"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Aposta ganha



















Sem desprimor para gente como os Sonic Youth, os Pixies, ou os Hüsker Dü, sou da opinião que nenhuma outra banda foi tão determinante para a explosão "alternativa" de inícios de noventas, dos Nirvana e quejandos, como os Dinosaur Jr.. Nos três primeiros álbuns deste trio de putos dos arredores de Boston vislumbram-se a olho nu as principais características da música de Kurt Cobain e companhia: um rotundo assalto sónico que, fazendo gala da distorção, não enjeita uns curtos solos de guitarra, e um acentuado ennui. Claro que a tensão latente, própria da tenra idade mas também da coexistência de três egos difíceis, acabaria por dar bronca. Como consequência, aos Dinosaur Jr. pertence um dos mais acrimonisos e propalados divórcios das últimas três décadas da música popular. Ao longo da década de 1990, com formações variáveis, J Mascis, que os outros dois (o baixista Lou Barlow e o baterista Murph) acusavam de governar a banda pouco democrática, conduziria a marca Dinosaur Jr. num penoso definhar.

Foi com alguma surpresa que, em 2005, recebemos a notícia da reunião do trio original, agora amadurecido e mais tolerante ao feitio pessoal de cada um. Desde que lamberam as feridas do passado, os Dinosaur Jr. não param de surpreender com o lançamento de álbuns de elevado grau qualitativo, mesmo para os mais cépticos deste fenómeno das reuniões. Já aí está o terceiro, I Bet On Sky de seu nome, que apesar de ser, eventualmente, o mais límpido dos trabalhos da banda, não deixa de lado as suas marcas identitárias. A grande novidade a saltar à vista, porém, é a introdução das teclas por via de um discreto piano martelado num par de temas, por curiosidade ambos próximos da calorosa melancolia de uns Built to Spill. Lou Barlow contribui com o seu já habitual par de temas, que desta feita até nem são o elemento emocional do disco, mas antes os representantes de uma certa secura jangly. A emotividade fica sobretudo a cargo de um Mascis que, sem baixar o volume da guitarra nem tirar o pé do pedal de distorção, desacelera os seus riffs em combinação com o habitual tom lamurioso da voz. Em linha com a "alta-fidelidade" dos vídeos mais recentes, por oposição ao amadorismo low budget de outrora (conferir aqui e aqui), o novo promo até tem guião interpretado por actores profissionais em franca ascensão de visibilidade. Vale a pena ver:

 
"Watch The Corners" [Jagjaguwar, 2012]

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Singles Bar #78









THE DISTRACTIONS
Time Goes By So Slow
[Factory, 1979]




Em termos estritamente temporais, por post-punk entende-se, obviamente, o período imediatamente a seguir  à ebulição punk. Já em termos musicais, o conceito é amplamente vasto, embora tenha passado para a generalidade das massas como o reduto dos chamados urbano-depressivos e dos cultores do funk sob uma óptica (e uma ética) punk. O que hoje é algo negligenciado é que tal período também produziu música pop, algo que podemos afirmar sem termos de avançar até aos sintetismos neo-românticos de inícios de oitentas. Ali mesmo, ainda antes do final da década de 1970, um vasto lote bandas - quase todas hoje esquecidas, algumas de forma criminosa - recuperava os ditames pop de sessentas, aqui com um acento soul, ali com um travo funk, sempre sob a égide da filosofia do-it-youserlf vigente.

Deste caudal de bandas, muitas de vida breve, pelas quais nutro um especial fascínio, destaco os mancunianos The Distractions, um colectivo com inflexões soul-pop que a voragem do tempo apagou, inclusive, da rica história musical da sua cidade. Mas o que é certo é que tiveram o seu período de fulgor, chegando a editar o seu álbum solitário (Nobody's Perfect, de 1980) com selo de uma multinacional, antes da implosão no ano seguinte. Já antes, porém, tinham gravado aquele que seria o seu tema definitivo para a Factory Records, ainda a editora de Tony Wilson e Alan Erasmus não se restringia ao díptico Joy Division/New Order e projectos adjacentes. Com efeito, "Time Goes By So Slow" é uma daquelas canções que merecem a chancela de intemporal, difícil de superar em qualquer carreira, flagrantemente cintilante apesar da carga melancólica própria de uma break-up song. A linha rítmica e a estridência das guitarras remetem fatalmente para o seu tempo, mas o maior traço distintivo deste tema é a voz de Mike Finney, um dos melhores timbres blue-eyed soul da época que entoa cada frase com uma urgência tocante. Tenho de vos confessar que, no momento em que vos escrevo estas toscas linhas, e "Time Goes By So Slow" roda em repeat, sou percorrido por um misto de arrepio e revolta por esta canção não ser divulgada aos quatro ventos.

Poderá essa ténue esperança que tal aconteça até nem ser vã, isto porque de há dois anos a esta parte os Distractions estão de volta ao activo e acabam de editar um álbum. Já o ouvi com alguma insistência e posso afiançar-vos que The End Of The Pier mantém intactas, volvidos uns respeitáveis 32 anos, as melhores qualidades da banda, i.e., um apurado sentido pop, um romantismo desolado de outras eras, e uma voz que carrega em si a urgência que só julgávamos possível em cantores de tenra idade.


terça-feira, 25 de setembro de 2012

Ao vivo #93


















THE PARKINSONS @ Ritz Clube, 22/09/2012

Sob risco de apedrejamento na praça pública, gostava de deixar claro que sou daqueles que acham algo sobrevalorizada (bastante mesmo) toda a "cena" coimbrã em torno dos Tédio Boys e seus respectivos sucedâneos. Neste grupo incluem-se os Parkinsons, se bem se lembram aquela banda que há uma década ameaçava corromper com subversão a Londres rendida ao "novo rock", mas acabou por figurar como uma patética nota de rodapé desse período da música popular.

De então para cá, e após um longo período de ausência, o que terá mudado é apenas a formação, agora integralmente tuga. De resto, os Parkinsons ainda discorrem o mesmo chorrilho de clichés, ora surripiados aos Stooges, ora aos Cramps. A presença em palco, e em particular do vocalista Afonso Pinto, é um decalque de mimetismos de um tal Iggy Pop, como se o mundo não estivesse já enfastiado com os tiques do próprio. Quanto à música, envereda invariavelmente por um hard-rock "rasgadinho", estridente e monocórdico a que, por equívoco, hoje se chama garage-punk. Para cúmulo, os Parkinsons não cumprem as promessas, pois depois de anunciarem o fim do concerto, regressam para mais uma meia dúzia de temas, a maioria deles repetidos no alinhamento. Ou seriam outros temas indistintos dos demais?! Em jeito de resumo, gostaria de definir a função com a eloquência de um punk daqueles com mohawk perfeito, antes da sua retirada estratégica para junto do bar: "este concerto é uma verdadeira anedota". Anedota, sim, mas daquelas sem piada...

Ao vivo #92

















THE TELESCOPES + JAMES JACKET @ Centro Cultural do Cartaxo, 21/09/2012

A prudência aconselha-nos a aguardar estes concertos das "nossas" bandas de outras eras com freio nas expectativas. Felizmente, raras foram as que me deixaram ficar mal, e algumas, como foi o caso dos britânicos The Telescopes, chegam a superar largamente o expectável. Da banda original que, no seu período áureo na viragem de oitentas para noventas, se revelou demasiado explosiva para encaixar tanto na vaga drony dos Spacemen 3 e dos Loop como nas contemplações shoegaze, resta apenas o vocalista e mentor Stephen Lawrie. Os proventos serão ainda hoje menores que naqueles tempos, e não permitem sequer que a totalidade da formação viaje até ao nosso país. De maneira que baixista e baterista tenham sido recrutados no burgo, isto sem que a sua menor rodagem se tenha feito notar. Os restantes três elementos - Stephen e dois guitarristas -, quer pela sua postura de uma subversão alienada, quer pela entrega às manipulações de ruído, centram em si as atenções e disfarçam eventuais deficiências de entrosamento.

Logo a abrir, com o "clássico" "To Kill A Slow Girl Walking", os Telescopes dão a entender que não estão em terras ribatejanas para um concerto pacífico. Da primeira fase da banda há uma predilecção pelos temas mais ruidosos (também o brilhante "The Perfect Needle" fez parte do alinhamento), oportunidades para Stephen e um dos dois guitarristas ensaiarem rituais de catarse com visitas à audiência incluídas. Menos conhecida do público, a sua obra mais recente realça o cunho spacey da sua música. Representa uma boa fatia do alinhamento, com os três músicos ingleses invariavelmente prostrados perante os pedais em devaneios de induções de estados mentais alterados. Stephen é, obviamente, a estrela da companhia, e a sua performance alheada do mundo terreno faz jus à música exploratória dos Telescopes. Após o concerto, entregue ao comércio do merchandising, parece irreconhecível na sua humilde afabilidade.

De James Jacket, o músico português a quem foram entregues as honras de abertura da noite cartaxense, pouco ou nada a dizer que seja em seu benefício. Em poucas palavras, diria apenas que é um fazedor de uma bedroom-pop - com guitarra e sons pré-gravados - que cruza o impensável: os ambientes plúmbeos dos Dirty Beaches com o exibicionismo técnico de um Santana ou de uns Pink Floyd da pior fase. Isto apenas nos dois primeiros temas, os únicos a que assisti antes de me decidi para aproveitar um último fogacho da noite estival com cigarro e cavaqueira no exterior do CCC.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Good cover versions #68












BELLE & SEBASTIAN _ "Crash" [LateNightTales, 2012]
[Original: The Primitives (1988)]

Talvez já aqui o tenha dito, mas não me canso de repetir que os britânicos The Primitives são uma das melhores e mais injustiçadas bandas indie-pop da vaga que vai de meados a finais de oitentas. Com uma mão cheia de singles aspirantes a hits já em carteira, não lograram algum até à edição de "Crash", um tema que não é de forma alguma representativo da banda, tanto pela sua polidez como pelo refrear de um certo impulso punky. Não é um mau tema, bem longe disso, mas peca pelas razões atrás apontadas para merecer ser o tema definitivo - e talvez o único conhecido das massas - da banda. Valha-nos, em compensação, que serviu de amostra para o grande público do irresistível sentir pop sessentista da "geração C86".

Recentemente, e por ocasião da sua segunda investida como "curadores" para as compilações LateNightTales, os Belle & Sebastian pegaram em "Crash" e deram-lhe um cunho bastante pessoal. Foi o tema eleito pelos escoceses para a habitual versão de cada capítulo daquela série de edições dedicada a música de suposta audição nocturna. Representativo da actual fase da banda de Stuart Murdoch, substancialmente mais uptempo que outrora, "Crash" tem um delicioso travo vintage, com pianadas e ritmos de danças de salão. Se na versão original o tema privilegiava a luminosidade pop em detrimento da profundidade, pelos B&S regista um incremento do carácter lúdico. Portanto, uma versão em nome diversão, porque não?


terça-feira, 18 de setembro de 2012

Profetas do apocalipse
















No vasto contingente de bandas regressadas ao activo nos últimos anos, os Swans pertencem àquele grupo restrito das que têm algo de novo para dizer. Há coisa de dois anos, quando o regresso se consumou, Michael Gira fez questão de avisar que o retorno não seria uma repetição do passado. Nesta demanda, fez-se rodear de um naipe de músicos experimentados, todos eles veteranos das franjas da música popular norte-americana. No entanto, My Father Will Guide Me Up A Rope To The Sky, o disco imediato ao anúncio do regresso, não deixava de evocar o mesmo poderio sónico dos Swans dos primórdios, se bem que numa vertente menos dissonante, mas com o mesmo propósito castigador.

Talvez beneficiando do lapso de tempo decorrido desde que o actual sexteto se formou, o novo e mui recomendado The Seer é ainda mais feliz nesses intentos de congregar a fisicalidade brutal de outrora com a maturidade e experiência adquiridas. Segundo o próprio Gira, o disco - duplo - é o resultado de um processo de trinta anos, tantos quantos os que leva no activo, uma espécie de culminar de todo o qualquer disco gravado, quer com os Swans, quer em qualquer dos outros projectos em que se envolveu. Este processo, diz, ainda se encontra inacabado, apesar de The Seer ocupar duas horas com apenas onze faixas, muitas delas, obviamente, com durações muito para além do convencional. Esses 120 minutos de música pedem que se oiçam de uma assentada, funcionado como uma espécie de banda sonora do quotidiano, alternando, à boa maneira dos Swans, a fealdade de um mundo em desagregação com alguns momentos de rara beleza. Ainda assim, o tema-título é a peça central e um possível resumo da obra integral. Longo de mais de 32 minutos, compõem-se de diferentes andamentos, integrando muitas explosões ruidosas, ritmos marciais, e momentos de uma contemplação apreendida nas escolas post-rock. A percussão, da responsabilidade de Thor Harris (também membro dos Shearwater) assume papel congregador, enquanto a voz de Gira aparece apenas a espaços numa lenga-lenga doentia. Funcionará, imagina-se, como a introdução perfeita para os concertos que se seguirão, na senda dos arrebatamentos que já pudemos testemunhar por alturas do anterior álbum. Na restante dezena de temas, com algumas liturgias macabras, algumas canções de redenção, e muita ruideira vertiginosa, o lote de convidados é digno de referência: Alan Sparhawk e Mimi Parker (Low), os amigos dos Akron/Family, Karen O (Yeah Yeah Yeahs), Grasshopper (Mercury Rev), Ben Frost, e até Jarboe, a antiga companheira de Gira tanto nos Swans como na vida pessoal.


"Mother Of The World" [Young God, 2012]

domingo, 16 de setembro de 2012

A era prateada

















O fim acrimonioso dos Hüsker Dü era algo mais ou menos previsível para os seguidores mais próximos. Afinal de contas, a raiva incontida que se libertava na música do trio vivia de uma dinâmica que incluía álcool e drogas em quantidade, e as tensões latentes entre os seus dois vocalistas/compositores. O suicídio do manager de sempre, eventual peça unificadora, acabaria por ser a gota de água. A perda foi lamentável, pois extinguiu-se uma banda no pleno das suas forças mas, por outro lado, transmitiu-se uma herança imaculada para aquilo que seria a explosão "alternativa" de inícios de noventas. Convém lembrar que, neste particular, os Hüsker Dü foram, talvez, a banda mais determinante na aceitação massificada de gente como os Pixies, os Nirvana ou os Sonic Youth. Os caminhos separados tiveram diferentes níveis de exposição, com Grant Hart mais discreto e errático, muito por culpa do longo período de dependência das drogas, mas com uma obra deveras interessante. Bob Mould, por seu turno, foi alvo de maiores atenções. Esta exposição, que não raras vezes entrava pelo foro privado, obrigou a um longo período de expiação dos demónios, reflectido nas indecisões quanto ao rumo a dar à carreira a solo. As opções estéticas, com diferentes graus qualitativos, passaram pela música acústica, o rock furioso e descarnado, e até a electrónica.

Hoje, na sua meia idade, Bob Mould é uma pessoa diferente do puto de vinte e poucos que se viu catapultado para a primeira linha do indie-rock norte-americano. Domado o angst de outrora, é uma figura respeitada e respeitável, mesmo quando a obra musical não é propriamente digna de nota. Não é esse o caso do novíssimo Silver Age, já o décimo álbum de uma carreira com altos e baixos, que arrisco a eleger como o mais coeso de todos os seus trabalhos em nome próprio. As afinidades com a sonoridade dos Sugar, o seu "outro" power-trio lendário, são por demais evidentes. Portanto, Silver Age é uma monstruosidade guitarrística, rico em emaranhados de riffs, electricidade, distorção, e uma singular carga melódica, mesmo nos registos próximos da balada, algo que também já conhecíamos nos Sugar. Nas letras reside, eventualmente, a grande diferença com esses tempos gloriosos, pois raramente entram pelos territórios sombrios de outrora. Neste regresso ao passado haverá dois factores que terão sido determinantes: um deles a recente rodagem pelos palcos do excelso Copper Blue (disco de estreia dos Sugar de 1992) na íntegra, o outro será o facto de, embora creditado apenas a Mould, Silver Age ter sido concebido por um trio fixo. Um dos integrantes deste colectivo é Jon Wurster, habitualmente baterista dos Superchunk, que terá incutido alguma da carga enérgica da sua banda do dia-a-dia ao disco.

 
"The Descent" [Merge, 2012]

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

First exposure #47

















MELODY'S ECHO CHAMBER

Formação: Melody Prochet (voz, instrumentos)
Origem: Paris [FR]
Género(s): Indie-Pop, Dream-Pop, Psych-Pop, French-Pop
Influências / Referências: Lush, Cocteau Twins, The Beatles, Tame Impala, Saint Etienne, Broadcast

https://www.facebook.com/MelodysEchoChamber

"I Follow You" [Fat Possum, 2012]

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Adivinha quem voltou... - Pt. 3

















Vivemos num tempo em que a nostalgia é uma indústria. Ao serviço desse negócio, já são incontáveis as bandas regressadas ao activo para tournées mais ou menos lucrativas. Nada tenho contra as opções dessas bandas - até porque muitas me possibilitaram assim vê-las em palco - porque lhes reconheço o direito à recompensa financeira que não tiveram numa primeira vida. No entanto, prefiro quando o regresso aos palcos vem acompanhado de novos discos. Três casos de interrupção de um longo silêncio, de domingo a terça feira. 

Oriundos da Nova Zelândia, os Bailter Space - ou Bailterspace, como muitas vezes assinam - não chegaram a tempo de apanhar a primeira e mui relevante vaga indie-pop daquele distante arquipélago. Formados apenas em 1987, já não alinharam pela mescla de psicadelismo e lo-fi de muitos dos seus antecessores da viragem de setentas para oitentas. No entanto, nascidos das cinzas dos abrasivos Gordons, e integrando um antigo membro dos lendários The Clean, foram facilmente absorvidos na autêntica irmandade que é "cena" neozelandesa há mais de trinta anos. Obviamente, lançaram os primeiros discos pela mítica Flying Nun Records. A sua peculiar proposta, misto de noise-rock e texturas atmosféricas, haveria de lhes valer referências como "os Sonic Youth do hemisfério sul", descrição que julgo demasiado redutora para a singularidade da música dos Bailter Space. Se por força dessas referências, se por mérito próprio, o culto em seu redor saltaria fronteiras, ao ponto da "gigantesca" Matador Records lhes garantir a distribuição americana a partir de inícios da década de 1990. Na mesma altura a banda mudava-se de armas e bagagens para Nova Iorque, atingindo um pico de popularidade por alturas da edição de Wammo (1995), disco algo incaracterístico com uma abordagem indie-rock mais ortodoxa. Depois de um longo hiato, os Bailter Space acabam de regressar aos discos com uma formação reduzida ao vocalista/guitarrista Alister Parker e ao baterista Brent McLachlan. Com a ajuda de escassos colaboradores, a dupla faz de Strobosphere um retorno à sua sonoridade característica, mesmo atendendo a que o último álbum - Solar.3 - já dista treze anos no tempo. Composto por onze faixas carregadas de fuzz, Strobosphere recupera todo o gosto dos seus autores pelas combinações de atonalidade com melodia, de beleza celestial com ruído distorcido. Se a estas características somarmos a aura spacey, e alguns discretos apontamentos electrónicos, concluímos que, mais que nunca, a sonoridade dos Bailter Space está na ordem do dia das tendências do universo indie-pop/rock. Motivos então para saudarmos o seu regresso com uma espécie de estatuto pioneiro. E em excelente forma, caso me tenha esquecido de vos ter dito.


"No Sense" [Arch Hill / Fire, 2012]


"Blue Star" [Arch Hill / Fire, 2012]

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Adivinha quem voltou... - Pt. 2

















Vivemos num tempo em que a nostalgia é uma indústria. Ao serviço desse negócio, já são incontáveis as bandas regressadas ao activo para tournées mais ou menos lucrativas. Nada tenho contra as opções dessas bandas - até porque muitas me possibilitaram assim vê-las em palco - porque lhes reconheço o direito à recompensa financeira que não tiveram numa primeira vida. No entanto, prefiro quando o regresso aos palcos vem acompanhado de novos discos. Três casos de interrupção de um longo silêncio, de domingo a terça feira. 

A história dos Redd Kross remonta a finais da década de 1970, quando os irmão Jeff e Steven McDonald ainda eram uns adolescentes impressionados com a explosão punk. Nos anos que se seguiram, e apesar da escassa produção discográfica, teriam um papel pioneiro no estabelecimento de uma linguagem indie tipicamente norte-americana. Nesse período, e embora a história nem sempre lhes faça a devida justiça, estes californianos tiveram um papel de igual importância ao de uns Sonic Youth. Aliás, foram muitas vezes companheiros de estrada da banda de Thurston Moore & C.ª, à qual terão incutido o gosto pelas referências da cultura popular e pela construção de canções dignas desse nome. A sua mistura explosiva de punk-pop e power-pop, insuflada de espírito juvenil, teria maior aceitação durante a década de 1990, com uma maior abertura do mercado e dos media às tendências ditas "alternativas". Depois de um interregno de 15 anos, e quando parece que a sua sonoridade caiu em desuso, os Redd Kross reincidem com uma formação recuperada desses tempos áureos. O primeiro resultado da reunião é Researching The Blues, álbum que é uma surpreendente descarga de adrenalina que fará a inveja de muito puto aspirante a músico rock. Seguindo por uma via classicista que evoca tanto The Beatles com The Byrds, imersos num banho power-pop profusamente melódico, o disco é um autêntico festim de riffs e refrões orelhudos. A audição é de fácil assimilação e confere que, apesar de andarem a rondar o meio século de idade, os membros dos Redd Kross não perderam o seu colorido sentido pop. De igual modo, mantêm intacto o bom humor na abordagem às referências da cultura pop, como atesta o vídeo promocional abaixo.

 
"Stay Away From Downtown" [Merge, 2012]

domingo, 9 de setembro de 2012

Adivinha quem voltou... - Pt. 1

















Vivemos num tempo em que a nostalgia é uma indústria. Ao serviço desse negócio, já são incontáveis as bandas regressadas ao activo para tournées mais ou menos lucrativas. Nada tenho contra as opções dessas bandas - até porque muitas me possibilitaram assim vê-las em palco - porque lhes reconheço o direito à recompensa financeira que não tiveram numa primeira vida. No entanto, prefiro quando o regresso aos palcos vem acompanhado de novos discos. Três casos de interrupção de um longo silêncio, de domingo a terça feira. 

Na viragem de setentas para oitentas, os nova-iorquinos The dB's constituíam o paradigma do revivalismo power-pop que haveria de condicionar as tendências do indie-rock norte-americano de então para cá. Extinguiram-se em 1988, depois de 10 anos de aclamação crítica, vendas modestas, mas um culto sólido. Dos quatro álbuns gravados até então, os dois primeiros (Stands For Decibels e Repercussion, de 1981 e 1982, respectivamente), justamente os únicos com o mentor e compositor Chris Stamey na formação, constituem a matriz da fase mais inspirada da carreira de bandas como The Posies ou Teenage Fanclub. Recentemente, Stamey viu a sua dedicação "recompensada" com o aval, pouco antes da morte daquele, do "guru" Alex Chilton ao espectáculo Big Star's Third, a homenagem de um elenco all-star à memória e ao disco "maldito" dessa figura incontornável do universo power-pop. Já reactivados desde 2005, os dB's entendem ser este o momento apropriado para o regresso aos discos, um quarto de século depois do último. Gravado pela formação original, Falling Off The Sky, já está longe do ambiente festivo do par de álbuns referido. Aposta antes numa sonoridade amadurecida, que integra alguma ortodoxia rock e até ecos de americana. Algo que a banda parece não ter perdido é o sentido melódico, algo bem patente nas onze faixas que, julgo, vão agradar aos acólitos dos contemporâneos The Hold Steady.


 
"That Time Is Gone" [Live @ SxSW 2012 - Austin; Original no álbum Falling Off The Sky (Bar/None, 2012]

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

My iron lung

















Já por mais do que umas vez vos tinha prevenido que, para gáudio pessoal, os bons velhos sons de noventas estavam no ordem do dia. Fi-lo a propósito de bandas tão díspares como os Japandroids, os Cymbals Eat Guitars, os Male Bonding, ou os Yuck. Qualquer delas recupera sem pudores as boas memórias de alvores daquela década, por ocasião da explosão "altern-rock" por via de bandas como os Superchunk, os Built to Spill, os Nirvana, ou os Teenage Fanclub, entre tantas outras. Felizmente, e ao contrário do que sucede com o infindável revivalismo da década anterior, esta "tendência" tem sido mais contida, reduzida praticamente ao underground, pelo que as hipóteses de rápido fastio são mais reduzidas.

Hoje apetece-me lançar mais uma acha para a fogueira e apresentar-vos uma banda que dá pelo nome de White Lungs. Com uma formação maioritariamente feminina, este quarteto vem de Vancouver, no Canadá, se bem se lembram aquele país que há pouco mais de meia dúzia de anos jorrava bandas a um ritmo alucinante, perfilando-se como uma espécie de terra dourada do indie-pop/rock. A triagem do tempo desfez equívocos, mas ainda assim ficaram para memória futura uma mão cheia de discos. Nos tempos que correm, o Canadá já não é propriamente o berço da mesma pop conformista para adultos burgueses armados ao "indie". Agora as referências são mais dispersas, e no caso das/dos White Lungs alinham pela facção riot-grrrl de nomes como Bikini Kill, Hole, Babes in Toyland, ou Silverfish. Exibem, pois, a crueza, a rispidez, e o empolgamento feminista daquelas mulheres iradas que as/os antecederam. Convém esclarecer que já vão com um par de álbuns, e que a vocalista Mish Way já tem algum passado em bandas de pendor punky. Porém, só agora, com o recente Sorry ganham alguma visibilidade. Este segundo disco acaba por ser o paradigma da tal urgência punk, nos seus dez temas em tempo record - menos de 20 minutos! No entanto, na sua curta duração, cada tema não se coíbe de ostentar um certo sentir melódico que o distingue da "concorrência".

 
"Bag" [Deranged, 2012]

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Mil imagens #32



Liars - Berlim, 2005
[Foto: Steve Gullick]

Teen spirit

















Em tempos que já lá vão, Teeny Lieberson esteve remetida ao discreto papel de teclista dos algo sobrevalorizados - diria mesmo irritantes - Here We Go Magic. Abandonou o barco, talvez porque pressentisse que poderia valer algo mais, e certamente porque se orientava por outras linhas estéticas. Formou a sua banda, escreveu as suas próprias canções, e revelou uma voz maleável, capaz de variações demasiado interessantes para ficarem vedadas ao grande público.

Podem conferir estas capacidades em In Limbo, o recém editado disco de estreia das TEEN (o nome deriva do da mentora, certamente), quarteto feminino que no alinhamento inclui outras duas manas Lieberson. A diferenciá-lo do mulherio norte-americano apostado em recuperar a pop de outrora está a prevalência das texturas sintéticas, por oposição à aposta da guitarras fuzzy da maioria das contemporâneas. No entanto, na aura atmosférica de In Limbo, torneada pelas nuances vocais de Teeny, não deixam também de ser evocadas as memórias girly-pop de sessentas. A este pendor revivalista não será imune o trabalho do produtor, homem versado na história da pop nos seus mais variados quadrantes. Falo-vos de Peter "Sonic Boom" Kember, uma das metades criativas dos míticos Spacemen 3 que, após um longo exílio, revela uma certa hiperactividade ao serviço das "novas" tendências. Sim, porque no caso das TEEN, não deixa de haver um pequeno senão na insistência nas já algo estafadas texturas planantes oitentistas. No balanço final, diria que In Limbo aventa a hipótese de como soariam as chatinhas Warpaint se tivessem uma pinga de sangue na guelra. E lá estou eu outra vez a entrar no campo das sobrevalorizações...

"Electric" [Carpark, 2012]

domingo, 2 de setembro de 2012

R.I.P.



HAL DAVID
[1921-2012]

Morreu ontem em Los Angeles, já com uns provectos 91 anos de idade, Hal David. O seu nome é indissociável do de Burt Bacharach, com o qual formou uma dupla responsável pela escrita de muitos dos temas pop mais emblemáticos do século XX. David era o letrista, Bacharach o compositor.

O primeiro encontro de ambos ocorreu em 1957, iniciando-se aí uma parceria que prevaleceria até inícios da década de 1970. O trabalho conjunto renderia uma míriade de hits, entre eles "Raindrops Keep Fallin' On My Head", "Walk On By", "I Say A Little Prayer", "(There's) Always Something There To Remind Me", "What The World Needs Now Is Love", "Close To You", ou "The Look Of Love", alguns premiados no meio da indústria discográfica. Os artistas contemplados com as canções da dupla incluem Dionne Warwick, Jackie DeShannon, Dusty Springfield, The Carpenters, B.J. Thomas, ou Gene Pitney. Desfeita a parceria, Hal David faria carreira, relativamente mais discreta, ao serviço dos musicais da Broadway.

Como se afere pela pequena lista de temas acima, todos eles interpretados por um sem número de artistas, Hal David marca um tempo que, sem aspirações a grande profundidade, cada canção ganhava a intemporalidade. Tempos bem diferentes destes que vivemos, em que, apesar das pretensões "artísticas" de seriedade, raras são as canções cujo prazo de validade vai para além da mudança de estação.

 
Jackie DeShannon _ "What The World Needs Now Is Love" [Live @ Shinding!, 1965]