PERE UBU
30 Seconds Over Tokyo
[Hearthen, 1975]
Reza a lenda, e assim o conta o líder de sempre David Thomas, que a inspiração dos primórdios dos Pere Ubu partia das experiências vividas nas viagens nocturnas entre a Cleveland de origem e a gigantesca Detroit. Nessas idas e vindas, consta, ocorriam normalmente avistamentos de fenómenos estranhos, de UFOs ou apenas de ocorrências não explicáveis pela lógica, consoante as crenças de cada um. Com esta matéria de trabalho, obviamente, a música daí resultante reflectiria uma boa dose de estranheza, combinada com uma subversão dos conceitos pré-estabelecidos que, quase quatro décadas volvidas, a facção arty do rock norte-americano ainda não conseguiu assimilar totalmente toda a irreverência de uma das suas bandas mais inovadoras.
Tudo começou com 30 Seconds Over Tokyo, um single invulgar, tão esquivo aos estereótipos vigentes em meados de setentas que teve de ser lançado em regime de auto-edição. Para além de Thomas, os Pere Ubu desta autêntica pedrada no charco incluíam outros agitadores que futuramente viriam a tornar-se figuras de referência junto das tendências leftfield da música popular, tais como Allen Ravenstine (sintetizador) e Tim Wright (baixo). Ainda hoje, os primeiros segundos de uma das muitas audição do tema principal causam o mesmo impacto de algo pioneiro. A receita não consiste em mais que a combinação de diferentes ingredientes, confeccionados por estudiosos da coisa rock. Assim, partindo de uma base garage-rock, arrastado para um torpor zombie, junta-se um riff circular com algo de sabbathiano e um ritmo que vai beber ao reggae, interrompendo a toada repetitiva em mais do que um intervalo de delírio dissonante. A atmosfera sinistra é corroborada pela lenga-lenga proferida por David Thomas, relato de efeito surrealista, com distorção da voz incluída, de bombardeamentos aéreos. Ligeiramente mais convencional, mas apenas para os parâmetros pereubianos, o tema do lado B - "Heart Of Darkness" - faz-se também do recurso à repetição, mas em igual medida de tensão kraut e do negrume que o título sugere, servindo de matriz para inúmeras manifestações arty que tiveram lugar durante o período pós-punk.
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