"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Here we are now, entertain us

Foto: Kirk Weddle

"It means we won." - Gina Arnold

As palavras acima transcritas foram proferidas a propósito da chegada de Nevermind ao primeiro lugar da tabela de vendas norte-americana. Um feito já de si surpreendente, ganha outros contornos de simbolismo por ter destronado aquele que seria, porventura, o maior ícone mainstream à data: Michael Jackson. 

E quem é o "nós" a que a jornalista que fez carreira na Spin e na Rolling Stone, entre outras, se refere? Esse "nós" representa todos aqueles que, durante a década de 1980, de forma apaixonada e desinteressada suportaram o underground ianque, imunes aos ditames do establishment. Era essa a América de, entre tantos outros, Hüsker Dü, Dinosaur Jr., Sonic Youth, ou Pixies. Sobre estes três ultimos, convém lembrar que em Setembro de 1991 ainda não gozavam de reconhecimento mediático comparável ao de hoje. De resto, a possibilidade de trazer esse mundo subterrâneo (do qual era uma súmula) à superfície foi um efeito imediato e benéfico do sucesso de Nevermind. Num cenário em que o underground passou a overground, lucraram também as bandas emergentes, como os Pavement ou PJ Harvey (o trio inicial, esclareça-se), que apareceram num contexto substancialmente mais favorável ao crescimento.

Mas eis que, com o rumo da história bem encaminhado, e apercebendo-se do potencial de algo que até aí tinham ignorado, os executivos da indústria decidem nomear os Nirvana arautos de algo que incluía alguns pares mais alinhados com os excessos do rock dinossáurico de setentas, justamente uma das aversões confessas de Kurt Cobain. Pior, pior, só mesmo quando, por volta de 1994, é um vê-se-te-avias a assinar sub-produtos, clonagens toscas, e poseurs avulsos. Estava encontrada uma nova fórmula Rock FM que perdura até aos dias de hoje.

E o que tinha Nevermind de tão especial? Bem, desde logo um lote de canções de excepção que revelam uma incrível sensibilidade pop em conflito com a dureza das guitarras, mesmo quando se libertam os arremedos punk do "ensaio" Bleach, dois anos antes. Na afirmação de Cobain como compositor bafejado pelo génio, é justo atribuir a quota parte de responsabilidade ao trabalho de "limpeza" e "brilho" impostos pelo produtor Butch Vig, nome já com vasto currículo no underground, mas a partir daqui requisitado para projectos mais visíveis. A esta distância, essa característica técnica será, eventualmente, a grande pecha de Nevermind, que nas escutas mais recentes me soa demasiado preso a um tempo específico. Ainda e apenas referindo-me à produção, julgo que a crueza deliberada do subsequente In Utero resiste melhor ao tempo, talvez porque preserve maior pureza musical.

Vinte anos volvidos desde a sua edição, precisamente assinalados no passado sábado, a questão que ainda interessa debater é se alguém previu, ou até premeditou, o "fenómeno" Nevermind. Ainda que beneficiando dos relativos sucessos recentes do "mundo alternativo" a cargo dos Faith No More ou dos Jane's Addiction, penso que não. Penso que a parca primeira tiragem da edição britânica, reduzida a 40.000 exemplares, dá algum suporte à minha opinião. Acho sim, e não sou original na análise, que o furacão Nirvana se ficou a dever à "canção certa no momento certo" para toda uma geração alienada do contexto sócio-cultural da época. Um vídeo adequadíssimo em alta rotação fez o resto, e o mundo da música popular nunca mais foi o mesmo...

"Smells Like Teen Spirit" [Geffen, 1991]

2 comentários:

Gravilha disse...

a meio dos 90's, num roda de amigos que falavam e ouviam muita musica, perguntamo-nos acerca do disco mais importante (pelo que foi no seu tempo e pelo que marcaria o futuro) da primeira metade da década: numa rápida, mas difícil, selecção mental fiquei dividido entre nevermind e Selected Ambient Works 85-92 do aphex twin. não sei se hoje seriam estas as minhas escolhas; aliás, elas não poderiam ser mais diferentes. hoje por hoje ouço com muito mais prazer o segundo, mas reconheço que nevermind marcou muito mais o seu tempo e a atitude, as letras, a musica dos nirvana, marcou concerteza muito mais pessoas - e especialmente pessoas mais novas do que eu.
abraço,

M.A. disse...

Tendo a concordar contigo, em relação aos dois, cada um à sua maneira. Embora menos reconhecido, o "Selected ambient works" deixou marcas profundas na música que se fez nos anos seguintes. Geralmente também se fala no "Endtroducing", do DJ Shadow. Acho que é um óptimo disco, mas fico com a impressão que é mais coisa de "académico", precisamente por não ter sido tão determinante a ditar tendências.
Um abraço.