Quem já não é novo nas visitas a este pasquim virtual lembrar-se-á, decerto, dos tempos em louvávamos essa tendência revivalista a que se costuma chamar nu-gaze. Com o passar dos anos, porém, o caso mudou de figura, e hoje tenho de vos confessar alguma falta de paciência para os abundantes projectos recuperadores da vaga shoegaze de inícios de noventas. Mormente daquelas propostas bonitinhas e sintetizadas, que usam e abusam do elemento etéreo da coisa para impressionar os incautos. Neste caudal incessante há, no entanto, excepções como a dos Cheatahs, colectivo multinacional com sede em Londres que, nos últimos dois anos, nos brindou com um par de promissores EPs que eram uma abordagem bastante livre ao shoegaze ainda a navegar em mares de alguma baixa-fidelidade.
Essas imperfeições, que talvez não fossem propositadas, foram completamente ultrapassadas no assalto sónico que é o álbum de estreia homónimo do quarteto. Numa primeira aproximação, facilmente detectamos afinidades com o universo dos My Bloody Valentine, pela saturação das texturas e pelas mudanças de frequência constantes. No entanto, ao contrário daqueles, os Cheatahs mantêm à tona o sentido pop, não embarcando em em devaneios abstraccionistas. Talvez seja apenas impressão minha, mas ao longo da dúzia de temas detectam-se até vestígios dos impulsos de grandiosidade de bandas como os Doves. Porém, a distorção é lei, e se não se alcança o nível espectral de uns Ride, pelo menos recorda-se amiúde, e com alguma surpresa, os saudosos Drop Nineteens, mestres algo esquecidos na combinação da essência pop com o ruído shoegaze. Depois de toda esta prosa, penso que já terão percebido que novidades não será coisa que vão encontrar em Cheatahs, o que não o impede de ser um disco para olhar com saudade para determinado período da década de 1990, quando os sonhos indie pareciam não ter limite. Portanto, e salvas as devidas distâncias, uma sensação idêntica àquela provocada pelo disco de estreia dos Yuck há precisamente três anos.
"Get Tight" [Wichita, 2014]
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