"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

quinta-feira, 28 de abril de 2011

10 anos é muito tempo #27










UNWOUND
Leaves Turn Inside You
[Kill Rock Stars, 2001]


Em 2001 pareciam mais que esgotadas as hipóteses de qualquer progressão nas expressões post-hardcore. Há muito que os Fugazi e os Girls Against Boys tinham elevado ao ápice os patamares do "género". Os primeiros, sobejamente mais militantes, através de manifestos da afirmação do indivíduo e do livre pensamento, os últimos desnudando, a rudes golpes de groove, o lado mais perverso do ser. Na encruzilhada entre a estagnação e a mudança de azimutes, e destacando-se da legião de meros copistas, o absoluto passo evolutivo provém dos Unwound, algo tão mais surpreendente se atentarmos que a banda sedeada em Olympia ia já no sétimo álbum. 

Leaves Turn Inside You resulta de um intenso labor em estúdio (próprio) e culmina três anos de ausência dos Unwound em matéria de edições discográficas. Desde logo, destaca-se dos anteriores registos da banda pelo formato invulgar de disco duplo, com catorze temas a totalizarem os 76 minutos de música, o que deixa antever a existência de faixas com durações muito acima do convencional. Em termos estritamente musicais, os seguidores mais próximos vislumbram de imediato o abandono definitivo da fórmula acelerada e abrasiva dos primórdios, em favor da aposta em estruturas profusamente complexas e elaboradas. Para tal, a banda não se coíbe de recorrer a instrumentos estranhos à tríade rock: teclados planantes, violinos e violoncelos subtis, pianos discretos, sopros opolentos, e até interferências de estações de rádio exóticas.

Desde a abertura, com um drone contínuo, longo de dois minutos, se percebe que Leaves Turn Inside You não é disco de concessões aos facilitismo. Só no fim do suplício incisivo surgem os primeiros acordes propriamente ditos de "We Invent You". Neste ponto, é evidente o crescimento dos Unwound enquanto executantes, enchendo a música com instrumentações ricas e cuidadas mas, ao contrário do que a tensão latente possa deixar supor, evitando qualquer pormenor excessivo e desnecessário. Neste e nos temas imediatamente seguintes, a estrutura inicial é subvertida gradualmente com a adição de sucessivas pitadas de bom-gosto, de tal forma que é quase imperceptível ao ouvinte as revoluções que se operam dentro dos mesmos. A voz de Justin Trosper ora surge contemplativa, ora desfocada, mas nunca saída das entranhas como outrora. Também neste pormenor, bem como na introspecção das letras, fica assente que estes Unwound são uma banda amadurecida no sentido mais abonatório do termo.

Se no primeiro disco as vocalizações são esparsas, mas determinantes, no segundo vão, progressivamente, constituindo mero adereço perante o depuramento das instrumentações e a envolvência das texturas. O culminar da tendência surge nos temas "Radio Bra" e "Bellow The Salt", duas micro-sinfonias que quase se fundem e que, dentro de si, por mais do que uma vez, parecem desvanecer-se num ambiente de desolação. O encerramento, em jeito de pretenso aliviar da tensão, é ao som de um breve trecho cartoonesco, distante e perfeitamente ambíguo na sua dessintonização.

De forma premeditada, ou talvez não, os Unwound dissolveram-se logo após este golpe de génio. Desde então, os seus elementos têm-se entregue tanto à produção como participação activa em projectos mais que obscuros. Ironicamente, pela altura em que desbravavam novos mundos rock, alguns neófitos olhavam para o retrovisor e ditavam, para o bem e para o mal, tendências para anos vindouros.


"We Invent You"


"Demons Sing Love Songs"


"Bellow The Salt"

2 comentários:

strange quark disse...

Curioso verificar que muitas das saídas estéticas e musicais de uma parte significativa da música mais underground (pese embora o peso dos rótulos que levam) acabe por ser no sentido de uma complexidade musical que os aproxima de um pós-rock (onde cabe, muuuiiita coisa). De uma maneira ou de outra, não deixa de ser irónico face ao status nos anos 70. Hehe!

M.A. disse...

É verdade, sim senhor. Como é verdade que esse tal de pós-rock comporta muita coisa, embora a partir de dada altura se tornasse ponto assente que se resumisse unicamente a "rock" essencialmente instrumental. E, salvo honrosas excepções, cada vez mais chato, já agora ;)

Abraço.