"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Good cover versions #55











SAINT ETIENNE _ "Everything Flows" [Heavenly, 1993]
[Original: Teenage Fanclub (1990)]



Se a música pop preenche uma boa fatia da vossa tempo, já por mais do que uma vez vos terão questionado (ou questionaram-se) de qual a vossa canção preferida. Quando confrontado com a pergunta, posso responder que são muitas, enumerando algumas, ou então atirar uma única, que pode variar com o tempo, as  fases da lua, ou o movimento das marés. Em diferentes fases, esta distinção já recaiu sobre canções de "monstros sagrados" como The Beatles, The Beach Boys, Love, The Smiths, ou Big Star. 

Porém, de há uns meses a esta parte, a preferência tem estabilizado em "Everything Flows", aquele que foi, precisamente, o cartão de visita dos meus estimados Teenage Fanclub (TFC), por sinal uma banda de "dimensão" bem inferior à das citadas. Talvez seja porque, nesta fase primária, contenha, em estado bruto, todos os condimentos que me fazem render ao agrupamento escocês: o assalto sónico inspirado pelos Dinosaur Jr., combinado com um inapelável sentido pop (herdado justamente de algumas das bandas acima), ao qual J Mascis pôde um dia apenas aspirar. A isto, some-se o impulso juvenil, tão próprio à essência pop-rock, mais ingénuo que melancólico, e poderá estar justificada a minha escolha.

Sendo esta uma canção em tão elevada estima, é natural que torça o nariz a possíveis versões que lhe retirem o verdadeiro sentido. Fico descansado quando a tarefa é entregue a bandas como os Saint Etienne (SE), o trio inglês que soube trazer a cultura mod de sessentas e o easy-listening ao rebuliço estético de noventas. A versão de "Everything Flows" foi gravada por alturas de So Tough, o segundo e mui recomendável álbum, que abdicou do balearic estiloso da estreia ao investir numa pop elegante e sofisticada, propícia a ambientes requintados. Nas mãos da dupla de artesãos dos SE, "Everything Flows" é esventrada e reinventada a golpes de teclados, tornando-se verdadeiramente uma outra canção. Na colocação bem doseada do charme da voz de Sarah Cracknell, reside, eventualmente, uma réstia da imaculidade de Norman Blake no original dos TFC.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

10 anos é muito tempo #30








LIFT TO EXPERIENCE
The Texas-Jerusalem Crossroads
[Bella Union, 2011]




Corria o ano de 2001 e o mundo na generalidade, desassombrado da recente tensão pré-milenar, vivia a euforia de uma nova era. Não era o caso de três jovens texanos, reunidos sob a designação Lift to Experience e disfarçados por densas pilosidades, que vislumbravam um mundo em desagregação, carregado de violência sanguinária, mesmo à beira do apocalipse. Em sua defesa traziam um disco vagamente conceptual que, com ar crítico, aventava a hipótese de os Texas ser o centro da cidade santa de Jerusalém. Musicalmente, a oferta era ainda mais insólita. Partindo de um sentir assente na tradição country, o trio descarregava muros de distorção alinhados com os My Bloody Valentine, desenvolvendo, em paralelo, emaranhados épicos próprios de uns Kitchens of Distinction.

The Texas-Jerusalem Crossroads divide-se em dois discos: um primeiro, intitulado "Texas", obviamente mais virulento e agressivo; e um segundo, com o título "Jerusalem", que liberta uma aura redentora. Ambos se completam, com as suas onze (longas) canções que, interdependentes, discorrem abundantemente sobre questões religiosas, recorrendo amiúde a passagens bíblicas. A perspectiva de Josh T. Pearson, o mentor do projecto e autor das letras e da música, é mais a de um crente que questiona os planos do Criador do que, propriamente, a de um devoto cego. Ao que consta, a dúvida nasce da experiência pessoal, pois o pai do cantor e guitarrista era um pastor que privilegiava a pregação em detrimento do bem-estar da família. Ao longo de todo o disco, a voz, possante e límpida, paira acima dos novelos de distorção, como um anjo perto de tocar o firmamento. Nos momentos mais contemplativos, é impossível não estabelecer paralelismos com Jeff Buckley, se bem que numa faceta mais sóbria que atormentada.

A experiência da audição de ...Crossroads é de tal forma arrebatadora que, quando no fulcral "These Are The Days" são proferidas as palavras "A new sort of experience is taking over / 'cos we're simply the best band in the whole damn land", o ouvinte, empolgado pela novidade da oferta, concorda sem hesitações. Fazendo jus à velha máxima que diz que as experiências mais marcantes são as mais fugazes, os Lift to Experience implodiram pouco tempo depois daquele que foi o seu único álbum. Até hoje, continuam por confirmar os rumores que davam conta de um eventual "disco perdido". Como consolo, este ano já assistimos ao celebrado regresso de Josh T. Pearson, resgatado de um longa deriva errática que contou, inclusive, com um período de abandono absoluto das lides musicais. Regressa mais próximo das raízes country, mas igualmente mesmerizante no capítulo emotivo.


"Just As Was Told"


"These Are The Days"


"Falling From Cloud 9"

terça-feira, 28 de junho de 2011

Ao vivo #67












James Blackshaw + Nancy Elizabeth @ Teatro Maria Matos, 27/06/2011

Seguindo a lógica da óptima programação de concertos a que o Maria Matos nos tem habituado, ontem foi a vez de uma dupla com pergaminhos nos derivados mais livres da folk britânica. Ele, já com vasto reconhecimento, é um jovem prodígio na arte do fingerpicking, ela, embora com menor visibilidade por cá, é dona de uma obra já considerável.

A abertura do espectáculo cabe a James Blackshaw, sozinho em palco com a sua guitarra. Apresenta um pequeno número de peças, normalmente longas, que progridem lentamente até à rebentação seguida de um lento desvanecer. A técnica, mesmo aos olhos de um leigo, é apurada. Mais do que na sucessão de acordes, baseia-se na afinação das cordas. Por isso, são longos os interlúdios entre temas, ocupados no apuro do instrumento e pontuados pela timidez simpática do músico.

A solidão em palco é interrompida com a entrada em cena de Nancy Elizabeth que, ao piano, acompanha o guitarrista num despique inebriante para os sentidos. O segundo tema em conjunto, mais não é do que uma pequena brincadeira, com os músicos a trocar os papéis. É então que Elizabeth, em solitário, liberta aquela voz que, não sendo a de uma Sandy Denny, tem as cambiantes e a versatilidade para impressionar o espectador mais exigente. Ora no piano, ora na guitarra, passa em desfile um conjunto de canções delicadas, melancólicas e fantasiosas, ao melhor estilo britânico. À beleza da voz, a cantora junta um sentido de humor subtil, usado amiúde para quebrar o gelo do recolhimento das canções.

Para o encerramento, já em encore, a dupla é refeita para cada um exibir o melhor de si. Ele urde emaranhados de notas com uma cadência e um aprumo impressionantes, ela acompanha a delicadeza do piano com um estranho jogo vocal. Foi o final perfeito para um concerto de um virtuosismo discreto e sóbrio, essencialmente a apelar aos sentidos. A receita ideal para a segunda-feira seguinte a um fim-de-semana de intenso reboliço.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Singles Bar #65








OASIS
Live Forever
[Creation, 1994]




Quando o nome dos Oasis vem à baila é já normal o extremar de posições, entre a devoção plena e a pura repulsa. Relativamente aos que tomam partido por esta última postura, e subjectividades de gosto à parte, estou em crer que muitos sejam repelidos pelo circo mediático normalmente associado aos irmão Gallagher. Tenho de admitir que é algo que me custa a compreender, pois, desde tempos remotos, o rock sempre se fez de parangonas, controvérsia e uma boa dose de arrogância. Pela parte que me toca, e cingindo-me apenas à fase da banda pós-consagração, admito a quase indiferença. Já o mesmo não se pode dizer dos dois primeiros discos (sobretudo o de estreia), que vejo pejados com mais de uma mão cheia das mais significativas do rock, facção escorreita, de noventas.

É nesse prontuário de canções hínicas chamado Definitely Maybe que, entre outros tesouros, podemos encontrar "Live Forever", definitivamente o tema que bastaria aos Oasis para assegurar um lugar na história, o mesmo que, numa fase ainda embrionária, levou Alan McGee a contratá-los para a Creation Records sem qualquer espécie de hesitação. Recordo com alguma saudade as primeiras audições, e o arrepio recorrente logo nos instantes iniciais, com a bateria a abrir caminho para a entrada triunfal da voz de Liam Gallagher, em uníssono com os restantes instrumentos. Alegadamente, a linha inicial da letra foi inspirada no clássico "Shine A Light". As próprias progressões de acordes desenvolvidas pela guitarra do irmão Noel, parecem citar não só este, como outros temas da fase bluesy dos Stones. No fundo, estas referências mais não são do que umas achegas para a celebração do espírito rock'n'roll que assombra todo o álbum. Inicialmente pensada como um tributo a John Lennon, e uma celebração da imortalidade das estrelas rock que os Oasis estavam na iminência de se tornar, "Live Forever" ganha um especial dramatismo quando enquadrada num período ainda de luto pelo finado Kurt Cobain.



quinta-feira, 23 de junho de 2011

Girls gone wild














Não, esta ainda não é a reunião das saudosas Sleater-Kinney. Mas, pelo menos, já serve de consolo que este projecto inclua dois terços da banda rock feminina mais inconformada dos últimos quinze anos: Carrie Brownstein e Janet Weiss (que abandonou os Jicks de Stephen Malkmus mas mantém-se nos Quasi). Para além desta dupla, as Wild Flag integram ainda Mary Timony, antiga frontwoman dos Helium, e Rebecca Cole, que militou nos menos conhecidos The Minders. Portanto, atendendo ao line-up, podemos falar de um "super-grupo" representativo do indie-rock feminino da América de noventas.

Com pouco mais que um ano de vida, as Wild Flag já têm álbum pronto. É homónimo e tem data de edição prevista para meados de Setembro próximo. Algumas notas difundidas para a imprensa prometem um disco rock tumultuoso que, obviamente, congrega o lado mais agitador das Sleater-Kinney com a veia mais contemplativa dos Helium. Para além de seguir estas premissas, o petardo groovy que serve de aperitivo conta ainda com um interessante jogo de vozes. Sejam então bem vindos (de volta) a 1996:


"Romance" [Merge, 2011]

terça-feira, 21 de junho de 2011

Mixtape #11 - Sun Hits The Sky


[Foto: Jean-Marie Périer]

Como o próprio nome indica, a silly season, que hoje abre oficialmente, quer-se tola. Por isso, recomendo que esqueçam a conjuntura do momento presente, a troika, e aqueles senhores que acabam de ser empossados. E como? Aqui, no April Skies, da-mos um pequeno contributo, propiciando uma hipotética banda sonora para a estação quente, e que, obviamente, prima pela silliness. Não esperem, pois, coisas profundas, lustrosas ou cheias de artifícios. Esperem, isso sim, uma pop directa e desbotada pelas horas da exposição ao sol, tal como já vos habituámos. Desta feita, esquecemos o passado mais ou menos distante e concentrámo-nos exlusivamente na melhor safra do último ano e meio, da qual foram escolhidas a dedo estas vinte faixas. A oferenda pode ser reclamada à distância de dois cliques, logo a seguir ao alinhamento.

01. THE BABIES _ "Caroline"
02. THE FEELIES _ "Should Be Gone"
03. CRAFT SPELLS _ "From The Morning Heat"
04. SMITH WESTERNS _ "All Die Young"
05. THE FRESH & ONLYS _ "Waterfall"
06. VIVIAN GIRLS _ "I Heard You Say"
07. REAL ESTATE _ "Reservoir"
08. CLOUD NOTHINGS _ "Forget You All The Times"
09. LAS ROBERTAS _ "Damn '92"
10. TERRY MALTS _ "Distracted"
11. TITLE TRACKS _ "Forget The Ghost"
12. SEAPONY _ "Dreaming"
13. AIR WAVES _ "Knock Out"
14. ETERNAL SUMMERS _ "Eternal"
15. LA SERA _ "Never Come Around"
16. TWO WOUNDED BIRDS _ "Summer Dream"
17. THE PRIMITIVES _ "Need All The Help I Can Get"
18. DIRTY BEACHES _ "True Blue"
19. DUM DUM GIRLS _ "Take Care Of My Baby"
20. JEANS WILDER _ "Sparkler"


segunda-feira, 20 de junho de 2011

10 anos é muito tempo #29








THE SHINS
Oh, Inverted World
[Sub Pop, 2001]




Com uma longa pré-história a marinar ideias, primeiro como Flake, depois como Flake Music, os The Shins emigraram do periférico Novo México para a "terra das oportunidades indie" de Portland já altamente versados na confecção de canções pop de alto quilate. Entrados numa nova década (e num novo século), demarcaram-se dos nomes de oitentas e noventas e perderam o pudor de olhar com reverência para um passado mais longínquo. Na circunstância, apontaram baterias para a era dourada da pop dos sixties, citando amiúde e sem preconceitos mestres como The Beach Boys, logo à cabeça, mas também The Beatles, The Kinks ou The Zombies. 

Por conseguinte, Oh, Inverted World, o álbum debute que os lançou para uma carreira rumo à primeira divisão indie norte-americana, é um autêntico tratado POP, assim mesmo, com maiúsculas. Todo o conjunto de onze temas parece vir de um tempo difícil de localizar no contínuo, aqui e ali investido de laivos de psicadelia reforçados pelos títulos "esquisitos" e as letras de difícil descodificação. James Mercer, o vocalista, compositor e produtor, não se coíbe de usar e abusar do falsetto, insuflando cada tema de um espírito de harmonia. Com efeito, desde o sublime "Caring Is Creepy, tema em tons sépia que evoca os Beach Boys, passando pelo arremedo rock à la Kinks de "Know Your Onion!", até à quietude pastoral do derradeiro "The Past And Pending", Oh, Inverted World é um todo de canções que se entrelaçam, como se só fizessem todo o sentido quando acompanhadas das restantes. Mais ou menos a meio do trajecto, invadidos por uma sensação agridoce e por uma regressão à inocência quase infantil, encontramos "New Slang", esse pedaço de perfeição contaminado de folk soalheira que, com toda a justiça, ficará recordado como o momento definitivo dos The Shins. O tal tema que, pela mão de Zach Braff, iria mudar as nossas vidas, mas também a da própria banda.

Com o mote dado por Oh, Inverted World, toda a década que se lhe seguiu acabaria por ficar marcada pela referência mais ou menos assumida de diferentes fontes. Contudo, a falta de ideias, de talento, ou sabe-se lá do que mais, cedo conduziu muitos dos protagonistas à referência da própria referência, fazendo dos noughties um dos mais penosos períodos da música popular. Sem rivais à altura, o disco da década foi encontrado logo no seu dealbar. Para tal feito, bastaram aos The Shins qualquer coisa como 32 minutos...


"New Slang"


"Caring Is Creepy"


"The Past And Pending"

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Jubilee


Há 25 anos, neste mesmo dia, saía o disco de uma vida. Da minha. Não o melhor, talvez. Basta dizer, sem sair do universo The Smiths, que o tempo fez com que passasse a dividir a preferência com Strangeways, Here We Come, o mal-amado, o incompreendido disco da despedida. Mas, The Queen Is Dead foi o disco certo na altura certa. Respondeu a todos os anseios de um adolescente à procura do sentido da vida. Em cada canção, a empatia é tal que, como alguém uma vez disse, sentimos que Morrissey fala para cada um de nós, em particular. 

Olhado a esta distância, The Queen Is Dead mantém intacto a sua genialidade, a sua frescura, o seu apelo imediato. É violento, irónico, cínico. É uma visão amargurada do Estado da Nação. É um murro nas trombas da monarquia. É, tal como escrevia há poucos meses Jon Savage, um acto de coragem em plena ascenção ao pode da aristocracia pop que saiu coroada do Live Aid. Tanto mais, atendendo a que The Smiths não eram uma banda qualquer. Eles próprios já tinham chegado aos ouvidos e aos corações da massas. Mas The Queen Is Dead é também sincero - raramente, na música popular, alguém expôs as entranhas tão exibicionista como Morrissey o fez. E, em todo o seu desencanto, é esperançado e é romântico. Romântico, não no sentido mundano do termo, mas na sua verdadeira acepção.

Por tudo isto, por tudo aquilo que The Queen Is Dead ainda significa, hoje como há 25 anos, apetece gritar bem alto:

A rainha está morta! Que se foda a rainha!

Viva Morrissey! Viva Marr! Viva Rourke! Viva Joyce!

Vivam The Smiths!


"The Boy With The Thorn In His Side" [Rough Trade, 1986]


"There Is A Light That Never Goes Out" [Rough Trade, 1986]

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Suplício de Verão













Num passado não muito distante, e graças a um EP de apresentação devastador, já foram uma das grandes esperanças deste pasquim. Porém, o longa-duração Tentacles (2009) revelou-se apenas um disco mediano, incapaz de recapturar na plenitude a terra queimada do antecessor. Ainda para mais, teve a triste sina de ser o último lançamento da prestigiada Touch and Go Records, editora que, devido à conjuntura, deixou de lançar novos discos. O que lhes valeu foi que os Crystal Antlers se redimiram com o concerto avassalador a que pude assistir há pouco mais de dois anos. 

Confrontada com a necessidade de se auto-editar (algo que já tinha acontecido na primeira prensagem do referido EP), e com algumas mexidas no line-up, a banda californiana retirou-se temporariamente para o México, a fim de desenvolver o redentor segundo álbum. O resultado chama-se Two-Way Mirror e vê a luz do dia dentro de pouco menos de um mês. Na ficha técnica constam os nomes do produtor Jack Endino, responsável por moldar o "som de Seattle" antes do boom mediático, e de Raymond Pettibon (autor, entre outras, de muitas das míticas capas dos Black Flag e de Goo, dos Sonic Youth), responsável pela imagem da capa. Como poderão constatar, a amostra infra não contém a carga de explosivos de outrora. Inclusive, introduz uma marcha vagamente celebratória. Contudo, os gritos lancinantes de Johnny Bell, combinados com o quadro difuso, fazem-nos acreditar que os Crystal Antlers poderão recuperar, a breve trecho, o estatuto de especiais de outrora.


"Summer Solstice" [Recreation Ltd., 2011]

terça-feira, 14 de junho de 2011

First Exposure #32
















TERRY MALTS

Formação: Phil Benson (bx, voz); Corey Cunningham (gtr); Nathan Sweatt (btr)
Origem: San Francisco, Califórnia [US]
Género(s): Indie-Pop, Punk-Pop, Fuzz-Pop, Jangle-Pop
Influências / Referências: Ramones, 14 Iced Bears, Buzzcocks, Red Kross, Shop Assistants, Black Tambourine

http://www.facebook.com/terrymalts


"I'm Neurotic" [Slumberland, 2011]

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Ao vivo #66

















San Miguel Primavera Sound @ Poble Espanyol, Parc del Fòrum - Barcelona, 25-29/05/2011

Dos três Primaveras consecutivos que já conto no cadastro, o do presente ano é o vencedor no que à qualidade de concertos diz respeito. O grau de satisfação é tal que, só agora, duas semanas após o "dia seguinte, o do choque do regresso ao mundo real, me sinto em condições de uma análise "a frio", que evite opiniões exacerbadas pelo estado de semi-delírio. No aspecto organizativo, o saldo é também francamente positivo, com falhas a apontar "apenas" no que respeita ao rotundo falhanço da forma de pagamento adoptada para os bares, e as já habituais deficiências sonoras registadas no palco Pitchfork. Este, agora afastado da zona central do Fòrum, já não sofre a interferência do som de outros palcos. Porém, repete as falhas técnicas do ano passado. Desta feita, as principais vítimas foram The Fresh & Onlys e The Black Angels. Em qualquer dos casos, a prestação das bandas merecia outro tratamento do pessoal técnico. Os texanos ainda tiveram a compensação no encerramento realizado na "sauna" do Apolo, sala com características óptimas para a catarse xamânica que caracteriza a música da banda.

Este foi também o ano em que praticamente abdiquei dos concertos realizados no palco principal. As excepções dignas de registo foram The Flaming Lips e os regressados Pulp, e ambas corresponderam a semi-desilusões. Os americanos porque apenas a espaços conseguem extrair o lado celebratório da sua música, perdendo uma boa parte do tempo com considerações de uma freakalhice balofa, e os britânicos, mais competentes, contudo, porque optaram pelo "zona de conforto" de resumir o espectáculo, basicamente, ao par de álbuns mais conhecidos. Fica também registada a performance de Jarvis Cocker, num registo que chegou a roçar o auto-caricatural. No imediato, a opção poderá fazer o delírio da turba feminina, mas pode, a médio trecho revelar-se uma armadilha. No mesmo cenário, e por breves instantes, houve ainda tempo para o aborrecimento a cargo de M. Ward, Fleet Foxes e Animal Collective. Idênticos bocejos, mas noutros cenários, foram tUnE-yArDs e Warpaint, estas últimas algo perdidas na orientação a transpor para palco, mas com a atenuante do regalo para a vista. Já os Of Montreal têm sempre novidades no esgrouviamento festivo, e revelam-se eficientes para quem estiver no mesmo comprimento de onda. Por fim, fica a impressão de que a nova faceta pop ensolarada dos Belle & Sebastian, tal como a introspecção de outros tempos, fica a ganhar em cenários mais recatados.

À semelhança das ocasiões anteriores, este foi mais um ano de triunfo dos veteranos, alguns recentemente regressados às lides para colher os louros de outras eras. Foi o caso dos Public Image Ltd. que, com uma formação composta por óptimos executantes das várias reencarnações do passado, passam em desfile um autêntico best of de forma irrepreensível. O agitador John Lydon parece estar em dia sim e, só por isso, mereceria público em maior número. Igualmente carismático, David Thomas lidera os Pere Ubu vai para trinta e muitos anos. Para o Primavera trouxe toda a causticidade das canções do primórdios, intercaladas por delirantes notas do humor mais corrosivo. E por falar um corrosão, vêm à baila os Suicide, autênticos sabotadores do estatuto pioneiro que ostentam, num espectáculo de pura violência sónica. Irreverência é o que também não falta a Glenn Branca, que aqui dirige um ensemble de jovens músicos. À formalidade do registo opõem-se as fustigadelas de ruído e a postura negligente do "maestro". Regressando à normalidade, falemos dos Echo & The Bunnymen que, apesar de notoriamente envelhecidos e com algum desmazelo que seria impensável nos idos de oitentas, redimensionam a grandiosidade das canções com a experiência adquirida. Will Sargeant revela-se um guitarrista inventivo e pouco dado à previsibilidade, enquanto Ian McCulloch ainda ostenta um vozeirão que os inúmeros cigarros consumidos não conseguem arruinar. Igualmente imponentes, os Mercury Rev são daqueles raros casos em que o excesso de pompa fica bem. Para a ocasião trazem a magnitude de Deserter's Songs, o que arrebata o público para um dos momentos mágicos do festival. No final, era visível o êxtase em ambas as partes, banda e audiência. O outro número de enfeitiçamento ficou a cargo de Dean Wareham, que não traz os Galaxie 500 mas traz as canções sépia daqueles, agora engrandecidas no lado performativo, mas igualmente reservadas no sentimento. Perante os constantes arrepios, a imponência da figura da companheira Britta Phillips é apenas pormenor de somenos importância. Vindos de um viveiro indie limítrofe, os Half Japanese aparecem apostados em quebrar regras, sobretudo o neurótico Jad Fair que faz prevalecer a pureza sincera das canções sobre qualquer rigor técnico. Quanto aos, Low enveredam desta feita por realçar o poder contemplativo da sua música. A opção por um volume mais baixo pode não propiciar as explosões de tensão a que nos habituaram. Contudo, o espectáculo fica francamente a ganhar em intimismo enegrecido.

Nas curiosidades indie, os resultados foram variáveis. Os Yuck, por exemplo, destilam na perfeição a energia juvenil que emana do seu superlativo disco de estreia. Fica, contudo, a sensação que ficariam a ganhar com o aparato sonoro de um horário mais tardio. Mais compenetrados, e sobejamente mais experimentados, os Monochrome Set trazem um punhado de canções carregadas de literacia. Tal como os BMX Bandits, donos de um cancioneiro recheado de pequenas pérolas do mais inocente romantismo. Nestes, a presença de Duglas T. Stewart, e das suas tiradas de humor positivo (o negativo do citado David Thomas, se quiserem) quase ofusca a trupe que o acompanha. Ainda com algum caminho a percorrer, os My Teenage Stride exibem já um considerável conhecimento da essência pop que presidiu à obra de gente como Orange Juice ou The Smiths. Idêntico "estudo" tem marcado a carreira dos Comet Gain. Porém, neste caso apenas os temas mais ritmados, ou com refrões mais orelhudos, conseguem descolar da mediania pela qual se pauta o concerto. Uns bons furos abaixo, os canadianos Suuns, donos de um debute com muitos pontos de interesse, são em palco uma das bandas mais amorfas que me passaram pela frente. Dos Mogwai não se espera algo mais do que rigor e empenho, e desta feita não desiludiram quem já se habituou aos seus emaranhados de proporções épicas. Já começam a escassear os elogios que faça justiça aos Deerhunter, tal a quantidade de novos truques que a banda ostenta a cada novo disco e/ou prestação ao vivo. Embora referencial, a sua pop, perdida entre o fuzzy e sonhador, é destilada com tal paixão que são já caso único entre as bandas nascidas neste século.

No capítulo das "bizarrias e outros delírios", o triunfo incontestado vai para os Gang Gang Dance, aposta pessoal para uma iminente subida de divisão. Para o Primavera traziam disco novo, e revelaram-se verdadeiramente hipnóticos na abordagem a uma espécie de música de dança liquifeita e recheada de elementos étnicos. A turba de curiosos, já em número considerável, poderá vir a crescer a breve trecho. Menos imediatos, mas igualmente delirantes, os Emeralds apontam essencialmente ao escapismo intuitivo. Outrora mais impenetrável, a sua música começa a estender tapetes sonoros propiciadores de ambientes convidativos à introspecção. Sem termo de comparação com o passado recente, arrisco afirmar que os Battles pouco ficam a perder com o abandono de Tyondai Braxton. Reduzidos a trio, balanceiam nas doses adequadas uma música que tem tanto de cerebral como de rítmica. 

Aos concertos resumidos, acrescentem-se ainda Caribou, que destilou eficazmente o pendor mais prático e dançante do último registo, e Moon Duo que, à hipnose das mantras de psicadelia, acrescentam a vistosa presença da teclista.

Por fim, uma palavra para as sessões gira-disquistas, no meu caso reduzidas às prestações de Girl Talk e do inevitável DJ Coco. O primeiro, dono de um curioso coglomerado de samples facilmente reconhecíveis, surpreende ao vivo pela facilidade com que combina estilhaços de hits das mais variadas proveniências. Acima de tudo, é lúdico. A jogar em casa, o último traz uma série de escolhas que, embora previsíveis para os habitués, revelam-se de primeira água para o folião mais exigente. Pena foi que, por motivos inexplicados, a festa tivesse sido abruptamente encurtada na sua duração.

Foto: Shannon McClean / Pitchfork Media

TOP 12

01. Dean Wareham plays Galaxie 50
02. Glenn Branca Ensemble
03. Mercury Rev performing Deserter's Songs
04. Deerhunter
05. Low
06. Public Image Ltd.
07. Pere Ubu plays "The Annotated Modern Dance"
08.BMX Bandits
09. Suicide performing First LP
10. Gang Gang Dance
11. Echo & The Bunnymen performing Crocodiles & Heaven Up Here
12. The Black Angels (@ Apolo)

domingo, 12 de junho de 2011

Endless (not) nameless

















Foto: Steve Gullick

Já por mais do que uma vez aqui exprimi a minha opinião sobre o actual estado da música pop/rock de produção britânica, na qual vislumbro francos sinais de recuperação comparativamente à concorrência ianque. Boa parte desta minha visão optimista fica a dever-se aos Male Bonding, autores de um dos mais estimulantes discos do ano passado. Em menos de meia hora, Nothing Hurts consegue reunir um bom lote de estilhaços post-hardcore combinados com o sentir do rock dito "alternativo" de noventas. A impressão, já de si extremamente favorável, saiu reforçada com um óptimo concerto proporcionado há coisa de meio ano.

Aproveitando a embalagem, e à maneira de outras eras, os Male Bonding têm já novo álbum na calha, com edição prevista lá para Agosto. É pois grande a expectativa relativamente a Endless Now, tanto mais que o mesmo contou com a produção do "mago" John Agnello, responsável, por idênticas funções, entre muitos outros, em trabalhos de gente como Sonic Youth, Dinosaur Jr., The Ponys ou The Hold Steady. Em antecipação, já foi divulgada a fabulosa amostra infra (obter legal e gratuitamente aqui). A grande surpresa deste acepipe é a duração que ultrapassa os seis minutos, contrastando radicalmente com os curtos petardos do antecessor. Musicalmente, digamos que o ritmo desenfreado e sem concessões, estabelece uma hipotética ponte entre The Wedding Present e os Nirvana do começo.


"Bones" [Sub Pop, 2011]

Ao vivo #65
















Las Robertas @ Clube Ferroviário de Lisboa, 10/06/2011

Afinal, a actual formação de Las Robertas não consiste num grupo de quatro meninas. Presentemente, nem sequer são um quarteto. Pelo menos o line up da passada sexta-feira integra tão somente duas miúdas e um rapaz. Qualquer deles(as) tem uma aparência tão jovem que chegamos a duvidar que tenham permissão para viajar para o estrangeiro sem a companhia de um responsável maior. Tal dose de juventude reflecte-se, obviamente, em muita timidez, quase a roçar o embaraço. Timidez essa que se agrava com a insólita interrupção para dar conta de um carro mal estacionado no exterior do CFL (!!!). Imagine-se a protagonista de tal episódio a interromper a costumeira chamada telefónica de um tal Bono Vox para um tal Barack Obama... Mas imagine-se apenas, pois, quando comparadas com as audiências de tais personagens, Las Robertas são algo de diminuto. Apenas conseguem atrair pouco mais do que duas dezenas de pagantes. Pouco mais do que uma vintena de almas, extremamente jovens na sua maioria, que puderam testemunhar in loco dois punhados de pequenas canções prenhes de ruído e harmonia, imbuídas de um espírito juvenil adequadamente estival. E primorosamente executadas, acrescente-se.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

The senator is ba(e)ck!

















Graças à obra à frente dos Pavement é, merecidamente, um dos vultos da música popular não-alinhada das últimas duas décadas. Desde a dissolução daquele icónico combo, e talvez devido à acrimónia em que foi envolta, que Stephen Malkmus faz questão de fugir à matriz e trocar as voltas aos seguidores, progressivamente mais divididos. Eu, que a dada altura me confessei alienado, admito ter apreciado o espírito jam do último Real Emotional Trash (2008) como nenhum outro dos três anteriores trabalhos "a solo". Serei o único?!

Agora, resolvidos os diferendos, e com os Pavement de regresso à estrada, Malkmus parece ter perdido o pudor de remexer no património passado. Pelo menos é o que nos leva a crer a primeira amostra do próximo álbum (mais abaixo), gravado uma vez mais com The Jicks como banda de suporte. Apraz-me registar as mudanças de ritmo trepidantes e uma boa dose de ironia de corrosiva, bem expressa na tirada "I know what the senator wants, what the senator wants is a blow job". Enquanto não se desvenda algo mais, interessa saber que o disco contou com a produção daquele que, nos idos de noventas, era apontado como um misto de génio e enfant terrible - Beck, pois claro! Dupla recuperação no horizonte, é a esperança que se alimenta com tão saboroso aperitivo. As dúvidas dissipam-se lá para finais de Agosto, quando Mirror Traffic chegar às lojas.


"Senator" [Matador, 2011]

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Mil imagens #19


Arctic Monkeys - Sheffield, 2006
[Foto: Dean Chalkey]

Singles Bar #64







BMX BANDITS
Serious Drugs
[Creation, 1992]





Mais do que uma banda, os BMX Bandits são a expressão musical (e poética) de Duglas T. Stewart, único elemento permanente neste último quarto de século de remar contra a maré. Normalmente, as sucessivas mudanças no line-up não se prendem com abandonos e divergências, litigiosos ou amigáveis, mas tão somente com a disponibilidade que o extenso rol de amigos deste personagem da "cena" de Glasgow dispõe no momento da gravação de cada disco.

Em dado momento do trajecto, mais precisamente o de maior visibilidade, os amigos dos incontornáveis Teenage Fanclub responderam também à chamada. Norman Blake, um dos membros desse "triunvirato", inclusive, co-escreveu e emprestou a voz a esse assomo de hit intitulado "Serious Drugs". A letra - brilhante - é auto-biográfica, e fala da fase inocente de Duglas, marcada pela descida ao submundo das drogas. Podia, face à temática, ser uma canção sombria. Poder podia, mas o tom bem-disposto, com um sentido de humor francamente positivo, e a ingenuidade não-poseur, afastam qualquer resquício de dramatismo. Os princípios, portanto, são os do twee-pop. Porém, no elemento musical, "Serious Drugs" é mais ambiciosa, e investe numa assumida maturidade pop, muito devedora dos saudosos Big Star, com a opulência das cordas e do saxofone a sublinhar a riqueza da melodia. Na sua simplicidade, fica para a posteridade como um dos marcos da riquíssima história da Creation Records.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Duetos #33










E agora sim, para acabar em definitivo com a rubrica, um tema daquele que foi - nunca é demais lembrá-lo - um dos grandes discos do ano passado. Cortesia do mestre e dois dos seus mais dedicados alunos. Mais do que um dueto, um "trieto", portanto.

Edwyn Collins (feat. Alex Kapranos & Nick McCarthy) _ "Do It Again" [Heavenly, 2010]

segunda-feira, 6 de junho de 2011

R.I.P.


MARTIN RUSHENT
[1948-2011]

Morreu no passado sábado, por causas ainda desconhecidas, Martin Rushent, produtor britânico para sempre lembrado pelo seu trabalho em Dare, o disco de 1981 que catapultou os Human League e que lhe valeu o estatuto de símbolo do synthpop. Antes, porém, já se tinha notabilizado pela sua ligação ao fenómeno punk, tendo produzido os três primeiros álbuns tanto dos Buzzcocks como dos The Stranglers, bandas com as quais estabeleceu uma grande cumplicidade. Nos meandros da new wave, foi ainda responsável pela produção de bandas como os escoceses Altered Images, as norte-americanas The Go-Go's, e os históricos XTC. 

Desde meados de oitentas desiludido com os ditames da indústria, Rushent começou a espaçar os seus trabalhos até à quase inactividade. Um dos últimos foi juntamente com os Does It Offend You, Yeah?, banda da qual faz parte o filho James. Consta que, à data da sua morte, estava empenhado na gravação da edição especial comemorativa de Dare, agora registada com "instrumentos reais". Em jeito de recordação, fica a atípica estreia a solo do líder dos Buzzcocks, primeiro assomo da tendência de Rushent para as produções caras.

Pete Shelley _ "Homosapien" [Genetic, 1981]

Guiados por vozes
















Regra quase geral, os chamados disco de tributo mais não são do que um amontoado de versões sofríveis interpretadas por bandas mais do que obscuras em busca de alguma visibilidade a reboque dos homenageados. A quantidade de bandas com vontade de aparecer, leva também a que, na maioria dos casos, esses mesmos discos contenham faixas em número pouco razoável.

A romper com a tradição, Sing For Your Meat, o mais recente dos muitos tributos aos incontornáveis Guided by Voices, destaca-se logo pela relativa contenção que não faz jus à hiper-produtividade que caracteriza um tal de Robert Pollard. Inclui ao todo dezassete versões, interpretadas por igual número de bandas / artistas, em muitos dos casos já com considerável currículo: Lou Barlow, Thurston Moore, Kelley Deal, Elf Power, Superdrag, Crooked Fingers, ou Blitzen Trapper. No capítulo das "estrelas" emergentes, devem ter-se em conta La Sera e os Cymbals Eat Guitars. A cereja no topo do bolo é que, na sua maioria, os temas incluídos consistem em versões personalizadas que, respeitando o original, não se limitam a mimetizá-lo. A título de exemplo, oiçam o projecto paralelo da Vivian Girl Kickball Katy num número insuflado de hélio.


La Sera _ "Watch Me Jumpstart" [No More Fake Labels, 2011]

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Good cover versions #54


THE TRIFFIDS  "Rent" [Island, 1989]
[Original: Pet Shop Boys (1987)]



Como já deve ser sabido, não sou propriamente o maior entusiasta da synthpop "original", e muito menos dos derivados que por aí abundam e nos infernizam os dias (e sobretudo as noites). Contudo, pelo menos até à fase  festivo-tropical, sempre nutri alguma simpatia pelos Pet Shop Boys. E tudo porque são dos poucos no género que justificam o sufixo "pop" a seguir ao "synth", e por conseguinte capazes de urdir um ou dois punhados de canções dignas desse nome. Uma delas é precisamente "Rent", um tema com uma melancolia romântica e uma discrição nas doses adequadas, como só os PSB sabiam fazer. Peca apenas, no lado instrumental, por algum excesso dos tiques do género.

A seu favor, "Rent" tem ainda uma das letras mais inspiradas de Neil Tennant, que ganha outra dimensão na versão essencialmente acústica dos australianos The Triffids, que cometem também a proeza de sublinhar o fino recorte da melodia. Diria até que a voz sempre carregada de dramatismo do conturbado (e malogrado) David McComb confere outra credibilidade ao "discurso" do rent boy. Juntamente com uma outra versão de "Into The Groove" (Madonna), este tema foi lado B de uma edição britânica tardia de "Bury Me Deep In Love", provavelmente o tema mais popular dos Triffids. O objectivo desta operação era catapultar a banda para outros patamares a nível internacional o que, escusado será dizer, se revelou esforço vão.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Discos pe(r)didos #54








ROLLERSKATE SKINNY
Horsedrawn Wishes
[WEA, 1996]




Excluindo o caso dos bem conhecidos "mensageiros da paz", e vários projectos mais ligados à folk, são muito poucos os casos de bandas provenientes da Irlanda a penetrar o circuito mundial da música popular. Este blogue até sente mais afinidades, por exemplo, com os My Bloody Valentine, mas esses são geralmente confundidos com ingleses por terem assentado arraiais em Londres. Relacionados com estes, porque incluíram na formação Jimi Shields, irmão de um tal Kevin, os Rolleskate Skinny (RS) jogam numa divisão secundária no que respeita a exposição mediática. Curiosamente, aquando da gravação do seu segundo e mais representativo álbum, já aquele multi-instrumentista tinha abandonado o barco, cansado das constantes referências na imprensa às ligações familiares.

Reduzidos a trio, os RS partiram para a gravação de Horsedrawn Wishes apostados em desfrutar na plenitude das possibilidades de um moderno estúdio de gravação. Daí resultou uma hora de música que, num primeiro contacto, se estranha, não porque embarque na bizarria gratuita, mas pela ausência de referências óbvias. Com a insistência, o ouvinte é seduzido pela complexidade estrutural que liberta vapores narcóticos, mas que, em momento algum, se afasta dos princípios norteadores da pop. Experimentem ouvir "Cradle Burns" e tentem ficar imunes ao tropel da invulgar cadência das guitarras. Ou então o brilhante "Speed To My Side", que recontextualiza o psicadelismo dos Beatles à luz dos ensinamentos shoegazing. Noutros momentos, os RS fazem valer o seu poder lisérgico, como nos casos do submerso "Bell Jars Away" ou do contemplativo "All Mornings Break". Apostados na cacofonia, mas suficientemente disciplinados, "One Thousand Couples" e "Man Under Glass" rejeitam demasiada proximidade com a anarquia ensandecida dos primeiros Mercury Rev. 

No todo, impressiona a capacidade da banda em preencher cada espaço, fazendo de cada tema uma pequena sinfonia, seja através da gama de efeitos aplicados nas guitarras, seja pelos adornos de cordas e electrónicos embutidos a preceito. Não é por acaso que, na ficha técnica, são creditadas orquestrações a todos os músicos envolvidos.

Laureado pela crítica, mas com sucesso comercial insuficiente para os parâmetros de uma multinacional, Horsedrawn Wishes precipitou o fim do RS. Desde essa morte prematura, todos os seus membros se têm mantido activos em projectos pouco mais que obscuros. Mas nada que os possa envergonhar, pois no currículo podem ostentar, com orgulho um dos grandes discos da década de 1990. Um daqueles que, embora semi-esquecido, se escuta com renovado deleite volvidos 15 anos.


"Cradle Burns"


"Speed To My Side"


"Bell Jars Away"