"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Black hole sun















Já desde inícios da década passada que os adeptos do género musical normalmente associado ao conservadorismo devem andar a lamentar que já não se façam "metaleiros" como antigamente. Foi por essa altura que começámos a ouvir falar de bandas como Isis, Pelican, ou Red Sparowes, cujo visual em pouco coincidia com o do headbanger típico. Gente com uma sensibilidade que não se resumia às historietas de fantasia e feitiçaria do heavy metal primordial, esta adornava a sua música com elementos afins com o post-rock ou o shoegaze, uma tendência que ficaria baptizada como post-metal. Aquilo que era novidade, rapidamente passou a saturação e a esgotamento de ideias, algo que os pontas-de-lança Isis terão percebido, decidindo terminar funções com dignidade. Ainda que fugaz e algo subterrâneo, este pequeno "movimento" foi o suficiente para chamar a atenção da comunidade indie para sonoridades mais extremas, bem como para alargar horizontes ao consumidor habitual de metal.

Se os citados já tinham chocado as falanges conservadoras, o que dizer agora então do Deafheaven, colectivo californiano que gira em torno do vocalista George Clarke e do guitarrista e compositor Kerry McCoy? Bem, olhando para a dupla nuclear, corremos sérios riscos de os tomar por um bando de geeks da electrónica. Nada de mais errado, pois a matéria prima dos Deafheaven é algo de tão extremo como o black metal, esventrado no superlativo segundo álbum Sunbather, cuja rodela se esconde sob uma capa de perfeita simplicidade que pouco ou nada tem a ver com o imaginário das bandas congéneres do norte da Europa. Também a música do disco, verdadeiramente épico, não se resume aos guinchos maléficos e à cacofonia e distorção extremas, já que, tal como nos casos acima citados, também pede emprestadas as dinâmicas do post-rock e as texturas idílicas do shoegaze. Assim, após o impacto inicial, é sem surpresas que alternamos entre picos de uma vertigem infernal e planícies contemplativas, com guitarras lânguidas e até pianos delicados, sem que se note qualquer incompatibilidade nessas mudanças de registo súbitas. Por outro lado, o conteúdo "lírico" não é a habitual manifestação de misantropia associada ao black metal, mas sim algo de profundamente melancólico e, diria até, ligeiramente romântico. Seguindo o exemplo de pioneiros fusionistas como os Godflesh ou os Neurosis, e a veia experimentalista destes, os Deafheaven não demonstram qualquer receio de correr riscos, juntando à paleta algo de tão inesperado como a spoken word, materializado em leituras de Milan Kundera, à mistura com samples de negociações com dealers (!) e de ladainhas de pregadores de rua. Certo de que o improvável cocktail de Sunbather irá, por motivos diferentes, criar repulsa tanto no público do metal como no de outras tendências mais ortodoxas, não menos certo estou que possa também derrubar preconceitos de ambos os lados. Desde que haja ouvidos polidos para tal, claro está.

[Deathwish Inc., 2013]

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