mostra-nos o quão ténue pode ser a fronteira entre dramatismo e auto-comiseração.

Na primeira parte do espectáculo, o nervoso e trapalhão percussionista Ches Smith, membro da actual formação dos Evangelista, mostrou-se um sério aspirante a Steve Vai das baquetas. Para quem parecia estar a tocar fora do quarto pela primeira vez, podia ter sido pior. Mas não muito...

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Gajas boas















Foto: Lindsey Baker

Chamam-se Women e vêm de Calgary, na província canadiana de Alberta. O nome algo infeliz e o alto patrocínio da Pitchfork fez-me desconfiar das credenciais do quarteto, ao ponto de não lhes passar cartão até há coisa de duas semanas. Porém, um destes dias, tropecei acidentalmente no mísero par de temas disponíveis para audição na página do MySpace. Foi o suficiente para desencadear a procura incessante pelo álbum de estreia homónimo.
Com menos de meia hora de duração, Women pode causar alguma estranheza ao primeiro contacto, tanto pela produção retrógrada de Chad VanGaalen, como pelas duas facetas distintas da banda. Se por um lado evoca algumas das sonoridades mais arrojadas do período post-punk, possivelmente catalogáveis como noise rock, por outro, o disco tem meia dúzia de temas escorreitos que concretizam o casamento feliz das harmonias luminosas dos Beach Boys com o negrume estridente dos Velvet Underground. Ultrapassado o choque inicial, Women pode tornar-se positivamente viciante.