"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

10 anos é muito tempo #26







LIFE WITHOUT BUILDINGS
Any Other City
[Tugboat, 2001]




Nem toda a música produzida na Escócia se caracteriza pelas canções pueris e as guitarrinhas melodiosas. Entre aqueles que contrariam essa tendência, ocupam lugar de destaque os Life Without Buildings, colectivo de vida breve formado por quatro jovens estudantes da Glasgow School of Arts que foi buscar o nome a um tema dos Japan mas que não poderia estar mais afastado dos maneirismos da pop sofisticada da banda que revelou David Sylvian. Para a posteridade deixaram um único registo de longa-duração, disco esse ao qual se aplicam as célebres palavras de Pessoa acerca do mais popular refrigerante gaseificado - primeiro estranha-se, depois entranha-se.

Efectivamente, Any Other City é um daqueles pequenos tesouros que, pela sua imprevisibilidade e aparente estranheza, apenas partilhamos com ouvidos treinados e receptivos à novidade. Tal qual o foram os Sugarcubes no seu tempo, os LWB foram mais um atestado de que uma certa naivité só pode ser benéfica para a capacidade de surpreender e inovar. Any Other City vive de uma dinâmica conflituosa entre dois elementos aparentemente inconciliáveis: música e voz. A primeira, mais alinhada nas tendências indie, caracteriza-se pela economia de recursos. As guitarras, esquálidas e tensas, derivam da escola Velvets / Feelies. Porém, não enjeitam uma oportunidade de melodia, como é o caso de "Young Offenders", com um ritmo quebrado, quase-reggae, que faz duvidar da autoria de um certo tema dos Bloc Party popularizado por um anúncio publicitário de operadora de telecomunicações. Já a voz de Sue Tompkins é o maior trunfo e o traço mais distintivo da peculiar sonoridade dos LWB. Semi-declamado, remete de imediato para nomes do post-punk como Lizzy Mercier Descloux ou os Delta 5. Quando envereda pelo tom acusatório vem-nos à memória Poly Styrene, dos X-Ray Spex, enquanto o uso abundante da repetição é marca registada do senhor Mark E. Smith.

Discorrendo abundantemente sobre as tropelias das relações inter-géneros, de um ponto de vista obrigatoriamente feminino, Sue Tompkins soa por vezes como uma criança precocemente desencantada e desiludida, tal o azedume das palavras. A gama de recursos permite-lhe ir do irado ("Juno", "Envoys") ao vertiginoso ("Philip"), do groovy ("PS Exclusive") ao piedoso ("Sorrow"). Neste último tema, reminiscente da versão de "Sweet Jane" pelos Cowboy Junkies, mas desprovida da candura daquele, condensa-se toda a amargura do mundo nos quase sete minutos de duração. A vocalista, no seu momento mais confessional, ora gagueja, ora parece estar prestes a desvanecer-se, deixando no ar um misto de desconforto e complacência.


"PS Exclusive"


"Young Offenders"


"Sorrow"

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Duetos #30












Caso raro nos meandros indie-pop digno desse nome na América de noventas, os Velocity Girl devem o nome a uma velhinha canção da fase imberbe dos Primal Scream, o que diz bem da "orientação britânica" do quinteto do Maryland. As vocalizações eram tarefa quase exclusiva da belíssima Sarah Shannon, dona de um timbre deveras semelhante ao de outra musa ianque, de seu nome Tanya Donelly. Este é um dos poucos temas da banda em que essa função é repartida com o guitarrista Archie Moore. Resultado: uma das muitas pérolas pop cintilantes de uma década que, ao contrário do que possa parecer, nos deu algo mais, muito mais, do que a ruína radiofónica pós-grunge.

Velocity Girl _ "I Can't Stop Smiling" [Sub Pop, 1994]

R.I.P.


CLARE AMORY
[1975-2011]

Morreu na passada sexta-feira, dia 25, Clare Amory, integrante do colectivo Excepter, nome reputado nas franjas mais experimentais da música popular. Formado nos alvores no novo século, este combo nova-iorquino conta com uma vasta obra discográfica nos mais diversos formatos. A sonoridade, praticamente incatalogável, compreende electrónica, noise, psicadelismo, elementos étnicos, estilhaços de hip-hop e dance-music, e muita improvisação. Amory era um dos membros mais carismáticos do projecto para o qual contribuía nas vocalizações, nas manipulações electrónicas, e nas percussões. Juntamente com o colega Nathan Corbin, participou também como baterista na performance 77 Boadrum levada a cabo em Brooklyn a 07/07/2007 por iniciativa dos japoneses Boredoms. Tinha apenas 35 anos e sucumbiu a um cancro fulminante.

Excepter _ "Any And Every" [Paw Tracks, 2008]

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

I'm a weirdo. What the hell am I doin' here?















Em décadas que já lá vão, Filadélfia notabilizou-se pelo traço peculiar nas mais refinadas sonoridades soul. Muitos anos mais tarde, mais propriamente em meados de noventas , a maior cidade da Pennsylvania assistiu a um súbito interesse dos seus jovens músicos pelas sonoridades psicadélicas. Foi em tal contexto que nasceram bandas como Bardo Pond ou The Asteroid #4, ambas ainda no activo e exímias na arte da música apontada ao subconsciente. Reavivando essa linhagem, entretanto interrompida por falta de sucessores, surge uma banda com o espamtoso nome de Creepoid

Revelado no ano passado através do EP Yellow Life Giver, o quarteto refina as boas indicações daquele registo no álbum Horse Heaven, recentemente lançado. O disco distingue-se pela toada arrastada, quase lisérgica, que, a espaços, rebenta em clímaces de distorção. Ao longo da audição, em estado de semi-transe, são sugeridos espaços abertos infinitos e firmamentos pejados de estrelas. As vozes são duas, uma masculina, outra feminina, que por uma ou outra vez se fundem, entorpecidas, em diálogos de total despojamento. A dele, Pat Troxell, é nasalada e vagamente folky, a fazer lembrar Stephen McBean quando veste a pele Pink Mountaintops. No dolente "Find You Out", ou no derradeiro tema-título, tem a particularidade de soar a uma espécie de Thom Yorke depois da ingestão de uns quantos bagaços com o intuito de engrossar o choradinho. A dela, a irmã, Ana Troxell, lamenta-se que não esteja mais presente, pois, passe o sacrilégio, encarna uma Hope Sandoval vitaminada e encharcada de ácidos. Fica uma singela amostra:


"Spirit Birds" [Ian, 2011]

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Singles Bar #60








GANG OF FOUR
Damaged Goods
[Fast Product, 1978]




Limado nas arestas e investido de um contagiante impulso rítmico na versão "final" surgida no colossal álbum Entertainment! (1979), "Damaged Goods" é desde logo, na sua primeira versão "rude", matriz para a sonoridade deveras inspirada dos Gang of Four, a mesma que seria copiada ad infinitum em período post-punk e abusada ad nauseum no decorrer da década passada. Passe a redundância, os seus escassos 3'32'' de duração serviram de base ao Portugal musical da alvorada de oitentas (confiram a seguir ao texto, sff).

A fórmula, na altura inaudita, é simples: secção rítmica cadenciada a transpirar funk, na qual se destaca o baixo quase palpável de Dave Allen, e a guitarra de Andy Gill a soltar faíscas de metal incandescente que conferem à coisa uma significativa contundência. A coroar a aura de austeridade, o vocalista Jon King contribui com algumas das letras mais astutas da época, recheadas de analogias entre as relações amorosas e as regras económicas da sociedade de consumo. Interventivas tanto no campo sociológico, como no político, portanto. Ou seja, observações pertinentes das doenças sociais sob um ponto de vista que mistura doutrinas maoista e situacionista.

Os dois temas que preenchem o lado B regem-se por idênticas premissas. Em "Love Like Anthrax", ainda mais distante da versão definitiva do álbum, a guitarra experimenta assomos de feedback controlado sobre uma batida minimalista. Já em "Armalite Rifle", a bateria marcial do começo abre espaço para uma sucessão de riifs marcantes que denunciam as sementes punk da bando dos quatro de Leeds.


"Damaged Goods"


"Love Like Anthrax"

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Mil imagens #15


Evan Dando - Gramercy Hotel, Nova Iorque, 2003
[Foto: Christian Lantry]

A imagem de hoje ilustrou a entrevista concedida por Evan Dando à revista Magnet por ocasião do lançamento do seu primeiro e único disco a solo - Baby I'm Bored. O poster boy da geração grunge interrompia assim um período de hibernação que durava desde o fim dos Lemonheads, em 1997. Esse hiato, como o próprio à data fez questão de frisar, foi aproveitado da melhor maneira para se libertar das drogas. O que mais surpreendeu Christian Lantry, habitual colaborador daquela publicação americana, durante a sessão fotográfica foi a revelação de Dando relativamente ao antigo dono do casaco de malha que enverga na foto: Kurt Cobain. O próprio fotógrafo não resistiu, e fez questão de usar aquela peça de vestuário durante boa parte da sessão.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Afinal, há tempo para sonhar
















A vida de Charles Bradley é daquelas que davam um filme carregado de dramatismo mas com final feliz. Na juventude, durante a década de 1960, este cantor nascido na Florida mas criado em Brooklyn, Nova Iorque, foi espectador privilegiado de um concerto de James Brown, então no pico de forma com performances sobre-humanas que constam dos anais da música popular. Deste momento de epifania nasceu o sonho de seguir as pisadas do mestre. Contudo, a sorte não lhe acenou com oportunidades para tal, e a sobrevivência foi, ao longo de décadas, assegurada por empregos duros e mal remunerados pelos quatro cantos dos Estados Unidos. Enquanto isso, ia dando provas das suas capacidades interpretativas em pequenos palcos longe dos olhares do grande público. Já no início do século XXI, a perseverança deu o primeiro fruto, materializado através de um single com o seu nome impresso na capa. A experiência repetiu-se ao longo da última década de forma esporádica e perante a indiferença generalizada. E eis que, com a bonita idade de 62 anos, Charles Bradley estreia-se finalmente em formato longo com um tratado de soul da velha escola intitulado No Time For Dreaming. Boa parte do mérito vai para Tom Brenneck, fundador da editora Dunham, pequeno selo ligado à ligeiramente maior Daptone Records (outrora os grandes nomes da soul eram disputados como espécimes raros e valiosos pelas grandes editoras... sinais dos tempos...), que acreditou neste talento em estado bruto e lhe disponibilizou a Menaham Street Band para as sessões de gravação. Este colectivo de músicos provenientes de várias bandas ligadas à citada editora é responsável pela toada soul sulista que percorre No Time..., com metais luxuriantes em quantidades estimáveis, alguns ritmos funky, breves apontamentos de raiz latina, e os inevitáveis coros carregados de espiritualidade. A estrela da companhia é, contudo, a voz amadurecida e granulosa de Charles Bradley, um soul-man de corpo inteiro capaz de ombrear com os maiores. As canções, em número de doze, percorrem com elevado estilo a habitual cartilha do género, ora insufladas de um romantismo charmoso, ora com pertinentes e doridas observações de pendor sócio-político. É sobretudo nesta última categoria que aquela aspereza da voz dá especial ênfase ao carácter pessoal e sincero das palavras. 

"The World (Is Going Up In Flames)" [Dunham, 2011]

Not for diehards?
















Foto: Steve Gullick

É facto incontestável, pelo menos para cidadãos conscientes, de que a vertente maioritariamente instrumental do post-rock já conheceu melhores dias. A este declínio, tanto pela repetição como pelo vazio de ideias novas, tanto por culpa própria como do batalhão de cópias a papel químico, os escoceses Mogwai não escaparam ilesos. Coincidente com o esgotamento da dinâmica quiet/loud/quiet de torrentes guitarrísticas, o melhor que conseguiram foi refinar o jeito que levam para a escolha de títulos, muitas vezes misto de subversão e humor sarcástico. A cereja no topo do bolo é o nome do sétimo álbum de originais: Hardcore Will Never Die, But You Will. Porém, mais importante que estas questões de pormenor, é constatar que este novo trabalho é - pasme-se! - um pequeno golpe-de-asa que já não esperávamos do colectivo de Glasgow. Os indefectíveis da velha fórmula gasta têm, ainda assim, com que rejubilar. Para tal, basta apontar para o terço final do disco, onde encontram um "How To Be A Werewolf" impregnado de crescendos virulentos, ou  "You're Lionel Richie", apoteose épica capaz de fazer corar o senhor de carapinha referido no título. A renovação criativa, essa deriva em certa medida num maior apuro melódico, mas sobretudo e essencialmente do uso mais frequente dos teclados, ora em despique com as guitarras, ora em delicadas incursões pianísticas, mas mormente propiciadores de texturas densas que remetem para o kraut. Desta última faceta é exemplo flagrante o single de avanço, vocalizado e co-escrito pelo ex-Bows Luke Sutherland e herdeiro directo das malhas hipnóticas dos Neu! que ainda há pouco tempo também podíamos detectar na extintas Electrelane. Isto anda tudo ligado, é o que é!

"Mexican Grand Prix" [Rock Action, 2011]

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

(hol)Y (f)UCK!*
















Se estivéssemos no ano das trevas de 1998, apostávamos, sem grande margem de risco, que Yuck era nome de uma daquelas bandas aparvalhadas que a MTV nos tentava impingir como supostamente "cómicas". Mas estamos em 2011, e o estonteante "Rubber" já por cá passou para desfazer quaisquer equívocos. Esse mesmo tema, lá está, a encerrar o alinhamento nos seus sete e tal minutos de torpor drony mas, no entanto, não é de todo representativo da matéria de que se faz Yuck, o disco. Esse parece desterrado da temporada 1991/92, ainda o Emil Kostadinov espalhava classe nos relvados e os Dinosaur Jr., os Sonic Youth, os Teenage Fanclub, os Superchunk, e os inevitáveis Nirvana faziam sonhar com um futuro radioso para a música pop - no sentido abrangente do termo - de guitarras. Não se cumpriu esse tal sonho, mas os Yuck aí estão para o manter vivo com as suas canções fuzzy, melodiosas, descomprometidas e impregnadas de espírito juvenil, especialmente indicadas para pôr moles de gente a saltar na vertical. Tal qual como toda a pop digna desse nome deveria ser. Nem mais. E o que é que trazem de novo? - perguntam vocês. Absolutamente nada. Porém, estas dúzia de canções é de tal forma bem urdida a partir das fontes reconhecíveis, de tal modo fresca e honesta, que me leva a confidenciar-vos que Yuck me tem entusiasmado como nenhum outro disco antes dele lançado na já longa vida deste pasquim. Ora vejam lá porquê:

"Holing Out" [Fat Possum, 2011]

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* Trocadilho com direitos reservados.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Mixtape: Especial Mouco / April Skies - Dreams Burn Down

Foto: Timothy Berg

Compilação conjunta Mouco / April Skies. O motivo: a proximidade dos aniversários dos gerentes de ambos os blogues. Uma prenda de nós para vós, portanto. O tema: shoegaze. Sim, shoegaze. Distorção e paisagens idílicas. Olhares perdidos nos pedais de efeitos e espíritos a pairar sobre o firmamento. No código genético, Mary Chain e Cocteau Twins. Mas também Spacemen 3 e My Bloody Valentine. Conhecido na época áurea, na alvorada de noventas e essencialmente no Reino Unido, como "a cena que se celebra a si própria", o shoegaze ofuscou-se com o advento da brit-pop. Durante largo período, remeteu-se aos subterrâneos. Até que, na segunda metade da década dos zeros, eclodiu de novo, sobretudo nos states onde se tornou "género" maior junto da comunidade independente. A presente compilação pretende ser abrangente, pois tanto integra as bandas que se destacaram na vaga original, como um bom punhado de nu-gazers. As escolhas são equitativamente repartidas por ambos os gerentes - a vermelho as do Mouco, a azul as do April Skies.
Play it loud, please!


01. DROP NINETEENS _ "Delaware"
02. CATHERINE WHEEL _ "I Want To Touch You"
03. PALE SAINTS _ "Throwing Back The Apple"
04. MY BLOODY VALENTINE _ "Soft As Snow (But Warm Inside)"
05. THE SWIRLIES _ "Bell"
06. AIRIEL _ "Firefly"
07. SLOWDIVE _ "Alison"
08. ADORABLE _ "Sunshine Smile"
09. CHAPTERHOUSE _ "Breather"
10. THE BOO RADLEYS _ "Smile Fades Fast"
11. A SHORELINE DREAM _ "Hypermode"
12. RIDE _ "Dreams Burn Down"
13. BLEACH _ "Seeing"
14. THE PAINS OF BEING PURE AT HEART _ "Say No To Love"
15. ASOBI SEKSU _"Thursday"
16. BLONDE REDHEAD _ "Spring And By Summer Fall"
17. LILYS _ "There's No Such Thing As Black Orchids"
18. THE TELESCOPES _ "Flying"
19. THE DEPRECIATION GUILD _ "Sky Ghosts"
20. SWERVEDRIVER _ "Never Lose That Feeling"


terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

First Exposure #27















RADIATION CITY

Formação: Cameron Spies (voz, gtr); Lizzy Ellison (voz, tcls); Randy Bemrose (btr)
Origem: Portland, Oregon [US]
Género(s): Pop, Indie-Pop, Dream-Pop
Influências / Referências: Beach House, Twin Sister, Warpaint, Broadcast

http://www.myspace.com/radiationcity

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Em escuta #56










MINKS _ By The Hedge [Captured Tracks, 2011]

Ao primeiro contacto, a estreia dos Minks soa algo desconcertante, uma verdadeira manta de retalhos: os Cure da fase mais luminosa em regime lo-fi com os devidos floreados de guitarras, a pulsação de um baixo que poderia ser o de Peter Hook, heranças indie dinamitadas pela C86... Posterior e gradualmente, à medida que penetramos nas canções imaculadas da dupla nova-iorquina, tudo passa a fazer bastante sentido, com o todo a superar a soma das partes. By The Hedge revela-se nessa fase um compêndio pop, melancólico sem ser miserabilista, romântico sem ser lamechas, sonhador sem ser ingénuo. Às melodias cativantes, as vocalizações boy/girl adicionam um leve travo picante. [8]


NO JOY _ Ghost Blonde [Mexican Summer, 2010]

Banda feminina com origens no Canadá, mas com tentáculos espalhados pelos quatro cantos da América do Norte, estes No Joy são objecto de difícil catalogação. Por um lado, alinham por um noise a pisar o vermelho. Por outro, as vozes, quase imperceptíveis na muralha de guitarras em distorção, exalam uma doçura pop inapelável. Rótulos como shoegaze talvez sejam redutores, pois na sua imponente impenetrabilidade,  Ghost Blonde arrasta-nos para um estado de hipnotismo mais em consonância com as linguagens psicadélicas já com décadas de história. [7,5]


YOUNG PRISMS _ Friends For Now [Kanine, 2011]

Parentes estéticos dos aclamados Weekend, com os quais já partilharam um split EP, os franciscanos Young Prisms endereçam um convite de entrada num mundo opressivo onde o ruído é lei. Na primeira metade, Friends For Now impressiona pela intensidade sombria que consegue extrair de um par de guitarras em desalinho e crescendo cacofónico e de uma voz desencantada que parece debitar cânticos indecifráveis de um estranho ritual negro. Mais à frente, deriva para abstraccionismos que denunciam escutas insistentes de Loveless. Porém, ao invés de proporcionar o transe lisérgico dos My Bloody Valentine, a parte final do disco é um penoso calvário de ruído ao desbarato. [6]


SMITH WESTERNS _ Dye It Blonde [Fat Possum, 2011]

Banda de tenra idade, os Smith Westerns - de Chicago - ainda há menos de dois anos se afirmavam como derivado garage deslavado sem rumo bem definido. Este segundo disco é um passo gigantesco, com reforço das tonalidades setentistas, com especial acentuação no glam e no soft-rock. Do primeiro extraem a exuberância dos coros, do último o imediatismo das melodias. Porém, aquilo que noutras mãos podia servir de matéria-prima ao mais refinado dos azeites, manipulado pelos SW é fonte para canções prenhes de urgência juvenil, harmoniosas, exultantes, refrescantes e intensamente luminosas. Ou, por outras palavras, com materiais "fora de moda", Dye It Blonde revela-se o mais exuberante disco estival do Inverno de 2011. [8]


JONNY _ Jonny [Alsatian, 2011]

Como é sabido, Jonny é o projecto que junta Euros Childs e Norman Blake, e nasceu por iniciativa do primeiro que compôs também a maioria dos temas. Como tal, é natural que a obra primogénita desta união contenha alguns dos devaneios brit-folk que fizeram a fama dos Gorky's Zigotic Mynci, dos quais o bizarro e "rapsódico" "Cave Dance" é o exemplo mais flagrante. Mas sosseguem os devotos dos Teenage Fanclub, pois o pendor harmonioso destes até prevalece no conjunto de canções. Essencialmente acústico e em ambiente descontraído, Jonny carrega consigo um indisfarçável travo a antigo, tal qual os Beatles mais simples dos primórdios, ainda a homenagear os pioneiros rock'n'roll. Reina a boa disposição, pese embora um ou outro tema com carga melancólica mais prenunciada. No fundo, mais não é do que um disquinho delicioso, com dois artesãos pop, já com vasto currículo, a brincar às canções sem qualquer pretensão de seriedade. Mas, afinal, não é assim que toda a pop deveria ser? [7,5]

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Good cover versions #49











TH' FAITH HEALERS _ "S.O.S." [Clawfist, 1994]
[Original: ABBA (1975)]

Surgidos na ebulição londrina de inícios de noventas, os Th' Faith Healers foram colados à chamada Camden Lurch Scene, um "movimento" artificial criado pela imprensa no qual as bandas associadas pouco mais tinham em comum do que a origem geográfica. Neste caso, tratava-se de uma banda a operar nos meandros do noise-rock, fortemente influenciada pelo kraut e com alto teor de experimentação. Facto histórico talvez mais relevante é que tenham pertencido à primeira fornada de bandas da Too Pure Records, editora nesta fase muito acarinhada e apoiada por John Peel. Por conseguinte, foram várias as participações dos Th' Faith Healers nas célebres BBC Sessions a convite do não menos célebre radialista. No capítulo das habituais versões mais ou menos improváveis, a banda londrina atirou-se com unhas e dentes a "S.O.S.", um dos hits maiores dessa máquina de os fazer chamada ABBA. Sim, esses mesmos que a cada dois natais nos atemorizam com mais uma compilação para burguês saudosista. Os tais que inauguraram o jeito dos suecos para produzir enlatados inócuos para o consumo em massa. Aqueles que se iam moldando ao sabor da corrente dos setentas: ora eram um derivado glam, ora eram disco refundido, o tempo todo eram chungaria da pior espécie. No caso de "S.O.S." estamos perante uma aproximação aos excessos da fase decadente (e vendável) do primeiro género, com uma irritante pianada em código Morse a servir de marca distintiva. Nas mãos dos Th' Faith Healers, talvez até seja o tema mais acessível por eles registado, com a vocalista Roxanne Stephen a cantar verdadeiramente, ao invés de enveredar pelos habituais monólogos semi-declamdos. Contudo, evita os tiques canoros das moçoilas do original. Da martelada ao piano e dos sintetizadores primitivos, nem vestígios. Há, isso sim, gitarradas trepidantes em doses cavalares.

Alegria partilhada
















Foto: Loren Wohl

Há uma máxima que diz que não há duas sem três. Por outro lado, a lógica diz-nos que depois da loira e da ruiva, deveríamos falar da morena. Subvertendo a lógica, apetece-me voltar às outras duas. E, desta vez, em conjunto. É que no meio de tanta azáfama "privada" as meninas Cassie Ramone e Kickball Katy arranjaram tempo para gravar novo álbum das Vivian Girls, na circunstância o terceiro. Chega em Abril próximo, chama-se Share The Joy e é o primeiro do trio feminino com selo da Polyvinyl, após o fim da ligação à In the Red. Na bateria também houve (mais uma) mudança, com Ali Koehler, que agora integra os Best Coast, a ceder o seu lugar à menos robusta Fiona Campbell.
Algumas notas prévias sobre Share The Joy dão conta de um polimento da fórmula que congrega girl-pop, garage e surf-rock. Fala-se também num refinamento ao nível da estrutura das canções, que eram normalmente curtas mas que agora podem atingir a marca dos seis minutos. Há, inclusive, um tema-aperitivo que parece cumprir algumas das previsões e nos faz salivar pela chegada do álbum. "I Heard You Say" é um regresso à intensidade pop do disco debute, menos acentuado no fuzz, mas com harmonias vocais igualmente cativantes. O vídeo que lhe serve de suporte leva-nos a adivinhar que a nova editora trabalha com budgets generosos. Porém, o dinheiro disponível parece não ter sido o suficiente para comprar bom-gosto no que a padrões de tecidos diz respeito.


"I Heard You Say" [Polyvinyl, 2011]

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Discos pe(r)didos #49








THE AMPS
Pacer
[4AD, 1995]




Ansiosa por dar continuidade ao inusitado bom acolhimento a Last Splash (1993), Kim Deal viu-se a braços com as constantes entradas da irmã Kelley em clínicas de desintoxicação. Gravar novo disco com a chancela The Breeders sem a mana estava fora de questão, pois ambas eram forças criativas do projecto. Para dar vazão à sede rock, a ideia inicial era gravar um disco totalmente em solitário, sob a denominação The Amps, sugerida pelo amigo e conterrâneo de Dayton, Ohio, Robert Pollard (Guided by Voices). Uma mudança brusca de planos levou-a a resgatar o baterista Jim MacPherson à sua "banda a tempo inteiro", e a recrutar uma parelha de músicos locais, compondo assim (mais) uma banda de corpo inteiro.

No breve período de vida, o projecto deixou apenas registado um único álbum. Ouvido transversalmente, Pacer pode facilmente soar como o hipotético sucessor de Last Splash, quanto mais não seja pela economia de tempo: 12 canções em apenas 33 minutos! Além disso, os laços com o passado recente estendem-se a algumas das canções, em todo o caso registadas com maior rispidez. São os casos do tema-título, logo a abrir, do torpor adocicado da derradeira "Dedicated", ou da intermédia "Bragging Party", todas elas alinhadas naquela pop esquizóide, com adornos surfy, a que a voz, meio ameninada, meio gata-com-cio, de Kim Deal nos tinha habituado. Contudo, uma audição mais atenta, com maior atenção aos detalhes, revela o quanto as primeiras impressões podem ser enganadoras. Efectivamente, Pacer é um disco de uma crueza à qual miss Deal não nos tinha ainda habituado, nem sequer nos (poucos) temas do tempo dos Pixies. Por norma, a secção rítmica dá o mote, moldando o rumo de cada tema. Os riffs de guitarra, normalmente incisos e espasmódicos, e a voz, muitas vezes irada e berrada, provisionam a sujidade que varre a maior parte das faixas. São os exemplos do neurótico "Full On Idle", do cacofónico "Breaking The Split Screen Barrier", do trepidante "Tipp City", ou do tresloucado "Empty Glasses". Ou ainda, para melhor aferição, "I Am Decided", escrito a meias com o amigo Pollard e estranhamente reminiscente da alegre demência de um tal Black Francis de outras eras.

Gerado numa quase absoluta liberdade criativa, sem os propalados conflitos de egos a que Kim Deal estava habituada, Pacer resulta urgente e com uma fé insuspeita no ofício rock. Olhado pelos seguidores com alguma indiferença à data da sua edição, merece a esta distância temporal ser apreciado como um pequeno tesouro subavaliado. Até à data, talvez o último merecedor desse epíteto com a participação activa da sua principal ideóloga.

"Pacer"

"Tipp City"

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Selo de Qualidade #1


Nova rubrica, há muito pensada mas só agora concretizada. Com esta iniciativa pretende-se prestar tributo às editoras que desbravaram caminho, sendo habitualmente garante de qualidade para os seu público alvo. Isto no tempo em que "independência" era algo mais do que uma palavra para se usar a despropósito.











HOMESTEAD RECORDS
Long Island, Nova Iorque [US], 1983-1996

Fundada por Barry Tenenbaum ainda em pleno período de vigência pós-punk e pós-hardcore, a Homestead Records foi, inicialmente e naturalmente, poiso de alguns exemplares do rock mais abrasivo que à época se produzia nos Estados Unidos. O propósito do fundador era mesmo o de garantir alguma visibilidade a pequenas bandas, com algumas dificuldades de distribuição, bem como o licenciamento de artistas europeus em solo norte-americano. Nesta demanda contou, com a colaboração do manager Sam Berger, já com experiência ao leme da distribuidora Dutch East India Trading e com contactos no meio com vista às primeiras contratações. Entre esses neófitos contavam-se os Big Black, banda seminal nos espectro noise-rock que serviu de cartão de visita ao incontornável Steve Albini. Berger abandonaria o barco pouco depois, não sem antes sugerir a sua substituição por Gerard Cosloy, um puto de 18 anos que viria a desempenhar um papel fundamental na afirmação da Homestead como a casa por excelência do indie-rock nos E.U.A..

Ao fim de pouco tempo em funções, Cosloy, que mais tarde integraria a equipa da Matador Records com os resultados que se conhecem, assegurou o concurso dos Swans e dos Sonic Youth, bandas locais que viriam a ser determinantes nos caminhos seguidos no rock do último quarto de século. Em simultâneo, assegurou a distribuição na costa leste de bandas do outro extremo dos states, como os ainda imberbes Screaming Trees, Beat Happening ou Giant Sand. Nick Cave & The Bad Seeds, Einstürzende Neubauten, e algumas das bandas ligadas à neozelandesa Flying Nun teriam as primeiras edições americanas pela mão de Cosloy.

Porém, o auge da Homestead estava ainda iminente. Primeiro, com as contratações de Dinosaur Jr., Squirrel Bait (banda que esteve na origem dos Slint), e Volcano Suns (originários dos Mission of Burma), depois com Big Dipper, Live Skull (de Thalia Zadek), e My Dad is Dead. Embora hoje mergulhado numa certa obscuridade, este último lote foi, à época, determinante na afirmação do estatuto da editora. Daqui em diante, seria o declínio, muito por culpa da gestão danosa do controverso Tenenbaum, acusado de mau pagador por muitos dos artistas com quem se cruzou. 

Por motivos de gerência, a Homestead não soube aproveitar as oportunidades criadas pelo fenómeno Nevermind, pelo qual foi, de certa forma percursor. Para além do reconhecimento dos Sebadoh, última banda relevante no catálogo foram os Seam, caso de culto restrito mas consolidado em inícios da década de 1990. A falência em definitivo ocorreria em 1996. Porém, consta que os credores nunca conseguiram deitar mão à imensidão de discos ainda em armazém. Consta também que, ainda recentemente, esses mesmos discos estariam a ser comercializados por um vendedor misterioso na internet. As suspeitas apontam, obviamente, para que esse personagem seja o próprio Barry Tenenbaum, o trapaceiro que enganou meio mundo mas permitiu ao outro meio usufruir de  alguma da música mais entusiasmante dos últimos 25 anos.


10 DISCOS ESSENCIAIS

  • BIG BLACK _ Racer X EP (1984)
  • SONIC YOUTH _ Bad Moon Rising (1985)
  • VOLCANO SUNS _ The Bright Orange Years (1985)
  • DINOSAUR JR. _ Dinosaur (1985)
  • BIG BLACK _ Atomizer (1986)
  • SQUIRREL BAIT _ Skag Heaven (1987)
  • BIG DIPPER _ Heavens (1987)
  • LIVE SKULL _ Dusted (1987)
  • SEABADOH _ Gimme Indie Rock EP (1991)
  • SEAM _ Headsparks (1992)

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Hit me baby, one more time...


















Ainda não há muito tempo, falava-vos das movimentações extra-curriculares da ruiva. Hoje dou-vos conta das actividades fora do seio das Vivian Girls da loira Cassie Ramone, guitarrista e principal frontwoman do trio feminino de Brooklyn. Não apenas dela, mas também de Kevin Morby, baixista dos Woods. Juntos, e com a ajuda do baterista Justin Sullivan (de uns tais Bossy), respondem pelo nome The Babies. Com um par de singles que serviram para afinar agulhas no ano transacto, a dupla acaba de dar à estampa um álbum homónimo. Sem especial prevalência da girlish-fuzz-pop de Cassie, ou do psych-folk bucólico de Kevin, The Babies vive antes uma situação de compromisso, uma espécie de meio termo entre as sensibilidades dos progenitores, a fazer lembrar outras parelhas célebres nesta coisa da pop. Aqui e ali são também detectáveis alguns arremedos punky. Intocável é a aptência para urdir canções curtas e directas, sem especial preocupação em floreados de produção. Qualquer semelhança entre a amostra infra e a "pérola" homónima será, obviamente, mera coincidência.


"Breakin' The Law" [Shrimper, 2011]

Arrefecimento global














Vivemos um tempo em que tempo de vida, ou pelo menos o período de credibilidade, das novas bandas é consideravelmente diminuto. Neste contexto, vão remando contra a maré algumas velhas raposas, avessas a modas e tendências. É o caso dos holandeses The Ex, com mais de três décadas de um inconformismo rock que a falta de visibilidade não faz esmorecer. Neste lapso de tempo já editaram um total de 25 álbuns de originais, sem contar com inúmeros registos em parceria com outrém, e o forte impulso dado à série In The Fishtank, laboratório de interessantes colaborações nas franjas da música popular. O último trabalho é Catch My Shoe, desde há quase meio ano disponível na Holanda e recentemente objecto de distribuição global. Continuação de uma longa relação de cumplicidade com Steve Albini, que o registou nos seus estúdios de Chicago, o novo disco é o primeiro do colectivo de Amesterdão com o novo vocalista Arnold de Boer. A outra grande novidade provém dos subtis apontamentos de afro-pop impregnados na vertigem da matriz pós-punk de guitarras com arestas afiadas. Vale a pena espreitar o resultado da colisão destas duas diferentes linguagens:


"Cold Weather Is Back" [Ex/Carrot Top, 2010/2011]

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Duetos #29












A nata indie do noroeste das Américas - Calvin Johnson (Beat Happening) e Doug Martsch (Built to Spill). Profundo o primeiro, melodramático o último. Sui generis, no mínimo.


The Halo Benders _ "Love Travels Faster" [K, 1998]

Singles Bar #59








A.R. KANE
When You're Sad
[One Little Indian, 1987]




Já por cá apareceram, por mais do cada uma vez, a dar provas de um carácter multifacetado. Hoje, contudo, não nos vamos deter nas experiências de estúdio e no cariz aventureiro dos A.R. Kane do pico criativo, mas sim na "infância" desta banda singular, ainda à procura de um rumo, mas já com algumas ideias assentes. Aquele que foi o primeiro single da dupla londrina merece destaque não tanto pela versão longa que preenche o lado A, manchada pelo tique do "esticão" das partes instrumentais tão tipicamente eighties, mas sim pela "versão escorreita" que abre o segundo lado da rodela. Nos seus pouco mais de três minutos de duração, "When You're Sad" é um frenesim de distorção que leva a crer que as lições dos Mary Chain tinham alunos aplicados. A falta de meios não parece ser entrave, pois uma caixa de ritmos pode facilmente suprir a carência em termos humanos. O clima é de melancolia agridoce, tal qual era mote para toda uma geração pós-C86. Sob o muro de ruído, há um irresistível apuro pop. Arrisca-se presumir que os putos Ride estivessem por esta altura a tirar as notas necessárias às fundações shoegazing.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Novas dores, velhos sons?















Foto: Pavla Kopecna

Quando se revelaram com mais intensidade, há coisa de dois anos, houve quem não hesitasse em catalogá-los como nu-gazers. Puro erro, em meu entender, pois a estreia homónima, apesar das tais guitarras distorcidas, vinha recheada de referências a muitas das bandas associadas à C86, alguns anos, não muitos, anterior à "cena que se celebrava a si própria". O próprio nome The Pains of Being Pure at Heart é do mais twee que há. Tão twee que poderia ter sido o nome de uma canção dos Talulah Gosh ou dos Another Sunny Day.
Entre discussões de catalogação, o que é certo é que os Pains conquistaram um estatuto de nível apenas sonhado pelos seus "heróis". O par de singles do ano passado, denotava já uma inflexão em favor de uma pop mais límpida, eventualmente a piscar o olho a públicos mais vastos. O último deles, Heart In Your Heartbreak, era já resultado do trabalho com o produtor Flood e com o misturador Alan Moulder, dupla responsável por muito disco platinada e também pelo segundo da banda nova-iorquina - Belong, com edição escalonada para finais de Março próximo. Se o citado single ainda vinha impregnado da marca Pains, o tema-título do álbum coloca a hipótese de uma "perda da inocência", rumo a sonoridades mais grandiosas e ambiciosas, mas não necessariamente mais estimulantes. Na prática, "Belong" representa um avanço cronológico nas fontes, mais precisamente até inícios de noventas. A voz de Kip Berman retém alguma da pureza primordial, mas aqueles riffs monstruosos trazem à memória o início do percurso rumo ao estrelato dos Smashing Pumpkins (Flood e Moulder, lá está!). O que o resto do disco nos reserva é ainda uma incógnita, mas esta amostra ainda em digestão, à falta de melhor adjectivo, soa-me algo descaracterizada.


"Belong" [Slumberland, 2011]

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Mixtape #8 - Tell Me When It's Over


Inícios a meados de oitentas. Los Angeles, Califórnia. Paisley Underground, talvez o "movimento" mais maltratado em seis décadas de rock'n'roll. O nome pouco ou nada quer dizer, pois deriva apenas de um episódio anedótico com o estampado de uma camisa. Já a música, essa derivava essencialmente do psicadelismo e de algum country-rock de finais dos sixties, recuperados à luz da recente "revolução" punk. The Velvet Underground e The Byrds eram referências de quase toda esta gente. Contudo, o Paisley Underground revelou também bandas a operar numa frequência próxima do power-pop. Eram os casos dos fabulosos Game Theory, dos geniais The Three O'Clock, ou do quarteto feminino The Bangs. Estas últimas, rebaptizadas The Bangles acabariam por constituir o único exemplo de franco sucesso ligado à "cena". 
A compilação que hoje vos proponho pretende traçar um retrato abrangente, feito de escolhas muito pessoais, dessa coisa meio indefinida que foi o Paisley Underground. Não se fica pelas fronteiras da cidade dos anjos, e parte para outras paragens, tanto dentro da Califórnia, como para a Georgia dos Guadalcanal Diary, ou o Arizona dos Green on Red, pontos dos states onde, à época, se rockava sob as mesmas premissas. As mesmas que haveriam de abrir caminho para bandas louvadas na década seguinte, tais como Grant Lee Buffalo ou Mazzy Star. David Roback, metade do núcleo duro destes últimos, aparece inclusive a jogar com tripla: integrado nos incontornáveis The Rain Parade, como uma das metades dos subsequentes Opal, e como mentor do "super-grupo" Rainy Day. Façam o favor de dispor!


01. GAME THEORY _ "Kenneth, What's The Frequency?" (1987)
02. THE DREAM SYNDICATE_ "Tell Me When It's Over" (1982)
03. THE SALVATION ARMY _ "Mind Gardens" (1981)
04. OPAL _ "Supernova" (1987)
05. TRUE WEST _ "Look Around" (1984)
06. PLASTICLAND _ "Mink Dress" (1980)
07. GREEN ON RED _ "Gas Food Lodging" (1985)
08. THE BANGS _ "Getting Out Of Hand" (1981)
09. THE THREE O'CLOCK _ "Jet Fighter" (1983)
10. GAME THEORY _ "The Waist And The Knees" (1987)
11. THIN WHITE ROPE _ "Disney Girl" (1985)
12. THE LONG RYDERS _ "Ivory Tower" (1984)
13. GUADALCANAL DIARY _ "Why Do The Heathen Rage?" (1984)
14. THE RAIN PARADE _ "Kaleidoscope" (1983)
15. THE PANDORAS _ "It's About Time" (1984)
16. RAINY DAY _ "I'll Be Your Mirror" (1984)