"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

People have the power
















Já ninguém pode negar que os anos mais recentes têm sido de autêntica revitalização da soul, com a edição de discos aconselháveis em número como já não se verificava há décadas. Este pequeno movimento, fruto sobretudo do crescente interesse de um público adulto e branco, tem o sentimento de sobra que faltou àquele período fugaz no inícios de oitentas, algo lamechas, que rapidamente abriu caminho às mega-estrelas carpideiras do R&B para consumo das massas. No epicentro deste belo revivalismo tem estado a nova-iorquina Daptone Records, editora com uma atitude laboriosa e devota desde os alvores deste novo século. Às custas deste pequeno grupo de geeks da soul, já tivemos o prazer de travar conhecimento com o maravilhoso Charles Bradley, homem com uma história incrível que teve o reconhecimento do seu talento já sexagenário. Também o "esquecido" Lee Fields é actualmente alvo de uma justíssima redescoberta graças às boas gentes da Daptone.

Sem qualquer demérito para os citados, porém, a estrela da companhia é Sharon Jones, também ela iniciada nas lides discográficas já numa idade madura, embora não tanto como a de Bradley. Sempre acompanhada dos fieis The Dap-Kings, banda que integra os fundadores da Daptone e outros músicos que acompanharam Lee Fields nos anos da invisibilidade, tem lançado discos a bom ritmo e de bom nível desde a fundação da editora. O último deles, já o quinto álbum de originais, é o novíssimo Give The People What They Want, gravado com alguma urgência depois de ter sido diagnosticado à cantora um tumor pancreático. Fazendo das fraquezas forças, podemos afirmar que Sharon Jones arranca aqui o seu melhor trabalho, também o mais pessoal e menos politizado do catálogo. Embora o título remeta directamente para um velho tema dos The O'Jays, típico da soul "progressiva" da década de 1970, a sonoridade deste novo álbum está completamente desligada dessas "modernices", já que o respeito pela soul da velha escola - a de sessentas - é absoluto. O habitual comentário social resume-se praticamente a um par de temas, deixando mais espaço para os assuntos do coração. Por isso, a voz de Sharon Jones é menos ostensiva do que o costume, mas também mais maleável e virtuosa na sua contenção, desafiando o meio dominado pelos homens, tal como o fez Aretha Franlin décadas antes dela. Sem a querer pôr ao nível da Diva, o que é certo é que Jones navega com notável à-vontade por diferentes registos, sobretudo a southern soul, mas também com digressões pelo classicismo de Filadélfia e pelo sentir pop da Motown. No elogio a Give The People What They Want é também imperioso referior o trabalho dos Dap-Kings, em perfeita sintonia com a cantora, com arranjos extremamente cuidados e luxuriantes, sopros abundantes e profusamente groovy, e ainda coros altamente harmoniosos, estes cortesia das Dapettes.

 
"Retreat!" [Daptone, 2013]

Sem comentários: