CODEINE
Frigid Stars
[Sub Pop, 1990]
Aos seminais American Music Club e aos magistrais Galaxie 500 poderá ser atribuído o pioneirismo da coisa. Por outro lado, aos Low reconhece-se a longevidade e o consequente reconhecimento mais alargado. Contudo, quando falamos do chamado slowcore, que de inícios de noventas até esta data continua a espalhar as suas sementes, nenhuma outra banda personificará tão bem este "movimento" difuso quanto os Codeine, um colectivo de Chicago que não precisou de mais do que um curto período de actividade, com dois álbuns e um EP/mini-álbum para gerar um enorme culto em seu redor. Se o volume de vendas ou a fama conquistada não abonam a seu favor, o burburinho criado em torno do seu recente regresso da formação original, para já apenas aos palcos, atesta bem do estatuto desta banda.
Pertencentes ao catálogo de uma Sub Pop no preciso momento em que a editora de Seattle estava na eminência de se dar a conhecer ao mundo pelas guitarras altas e furiosas, os Codeine jogavam noutro campeonato com alguma da música mais lenta e arrastada da produção pop/rock do último quarto de século. Ouvido hoje, com o distanciamento de vinte e tal anos, e com a absorção de milhentos discos anteriores e posteriores, aquele que foi o seu primeiro disco, afinal não estava assim tão distante da percepção de algumas bandas do começo do rastilho grunge, antes da coisa se tornar produto de mercearia. Também Frigid Stars é feito de guitarras densas, muitas vezes a atingir picos de volume consideráveis, e também os Codeine passaram o seu período formativo a escutar as bandas do chamado post-hardcore, tal como aconteceu com os Nirvana, com os Screaming Trees, ou com os Afghan Whigs. O recolhimento às caves mais profundas e soturnas distinguem-nos daqueles contemporâneos mais mediatizados. Por conseguinte, Frigid Stars não é propriamente um disco marcado pela tristeza, diria antes que, algo de mais perturbador, como a frieza da ausência de emoções que o percorrem faz da sua audição uma experiência dolorosa para os incautos. À dinâmica da alternância da calma com a tensão das guitarras contundentes, somam-se palavras escassas, mas ordenadas em tiradas tão concludentes como estas: "I want you to need me - not to feed me", "First chance is rare - seconds don't ever dare", ou "Don't remember your kiss, can't remember what I miss".
Para entrar na atmosfera do disco basta ouvir "D" e "Gravel Bed", o primeiro par de temas que alternam uma apatia letárgica com convulsões de guitarras revoltas. O tom empedernido, contudo, é sublimado em "Second Chance", talvez o tema mais paradigmático dos Codeine, um monolito impenetrável percorrido por drones gélidos e palavras exasperantes. Por outro lado, "New Year's", escrito pelo amigo Sooyoung Park mas só posteriormente gravado pela banda deste (os Seam), é o tema em que o manto nebuloso se mostra menos espesso. No entanto, não deixa de expressar a solidão da forma mais franca e, consequentemente, mais perturbante. Outra característica subjacente à música dos Codeine é o teor cinemático que as letras minimalistas muitas vezes contêm. Dá-se o caso em "Cigarette Machine", quase um pequeno filme noir que, nas palavras mais faladas que nunca por Stephen Immerwahr, traduz tantas imagens mentais quanto uma pintura de Edward Hopper ou um pequeno conto de Raymond Carver.
Com esta proposta, implicitamente afiliada com as linguagens e as dinâmicas rock, os Codeine distinguiam-se dos seus pares do espectro sad/slowcore, que em muitos casos demonstravam sensibilidades folk. Foi assim que, juntamente como os Slint pela mesma altura, lograram lançar as bases de muito do post-rock produzido na América do Norte nas últimas duas décadas, tanto na Chicago natal como noutras paragens. Tal impacto não estaria certamente nos planos do baterista Chris Brokaw que, logo após Frigid Stars, abandonou o grupo para se dedicar a tempo inteiro ao papel de guitarrista nos Come, banda similar mas algo mergulhada no espírito dos blues.
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