"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

You are not alone!














É prática comum nos meandros da electrónica o anonimato, e até um certo culto do mistério. No que aos anos recentes diz respeito, poucos criadores terão suscitado maior curiosidade quanto à sua identidade quanto o artista que escolheu o nom de guerre Burial. O motivo primeiro foi um estrondoso álbum homónimo lançado em 2006, que propunha texturas densas e sugestões de isolamento em cenário pós-dubstep. O culto em seu redor aumentou com o ainda superior Untrue (2007), um disco de uma relativa maior humanidade, mais ainda assim de um distanciamento condizente com a postura adoptada pelo seu criador. Ambos estes trabalhos levaram a especulações quanto à verdadeira identidade da figura que lhes estava por detrás, trazendo à baila vários nomes "consagrados", até ser revelado o enigma: Burial era o ilustre desconhecido William Bevan, músico de tenra idade a usufruir em pleno das recentes possibilidades e facilidades da gravação e divulgação caseiras. De então para cá não houve notícia de qualquer novo álbum, mas os EPs têm-se sucedido a bom ritmo, revelando significativas evoluções na sonoridade, mas mantendo o elevado nível qualitativo.

Neste final de 2013, Burial brinda-nos com Rival Dealer, seguramente o seu trabalho mais luminoso e, consequentemente, o mais afastado do sufoco dos primeiros registos. Em comum com Untrue tem o abuso das samplagens de vozes femininas, mas os pontos de contacto ficam-se por aí. Sobre Rival Dealer diria até ser um trabalho arejado, no qual o autor sai do casulo para o mundo exterior sem receios de coexistir com a restante humanidade. A título de exemplo oiça-se o tema-título, um dos dois cuja duração ultrapassa os dez minutos, que é uma verdadeira celebração dançante. Nas palavras do autor, é uma homenagem aos ravers de outros tempos, que a idade de Burial não permitiu conhecer de perto, mas cuja música deixou profundas marcas na sua obra. Substancialmente mais curto, "Hider" segue-se para refrear o frenesim. Por último, e novamente para além da barreira dos dez minutos, "Come Down To Us" constitui a surpresa maior, ao revelar até uma faceta calorosa que desconhecíamos em Burial. Alegadamente, este tema, em ritmo lento e com diversas paragens e recomeços, é solidário com os jovens vítimas da discriminação e do bullying, aos quais uma voz feminina se dirige várias vezes com um encorajador "You are not alone". Simbolicamente, este superlativo tema cuja viciação faz parecer curto, assinala também a aproximação de Burial aos comuns mortais, pondo fim ao isolamento auto-imposto, e acrescentado mais um maravilhoso capítulo a uma discografia ímpar, que ameaça ainda surpreender até os mais prevenidos.

Come Down to Us by Burial on Grooveshark
[Hyperdub, 2013]

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