THROWING MUSES
The Real Ramona
[4AD, 1991]
Banda emblemática na chamada "cena de Boston" (embora tenham origem noutras paragens), os Throwing Muses constituem um daqueles raros casos de sonoridades únicas, com as quais é difícil estabelecer comparações óbvias. Obviamente movidos pelo leque de ideias gerados pelo pós-punk, souberam criar uma linguagem própria, assente em estruturas pouco previsíveis e canções que, na sua aparente fragilidade, vivem num denso ensombramento. Como imagens de marca têm o timbre invulgar de Kristin Hersh, ela que com a meia-irmã Tanya Donelly fundou a banda ainda durante a adolescência de ambas, e os floreados delicados das guitarras. Foram também responsáveis pela "descoberta" dos Pixies, banda amiga que rapidamente os ultrapassou em termos de mediatismo.
Se numa primeira fase os discos dos Muses se pautam por alguma agrura impenetrável, nos primeiros meses de 1991, e longe de imaginar a revolução indie/"alternativa" que estava reservada para a parte final do ano, atingiram o seu ponto óptimo com um disco que faz a ponte com a via mais directa do futuro. O que equivale a dizer que, até àquela data, The Real Ramona era o mais acessível ao ouvinte médio dos quatro álbuns editados, sem que, contudo deixe de exorcisar os fantasmas de Hersh. De resto, essa vertente torturada está bem patente "Ellen West", tema que leva o nome de uma conhecida paciente de anorexia nervosa e que é dos mais tensos, tanto na voz como na música, de todo o álbum. Apesar desta e de uma ou outra concessão à negritude, a luminosidade é uma certeza desde o primeiro instante com "Counting Backwards", canção de uma leveza assumidamente pop e assente num ritmo quebrado comandado pela batida atípica de David Narcizo. No que respeita aos temas da autoria de Hersh (dez dos doze do alinhamento), a delicadeza é apenas superada por "Red Shoes", de um brilho cintilante capaz de comover o mais empedernido dos seres. Neste, a voz única da cantora eleva-se no seu registo entre o trémulo e grito abafado. Equiparável seria "Grafitti", não fosse a maior previsibilidade da estrutura. O contrário pode-se dizer de "Hook In Your Head", o tema mais longo de todo o disco e também o mais ambicioso, com mudanças de tempo constantes. Na metade final, as ribombar das pancadas secas de Narcizo ecoam de forma absolutamente demolidora, até quase desviarem por completo a atenção das descargas de distorção. No final do alinhamento, "Two Step" é uma semi-balada que justifica as alusões hawaiianas de título e capa e que não está longe de alguns temas dos comparsas Pixies.
Com o seu contributo composicional reduzido a um par de temas, Tanya Donelly chama a si o troféu pop com "Not Too Soon", gema irresistivelmente vaporosa que deixa bem demarcada a diferença de densidade que sempre a separou da escrita da meia-irmã. Menos imediata, "Honeychain" inicia-se em registo de canção-de-embalar até rebentar numa explosão de guitarras perfurantes para, logo em seguida, recuperar o ambiente diáfano.
Talvez insatisfeita com o papel secundário, Donelly abandonou a banda pouco depois da edição de The Real Ramona. Consigo levou o baixista Fred Abong que integrou na formação dos Belly, projecto de vida breve mas bem sucedido na exploração da veia pop que parecia aflorar nos Muses. Kristin Hersh seguiu o trajecto, sempre acompanhada do fiel baterista David Narcizo. Numa fase imediata registou um endurecer da sonoridade, em consonância com as tendências da altura. Talvez mercê da citada "revolução", foi nesse ponto que os Throwing Muses conheceram o maior sucesso comercial, inclusive junto do público americano que sempre os olhou com maior distanciamento que o britânico.
"Counting Backwards"
"Red Shoes"
"Not Too Soon"
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