"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

10 anos é muito tempo #26







LIFE WITHOUT BUILDINGS
Any Other City
[Tugboat, 2001]




Nem toda a música produzida na Escócia se caracteriza pelas canções pueris e as guitarrinhas melodiosas. Entre aqueles que contrariam essa tendência, ocupam lugar de destaque os Life Without Buildings, colectivo de vida breve formado por quatro jovens estudantes da Glasgow School of Arts que foi buscar o nome a um tema dos Japan mas que não poderia estar mais afastado dos maneirismos da pop sofisticada da banda que revelou David Sylvian. Para a posteridade deixaram um único registo de longa-duração, disco esse ao qual se aplicam as célebres palavras de Pessoa acerca do mais popular refrigerante gaseificado - primeiro estranha-se, depois entranha-se.

Efectivamente, Any Other City é um daqueles pequenos tesouros que, pela sua imprevisibilidade e aparente estranheza, apenas partilhamos com ouvidos treinados e receptivos à novidade. Tal qual o foram os Sugarcubes no seu tempo, os LWB foram mais um atestado de que uma certa naivité só pode ser benéfica para a capacidade de surpreender e inovar. Any Other City vive de uma dinâmica conflituosa entre dois elementos aparentemente inconciliáveis: música e voz. A primeira, mais alinhada nas tendências indie, caracteriza-se pela economia de recursos. As guitarras, esquálidas e tensas, derivam da escola Velvets / Feelies. Porém, não enjeitam uma oportunidade de melodia, como é o caso de "Young Offenders", com um ritmo quebrado, quase-reggae, que faz duvidar da autoria de um certo tema dos Bloc Party popularizado por um anúncio publicitário de operadora de telecomunicações. Já a voz de Sue Tompkins é o maior trunfo e o traço mais distintivo da peculiar sonoridade dos LWB. Semi-declamado, remete de imediato para nomes do post-punk como Lizzy Mercier Descloux ou os Delta 5. Quando envereda pelo tom acusatório vem-nos à memória Poly Styrene, dos X-Ray Spex, enquanto o uso abundante da repetição é marca registada do senhor Mark E. Smith.

Discorrendo abundantemente sobre as tropelias das relações inter-géneros, de um ponto de vista obrigatoriamente feminino, Sue Tompkins soa por vezes como uma criança precocemente desencantada e desiludida, tal o azedume das palavras. A gama de recursos permite-lhe ir do irado ("Juno", "Envoys") ao vertiginoso ("Philip"), do groovy ("PS Exclusive") ao piedoso ("Sorrow"). Neste último tema, reminiscente da versão de "Sweet Jane" pelos Cowboy Junkies, mas desprovida da candura daquele, condensa-se toda a amargura do mundo nos quase sete minutos de duração. A vocalista, no seu momento mais confessional, ora gagueja, ora parece estar prestes a desvanecer-se, deixando no ar um misto de desconforto e complacência.


"PS Exclusive"


"Young Offenders"


"Sorrow"

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