"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Há 20 anos era assim #10









KRISTIN HERSH
Hips And Makers
[4AD, 1994]




Com a saída motivada pela insatisfação pelo seu papel "secundário" de Tanya Donelly, houve quem temesse pelo futuro dos Throwing Muses, uma das bandas mais peculiares do espectro indie de oitentas em geral, e do catálogo da 4AD em particular. A própria Kristin Hersh, meia-irmã daquela e detentora da parte de leão na autoria das canções da banda, parece ter ficado incomodada com o abandono. O primeiro reflexo foi Red Heaven (1992), o mais furiosamente rock dos discos dos Muses até então, ao qual se seguiu o anúncio de um período sabático. O maior sinal de alerta, contudo, chegou com a edição do primeiro álbum a solo de Hersh, praticamente gravado em regime auto-suficiente.

A primeira constatação de Hips And Makers é a de que não poderia estar mais afastado da abrasão eléctrica de Red Heaven, já que é um disco essencialmente acústico. Estranha-se até que a produção tenha sido entegue a Lenny Kaye, habituado a acompanhar a visceralidade Patti Smith e normalmente afecto à sujidade rock. Este é também um trabalho delicado, de profundo intimismo, no qual cedo percebemos que as tiras perturbadoras que povoavam as letras de Kristin Hersh nos Muses afinal tinham um cunho pessoal. Recorde-se que foi por esta altura que a autora revelou que sofria de doença bipolar. O francamente fantasmagórico "Your Ghost" dá o mote, com um violoncelo soturno a sublinhar uma melancolia ancorada na sensação de perda. Michael Stipe, que na altura gozava o sucesso recente e desmedido dos R.E.M. dá uma ajuda nos coros, mas nem o estrelato deste valeu a Hersh uma exposição que fosse além do culto dos fieis do costume. Na mesma toada do tema de abertura, "Houdini Blues", "Close Your Eyes", ou "The Letter", adensam o clima lúgubre, deixando no ar uma sensação de desvanecimento, sugerido pelas incríveis tonalidades variáveis da voz. Recorrendo quase em exclusivo à guitarra acústica, com umas pinceladas de violoncelo aqui, umas notas de piano acolá, Kristin Hersh ainda ousa sair da redoma do recolhimento, e assegurar a frontalidade dos Muses. Acontece no desalinhado "Sundrops" e na expressiva primeira parte de "A Loon". A faceta terna, seguramente motivada pela maternidade recente, surge representada por "Beestung", quase uma canção de embalar, e a versão infantilóide do tradicional "The Cuckoo". Já em "Teeth", ou em "Tuesday Night", é-nos permitido o papel de voyeurs da intimidade conjugal.

Sem mais alcançar o efeito surpresa da novidade introduzida por Hips And Makers, Kristin Hersh adoptou esta linha de instimismo para os seus trabalhos em nome próprio, que já são alguns e sempre com motivos de interesse. Quando à pop fracturada, misto de raiva e delicadeza angelical, ficou reservada para os discos que ainda vão saindo com a chancela Throwing Muses, que afinal não chegaram a acabar. Apenas tornaram os longos hiatos de ausência uma constante, felizmente sempre interrompidos com discos merecedores de elogios.



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