"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

À flor da pele















Há três anos, Kristin Gundred era vocalista e baterista dos Grande Ole Party, um trio de San Diego que não durou ou produziu o suficiente para merecer merecer mais do que uma nota de rodapé nas "enciclopédias" pop. Se a importância da banda é diminuta (talvez a única particularidade seja a miúda que, além de baterista, também canta), o nome da moça também pouco vos dirá. Talvez o caso mude de figura se vos disser que essa é a mesma pessoa que agora é conhecida como Dee Dee Penny, mentora e frontwoman das excelsas Dum Dum Girls. No curto período de vida, o trio deixou editado apenas um álbum (Humanimals, de 2008), que deu azo a comparações com os Yeah Yeah Yeahs que iam muito para além da composição da banda.

Soube-se há pouco que, quando se extinguiram, pouco depois da estreia, os Grand Ole Party tinham pronto um segundo álbum. É esse disco que vê agora a luz do dia sob o titulo genérico Under Our Skin. E em boa hora, digo eu. Não que, no essencial, difira muito do rock musculado e dengoso, de inflexões bluesy, do antecessor, ao ponto de merecer uma reconsideração do estatuto dos progenitores. Porém, é justo reconhecer a Under Our Skin melhorias significativas, tanto ao nível da contenção expressiva, como (e sobretudo) na escrita de canções com cabeça, tronco e membros. Portanto, e acima de tudo, uma curiosidade que permite aferir do estádio de desenvolvimento intermédio daquela que se destaca dos seus pares, precisamente, pelo engenho na concepção de pequenas gemas sob a forma de canções pop. A mesma que, por exemplo, engendrou o novíssimo Only In Dreams, disponível para audição integral aqui.

15 x 2 = 30












Como tantas outras editoras independentes, a Polyvynil Records nasceu do entusiasmo de dois jovens amigos ainda em idade escolar, na circunstância Matt Lunsford e Darcie Knight. Embora os primeiros passos remontem a 1994, só dois anos mais tarde se estabeleceria em definitivo, precisamente no momento que a "cena" local de Champaign-Urbana, uma pequena metrópole mesmo ali ao lado da fervilhante Chicago, o justificou. Selectiva nas suas contratações, a Polyvynil foi-se desenvolvendo, com passos curtos mas firmes. Há meia dúzia de anos, já com distribuição à escala nacional, teve aquilo a que se pode chamar um primeiro sucesso, na pessoa dos efusivos of Montreal. Daí à abertura de uma filial na Califórnia, mais perto dos centros de decisão do showbiz, foi apenas um passo.

Hoje uma editora consolidada, mas daquelas que ainda não perderam o espírito de independência, a Polyvynil está a comemorar o seu 15.º aniversário. Com esta bonita idade, tem já no cardápio bandas provenientes dos diferentes pontos do país natal, mas também da Austrália, do Canadá, e da Europa. Para além das previsíveis acções comemorativas nestes casos (exposições, concertos), a data fica também assinalada pela edição de uma compilação retrospectiva destes primeiros quinze anos de vida. Nos trinta temas que compõem o alinhamento, contam-se "consagrados" como os já citados of Montreal, Deerhoof, Mates of State, e Xiu Xiu; bandas emblemáticas como Joan of Arc; e nomes com relativo reconhecimento como Vivian Girls, Architecture in Helsinki, Love is All, Asobi Seksu, Someone Still Loves You Boris Yeltsin, e Loney Dear. E, claro está, essa fulgurante dupla que dá pelo nome de Japandroids, tão acarinhada por estas bandas. O melhor da coisa é que é de borla! Aqui.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

First Exposure #36















WHITE BIRDS

Formação: J. Harvey (voz, gtr); F. Houshiarnejad (bx, voz); M. Cammarata (btr, voz)
Origem: Filadélfia, Pennsylvania [US]
Género(s): Indie-Pop, Dream-Pop, Lo-Fi, Indie-Folk
Influências / Referências: The Beach Boys, Fleet Foxes, The Byrds, Real Estate, Beachwood Sparks

http://whitebirds.bandcamp.com/


"Honora" [Grizzly, 2011]

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Here we are now, entertain us

Foto: Kirk Weddle

"It means we won." - Gina Arnold

As palavras acima transcritas foram proferidas a propósito da chegada de Nevermind ao primeiro lugar da tabela de vendas norte-americana. Um feito já de si surpreendente, ganha outros contornos de simbolismo por ter destronado aquele que seria, porventura, o maior ícone mainstream à data: Michael Jackson. 

E quem é o "nós" a que a jornalista que fez carreira na Spin e na Rolling Stone, entre outras, se refere? Esse "nós" representa todos aqueles que, durante a década de 1980, de forma apaixonada e desinteressada suportaram o underground ianque, imunes aos ditames do establishment. Era essa a América de, entre tantos outros, Hüsker Dü, Dinosaur Jr., Sonic Youth, ou Pixies. Sobre estes três ultimos, convém lembrar que em Setembro de 1991 ainda não gozavam de reconhecimento mediático comparável ao de hoje. De resto, a possibilidade de trazer esse mundo subterrâneo (do qual era uma súmula) à superfície foi um efeito imediato e benéfico do sucesso de Nevermind. Num cenário em que o underground passou a overground, lucraram também as bandas emergentes, como os Pavement ou PJ Harvey (o trio inicial, esclareça-se), que apareceram num contexto substancialmente mais favorável ao crescimento.

Mas eis que, com o rumo da história bem encaminhado, e apercebendo-se do potencial de algo que até aí tinham ignorado, os executivos da indústria decidem nomear os Nirvana arautos de algo que incluía alguns pares mais alinhados com os excessos do rock dinossáurico de setentas, justamente uma das aversões confessas de Kurt Cobain. Pior, pior, só mesmo quando, por volta de 1994, é um vê-se-te-avias a assinar sub-produtos, clonagens toscas, e poseurs avulsos. Estava encontrada uma nova fórmula Rock FM que perdura até aos dias de hoje.

E o que tinha Nevermind de tão especial? Bem, desde logo um lote de canções de excepção que revelam uma incrível sensibilidade pop em conflito com a dureza das guitarras, mesmo quando se libertam os arremedos punk do "ensaio" Bleach, dois anos antes. Na afirmação de Cobain como compositor bafejado pelo génio, é justo atribuir a quota parte de responsabilidade ao trabalho de "limpeza" e "brilho" impostos pelo produtor Butch Vig, nome já com vasto currículo no underground, mas a partir daqui requisitado para projectos mais visíveis. A esta distância, essa característica técnica será, eventualmente, a grande pecha de Nevermind, que nas escutas mais recentes me soa demasiado preso a um tempo específico. Ainda e apenas referindo-me à produção, julgo que a crueza deliberada do subsequente In Utero resiste melhor ao tempo, talvez porque preserve maior pureza musical.

Vinte anos volvidos desde a sua edição, precisamente assinalados no passado sábado, a questão que ainda interessa debater é se alguém previu, ou até premeditou, o "fenómeno" Nevermind. Ainda que beneficiando dos relativos sucessos recentes do "mundo alternativo" a cargo dos Faith No More ou dos Jane's Addiction, penso que não. Penso que a parca primeira tiragem da edição britânica, reduzida a 40.000 exemplares, dá algum suporte à minha opinião. Acho sim, e não sou original na análise, que o furacão Nirvana se ficou a dever à "canção certa no momento certo" para toda uma geração alienada do contexto sócio-cultural da época. Um vídeo adequadíssimo em alta rotação fez o resto, e o mundo da música popular nunca mais foi o mesmo...

"Smells Like Teen Spirit" [Geffen, 1991]

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Descida ao Inferno















Na bolsa de valores musicais as cotações são variáveis. O que hoje não vale um chavo, pode amanhã ter o valor do metal dourado, e muitos clássicos instantâneos tornam-se esquecíveis ao fim de um lustro. Neste contínuo de reapreciação e reavaliação, a outrora mal-amada década de 1990 (no fim de contas, a "minha" década!) já é ponderada com o distanciamento suficiente a permitir a descoberta de inúmeros tesouros perdidos. Não é, portanto, de espantar que essa era seja agora intensamente explorada pelo quase único ganha-pão actual da indústria musical: a reedição.

É neste contexto de redescoberta que me apraz registar a recuperação dos britânicos Disco Inferno, banda que, no lapso de tempo compreendido entre 1991 e 1995 esteve particularmente activa na facção mais desafiadora do rock de então. Tal como os Bark Psychosis, para os quais cedo perderam um dos membros fundadores, estiveram na génese daquilo que ficou rotulado de post-rock. Aqui o conceito não deve ser entendido como a fórmula instrumental já algo gasta que passou para o senso comum, mas antes como algo que, partindo de uma matriz rock, não conheciam amarras à aventura e à experimentação, tal como "definido" um dia por Simon Reynolds. E, no período acima referido, os Disco Inferno muito contribuíram para lançar novos desafios ao "género moribundo", com dois álbuns e uma mão cheia de EPs, qualquer um deles merecedor de figurar nas colecções de discos que não se limitam aos frutos de cada estação.

São os quinze temas constantes dos EPs que surgem agora reunidos na compilação singelamente intitulada The 5 EPs, uma dádiva tendo em conta que há muito se encontravam fora de circulação. Será esta a porta de entrada ideal para neófitos no mundo dos Disco Inferno, uma banda que, como poucas, soube integrar o sampler em contexto rock. É surpreendente, tal a mestria com que as peças são combinadas, saber que a base de qualquer uma destas quinze canções (sim, o termo faz todo o sentido) se baseia na sequenciação de sons de proveniências várias: rádios antigas e exóticas, jingles publicitários, coros infantis, vidros estilhaçados, pedaços de músicas alheia, e o que mais vier à rede. Mas a música dos Disco Inferno não rejeita o elemento orgânico, materializado nas cascatas delicadas das guitarras, presumivelmente apreendidas do "mestre" Vini Reilly. Organizado cronologicamente, The 5 EPs é bem demonstrativo da rápida evolução sonora da banda ao longo do tempo, da contemplação de paisagens do começo, às colagens frenéticas da fase derradeira. Fica um par de amostras, um de cada fase. No último, penso que facilmente vão identificar a proveniência da batida ostensiva, apesar enquadrada num carrosel multicor com uma década de avanço em relação a uns tais The Go! Team.


"Summer's Last Sound" [Cheree, 1992]


"It's A Kid's World" [Rough Trade, 1994]

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

It's the end of the world as we know it (and I feel fine)


"To our Fans and Friends: As R.E.M., and as lifelong friends and co-conspirators, we have decided to call it a day as a band. We walk away with a great sense of gratitude, of finality, and of astonishment at all we have accomplished. To anyone who ever felt touched by our music, our deepest thanks for listening." R.E.M. 

A notícia já era esperada, ou sobretudo desejada, não só por mim como por um enorme rol de devotos dos "outros" R.E.M. que não vislumbravam um fim para o penoso calvário de década e meia, especialmente agudizado com a saída do baterista Bill Berry, em 1997. Contudo, este longo período de franca seca de inspiração não belisca a reputação da banda de Athens, Geórgia, conquistada essencialmente durante os anos da "independência" dos idos de 1980, década em que constituíram o equivalente norte-americano aos britânicos The Smiths, em termos de consistência editorial e culto crescente junto de um público fiel.

Formados em 1980, só três anos mais tarde o R.E.M. se estrearam no lançamentos de álbuns. A estreia coube a Murmur, desde logo alvo de grande aclamação, ainda que algo imberbe no assimilar das referências dos Byrds e das raízes musicais estado-unidenses filtradas pelos ventos post-punk que sopravam de Inglaterra. Nos quatro discos seguintes, lançados à razão de um por ano, os R.E.M. haveriam de aprimorar essa fórmula única e muito pessoal. Com especial destaque para Reckoning (1984) e Lifes Rich Pageant (1986), ambos já alvo das recomendáveis edições comemorativas de 25.º aniversário e demonstrativos de uma banda em estado de graça. É neste período de maturação que a música se vai adensando numa discreta complexidade, e que Michael Stipe vai refinando a ambiguidade da escrita.

Com o crescente de popularidade, primordialmente originada nas college radios, chegou o assédio das multinacionais. O concurso pelos R.E.M. foi ganho pela gigantesca Warner Bros., para a qual se estrearam com o meritório, mas domado, Green (1988), disco já com considerável sucesso comercial. A consagração mediática definitiva chegaria com o desequilibrado Out Of Time (1991), privilegiado pela rodagem massiva do hit "Losing My Relligion" e pela abertura dos media, e consequentemente dos mercados, ao mundo "alternativo". No ano seguinte, a redenção com novo clássico: Automatic For The People, a obra-prima da fase crescida dos R.E.M.. Após a curiosidade Monster (1994), rendido a sonoridades mais duras e agrestes, o árido e desencantado New Adventures In Hi-Fi (1996) assinala nova subida de forma. Podendo prever o futuro, qualquer cidadão sensato terminaria aqui uma história com um final feliz. Assim não o quiseram Michael Stipe, Peter Buck e Mike Mills que, em trio sob os holofotes da fama, acrescentaram um longo posfácio que não interessa mencionar.

"Radio Free Europe" [IRS, 1983]

"So. Central Rain" [IRS, 1984]

"Fall On Me" [IRS, 1986]

Aprovamento!
















Há cerca de dois anos, o quarteto The Drums chegava de rompante com um EP que era uma delícia para os adeptos da pop sem preconceitos e orgulhosa de o ser. Embora piscando o olho à era dourada dos sixties, e em particular às tonalidades surf, Summertime! surpreendia pela sua frescura, talvez derivada da tenra idade dos seus autores. Passaram-se alguns meses e chegou o primeiro álbum, e com ele o desmoronar das melhores expectativas. Não sei se influenciado pelas opiniões mais cépticas, se por reacção anti-hipster, mais provavelmente pela perda do "efeito novidade".

O tempo passa, e com ele são reconsideradas muitas análises prévias. Em relação ao debute dos The Drums, mantenho algumas reservas, mas é com renovado entusiasmo que recebo o novo Portamento, gravado ainda antes da saída acrimoniosa do guitarrista Adam Kessler. Talvez pressentindo essa mexida na formação, que até ia precipitando um final precoce da banda nova-iorquina, e com o intuito de preencher os espaços, o novo álbum dá rédea solta aos apontamentos de uma electrónica rudimentar. Mais sombrio que o seu antecessor, Portamento conserva ainda o espírito juvenil implícito a este género de canções. Uma escuta mais atenta permite também aferir da devoção pelos The Smiths, não tanto pela suave melancolia, mas mais pelas texturas das guitarras, por várias vezes subtilmente decalcadas das malhas cintilantes de Johnny Marr. Espera-se, contudo, que as vozes da reacção apontem as semelhanças evidentes entre cada um dos doze temas. Mas quem quer saber disso quando cada um deles exibe um naipe de recursos melódicos só ao alcance dos grandes artesãos pop? É o caso do exemplo infra que, ou é de mim, ou faz lembrar a letra daquela canção do rapaz que até gostava de ir dar uma volta mas não tinha um trapo para vestir.

"Money" [Moshi Moshi, 2011]

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Em escuta #60












THE PSYCHIC PARAMOUNT _ II [No Quarter, 2011]

Imerecidamente arredado dos destaques musicais da estação, este quarteto nova-iorquino rompe um silêncio de seis anos com um disco que é um claro passo evolutivo em relação ao debute. II espraia-se pelos meandros da música instrumental, na qual as guitarras se degladiam com as percussões, que tanto remetem para as escalas jazzísticas como para as propulsões kraut, alternando momentos pacíficos com descargas sónicas. Em teoria, poderíamos estar perante mais um projecto do mais estafado post-rock. Sucede que os Psychic Paramount trocam as voltas ao óbvio, dispondo os crescendos de forma casual e em duração variável. A ter de estabelecer paralelismos, prefiro remeter, salvas as distâncias melódicas, para as primeiras manipulações do ruído a golpes de guitarra de um Glenn Branca. [7,5]


TORO Y MOI _ Underneath The Pine [Carpark, 2011]

Projecto pessoal de Chaz Bundick, Toro Y Moi é uma das faces visíveis do chamado hypnagogic. Extremamente activo nos últimos tempos, privilegiou a via electrónica no registo do ano passado (Causeurs Of This). Substancialmente mais orgânico, este terceiro álbum destaca-se pelo bom punhado de temas que se deixam contaminar pelo disco e pelo funk "eléctrico", porém com subtileza e bom-gosto bastantes para não resvalar para o mero revisionismo. Contudo, no meio do borbulhar do frenesim destes ritmos, Bundick não enjeita os momentos de maior recolhimento, agora enriquecidos pela delicadeza de alguns apontamentos de guitarra. Ou até de texturas mais ásperas, como é o caso do frio metálico do intro que abre o disco. No final da fruição, fica no ar a sensação que, unidas as pontas soltas, este será apenas um passo seguro num trajecto em que o melhor poderá ainda estar para vir. [7,5]


WOODS _ Sun And Shade [Woodsist, 2011]

Com um ritmo de edições notável (sete álbuns desde a formação, em 2003), os Woods vão, com pequenas afinações na sua sonoridade, conquistando lugar de destaque na actual produção ianque. Quem conhece o par de discos imediatamente anterior já sabe o que Sun And Shade tem para oferecer: semi-baladas semi-psicadélicas estendidas sob um sol de fim de tarde, uma doce lazeira, e vozes nasaladas reminiscentes tanto de Graham Nash como de Neil Young. Não falta sequer a versão "obscura", desta feita por conta de "Who Do You Think I Am?", original de uns tais The Appletree Theatre. Mas eis que, no compromisso a meio caminho entre a folk e o lo-fi, o par de longos instrumentais irrompe abrindo novos mundos. O primeiro, "Out Of The Eye", deixa-se claramente enredar nas malhas do kraut. Já "Sol Y Sombra", substancialmente mais atonal, deriva progressivamente para a cacofonia velvetiana. Da conciliação da velha sonoridade com os potenciais corpos estranhos nasce, pasme-se, o mais conseguido e arrojado disco dos Woods. [8]


TY SEGALL _ Goodbye Bread [Drag City, 2011]

Outrora municiador de ondas de ruído gratuito, o californiano Ty Segall é mais um nome para juntar à falange dos putos-americanos-com-devoção-pelo-lo-fi-que-gravam-como-o-caraças à qual pertencem Nathan Williams (Wavves) e o malogrado Jay Reatard. Neste primeiro disco com algumas cedências à ortodoxia, porém, destaca-se dos seus pares com uma surpreendente maturidade pop. Construído quase exclusivamente à guitarra, com percussões rarefeitas, Goodbye Bread é um tratado de canções que destilam ennui juvenil. Ainda que gravado em condições precárias, faz disso uma mais valia em favor da pureza musical. Quando evoca, ao de leve, a berraria do passado recente (caso do brilhante "My Head Explodes"), Ty Segall parece ter encontrado a contenção adequada às pretensões de harmonia e catarse. E já que se fala em catarse, seria imperdoável não referir o não menos brilhante "I Am With You", pura declaração de desprezo, tanto pelo mundo dos pequenos como pelo dos graúdos. Talvez, tal como o outro e tantos de nós, Segall just wasn't made for these times... [8]

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

As primeiras impressões de Verónica
















Presumo que ainda se lembrem dos Veronica Falls, uma banda que aqui apresentei há já algum tempo. De então para cá, o quarteto londrino lançou um par de singles que nos deixaram de sobreaviso em relação a edições futuras. Com injusta jocosidade, são muitas vezes apontados como a "banda-britânica-que-imita-os-americanos-que-imitam-os-ingleses". Quer isto dizer que, com as suas guitarras estridentes e ligeiramente distorcidas (poupem o inadequado shoegaze, sff), alinham na recordação da época áurea do indie da segunda metade de oitentas, aquela que foi propulsionada pela já mítica C86. Não será por acaso que chamaram a atenção da Slumberland Records, eventualmente a editora que melhor representa estas sonoridades. A verdade é que, talvez por inerência das origens, parecem-me das propostas mais genuínas dentro do "género" e aparentados.

Em breve, mais precisamente dentro de um mês irão ser sujeitos à prova dos noves - leia-se primeiro álbum. Simplesmente intitulado Veronica Falls, o disco inclui uma dúzia de temas, entre eles a parelha já nossa bem conhecida ("Found Love In A Graveyard" e "Beachy Head") em gravações ligeiramente diferentes. E inclui também este óptimo avanço, que mantém intacta a singularidade da música dos Veronica Falls: matriz pop em estado de graça, sublinhada nas harmonias vocais, contaminada por uma espécie de surf "zombificado" e por um intenso cheiro à sujidade garage. Como poderão constatar, este tema tem ainda a particularidade de introduzir um riff assumidamente flamenco(!). Que a contagem decrescente comece...

"Bad Feeling" [Slumberland / Bella Union, 2011]

sábado, 17 de setembro de 2011

O Sol, quando nasce, é para todos













Em tempos que já lá vão, Indra Dunis e Aaron Coyes foram integrantes dos obscuros Rahdunes, banda drony a operar na área de São Francisco. Mudaram de poiso, para Madison, no Winscosin, casaram e, juntos, fundaram os Peaking Lights. Num primeiro trabalho, e ainda que a navegar em ondas de ruído, o casal demarcou-se do passado com uma proposta com aproximações à estandardização pop.

O corte definitivo com aquelas sonoridades acontece com o mais recente 936. Ainda que não se trate de um disco digerível por todos os tímpanos, o segundo álbum dos Peaking Lights é forte candidato a criar culto de crescimento gradual. Numa abordagem rápida e simplista, podemos atribuir-lhe adjectivos como "psicadélico" ou "exploratório". Porém, tal catalogação pouco diz da originalidade da sonoridade, construída a partir da sobreposição e repetição de notas esparsas de guitarra e texturas de sintetizadores "preparados" pelos próprios, e que assenta essencialmente em expressões da música jamaicana como o dub, ou até, mais subtilmente, o reggae. Os ouvidos mais atentos poderão ainda detectar um leve travo trendy da nova tendência chillwave, mas em dose tão diminuta que é mais tempero que ingrediente. 

Fruto do crescente interesse por essa blogosfera especializada, 936 já valeu aos Peaking Lights uma pequena subida na escadaria das "independentes". Lançado originalmente em Março último por uma pequena editora, está agora a ser distribuído pela multifacetada Mexican Summer, na América do Norte, e pela Weird World (subsidiária da Domino Records) na Europa. Entretanto, há já a confirmação de que o terceiro trabalho, anunciado para os primeiros meses do próximo ano, terá selo desta última editora. Desta vez, desconfio, os rivais "sanguessugas" de bandas emergentes da 4AD deviam estar distraídos...

"All The Sun That Shines" [Not Not Fun, 2011]

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

O mistério da Santíssima Trindade
















Há precisamente dois anos, os Girls aterravam nestes ouvidos. Traziam na bagagem um debute singelamente intitulado Album que, apesar de tão pouco "googlável" como o nome da banda, acabou por constituir um daqueles pequenos fenómenos que crescem de boca em boca. Vinha recheado com um naipe de canções intemporais que, embora toscas, não enjeitavam desejos de grandiosidade. O autor, Christopher Owens, expiava demónios e aliviava dramas passados, porém com uma ironia que o esquivava do ridículo da auto-comiseração. E isso, é preciso que se diga meus senhores, é proeza ao alcance de poucos depois do jovem Morrissey... Depois veio Broken Dreams Club (2010), um EP de canções mais cuidadas, e com ele o alarme: parece que agora o "nosso" Chris quer ser  levado a sério...

A propósito do novíssimo Father, Son, Holy Ghost, gravado com uma sumptuosidade só possível em estúdios de alta qualidade, Owens veio afirmar que, no passado, os Girls eram lo-fi apenas porque não tinham acesso a melhores condições de gravação. Esse rapaz, se bem se lembram, era o mesmo que há escassos 24 meses declarava o seu amor pelos Guided by Voices e nós acreditávamos... A "mentira" seria desculpável se o novo disco fosse um disco convincente, o que, decididamente, não é. Tal como o antecessor, olha pelo retrovisor mas deixa a evidência de ir beber às fontes erradas. "Die", por exemplo, vive num limbo de indefinição entre o hard-rock bafiento de setentas e o glam retardado. É apenas um dos vários temas pródigo em solos de guitarras que cospem "azeite" em seu redor. Igualmente ricos em teor de gorduras, a maioria dos temas mais calmos (em número considerável) deixam na boca o amargo sabor do tenebroso soft-rock da mesma altura. No começo do já bem conhecido "Vomit" ainda há um assomo do Jason Pierce afectado que assombrava Album, mas este cedo dá lugar a uma variação daquele híbrido viscoso que na segunda metade de oitentas disputava as ondas hertzianas com o raçudo hair-metal. Bem esprimido, Father... ainda rende uma par de canções dignas de nota: uma delas é "Alex", contaminada por laivos power-pop que não ficariam mal nos Teenage Fanclub "maduros"; a outra é "Saying I Love You", um docinho que tresanda a fifties e - mais importante - recupera o Owens pateta que outrora nos seduziu. Duas em onze possíveis é muito pouco vindo de quem já nos deu tanto, mas nada que me impeça de vaticinar para Father... um futuro risonho. É que, não sei se já repararam, estes são tempos muito dados ao branqueamento de atrocidades musicais que, por decreto, não deveriam sequer ser mencionadas...


"Saying I Love You" [True Panther, 2011]

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Sonhos cor-de-rosa

















Na produção musical actual é crescente a fatia ocupada pelos projectos dados à deriva sónica com vista aos estados alterados da mente. Com especial incidência nos Estados Unidos, mas um pouco por todo o globo, as ondas de distorção e as generosas doses de ruído disseminam-se pela vastidão do universo indie. Em terras do Tio Sam já não é novidade para ninguém que grande parte das novas bandas sejam recebidas com os prefixos dream, noise, ou psych, antes do substantivo pop.

Mais um nome para juntar ao extenso rol de adictos dos pedais de efeitos, os Pink Playground são um duo texano de Houston. Nas press-releases do futuro primeiro álbum fala-se em camadas densas de ruído contundente, melodias açucaradas embora difusas, e em estados anestesiados. Fala-se também em paralelismos com os primórdios dos Mary Chain, quando a banda dos irmãos Reid afrontava o mundo pop com uma proposta que haveria de mudar os seus desígnios. Mas isso é algo que apenas poderemos confirmar lá para o final do mês, quando a incansável e multifacetada Mexican Summer lançar Destination Ecstasy. Por ora, e baseando-me apenas em amostras do passado recente, prefiro situar os Pink Playground entre as estruturas líquidas dos My Bloody Valentine e as paisagens celestiais dos Cocteau Twins. Esta tese é suportada pela música que acompanha o belíssimo vídeo que recupera imagens de um velho filme de Philippe Garrel.

"Come Find Me" [Downwards, 2011]

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Discos pe(r)didos #57








THROWING MUSES
The Real Ramona
[4AD, 1991]




Banda emblemática na chamada "cena de Boston" (embora tenham origem noutras paragens), os Throwing Muses constituem um daqueles raros casos de sonoridades únicas, com as quais é difícil estabelecer comparações óbvias. Obviamente movidos pelo leque de ideias gerados pelo pós-punk, souberam criar uma linguagem própria, assente em estruturas pouco previsíveis e canções que, na sua aparente fragilidade, vivem num denso ensombramento. Como imagens de marca têm o timbre invulgar de Kristin Hersh, ela que com a meia-irmã Tanya Donelly fundou a banda ainda durante a adolescência de ambas, e os floreados delicados das guitarras. Foram também responsáveis pela "descoberta" dos Pixies, banda amiga que rapidamente os ultrapassou em termos de mediatismo.

Se numa primeira fase os discos dos Muses se pautam por alguma agrura impenetrável, nos primeiros meses de 1991, e longe de imaginar a revolução indie/"alternativa" que estava reservada para a parte final do ano, atingiram o seu ponto óptimo com um disco que faz a ponte com a via mais directa do futuro. O que equivale a dizer que, até àquela data, The Real Ramona era o mais acessível ao ouvinte médio dos quatro álbuns editados, sem que, contudo deixe de exorcisar os fantasmas de Hersh. De resto, essa vertente torturada está bem patente "Ellen West", tema que leva o nome de uma conhecida paciente de anorexia nervosa e que é dos mais tensos, tanto na voz como na música, de todo o álbum. Apesar desta e de uma ou outra concessão à negritude, a luminosidade é uma certeza desde o primeiro instante com "Counting Backwards", canção de uma leveza assumidamente pop e assente num ritmo quebrado comandado pela batida atípica de David Narcizo. No que respeita aos temas da autoria de Hersh (dez dos doze do alinhamento), a delicadeza é apenas superada por "Red Shoes", de um brilho cintilante capaz de comover o mais empedernido dos seres. Neste, a voz única da cantora eleva-se no seu registo entre o trémulo e grito abafado. Equiparável seria "Grafitti", não fosse a maior previsibilidade da estrutura. O contrário pode-se dizer de "Hook In Your Head", o tema mais longo de todo o disco e também o mais ambicioso, com mudanças de tempo constantes. Na metade final, as ribombar das pancadas secas de Narcizo ecoam de forma absolutamente demolidora, até quase desviarem por completo a atenção das descargas de distorção. No final do alinhamento, "Two Step" é uma semi-balada que justifica as alusões hawaiianas de título e capa e que não está longe de alguns temas dos comparsas Pixies.

Com o seu contributo composicional reduzido a um par de temas, Tanya Donelly chama a si o troféu pop com "Not Too Soon", gema irresistivelmente vaporosa que deixa bem demarcada a diferença de densidade que sempre a separou da escrita da meia-irmã. Menos imediata, "Honeychain" inicia-se em registo de canção-de-embalar até rebentar numa explosão de guitarras perfurantes para, logo em seguida, recuperar o ambiente diáfano.

Talvez insatisfeita com o papel secundário, Donelly abandonou a banda pouco depois da edição de The Real Ramona. Consigo levou o baixista Fred Abong que integrou na formação dos Belly, projecto de vida breve mas bem sucedido na exploração da veia pop que parecia aflorar nos Muses. Kristin Hersh seguiu o trajecto, sempre acompanhada do fiel baterista David Narcizo. Numa fase imediata registou um endurecer da sonoridade, em consonância com as tendências da altura. Talvez mercê da citada "revolução", foi nesse ponto que os Throwing Muses conheceram o maior sucesso comercial, inclusive junto do público americano que sempre os olhou com maior distanciamento que o britânico.


"Counting Backwards"


"Red Shoes"


"Not Too Soon"

domingo, 11 de setembro de 2011

Ao vivo #69
















Six Organs of Admittance @ Teatro Maria Matos, 10/09/2011

Com uma carreira que remonta aos últimos anos do século passado, Ben Chasny é dos mais produtivos e bem relacionados músicos do actual circuito musical catalogável como leftfield. Na sua obra como Six Organs of Admittance distinguem-se duas diferentes facetas: uma mais dada aos derivados da "folk erudita" instituída pelo lendário John Fahey, e outra mais alinhada com as expressões drone. No todo, prevalece a primeira, também dominante no recente Asleep On The Floodplain.

Não é por isso de estranhar, e até porque se apresenta em solitário, que na noite de ontem Chasny enverede pela via acústica, pontuada por complexos rendilhados e uma boa dose de intimismo. Para o receber tem um auditório com uma lotação perto de estar completa e que sabe ao que vem, ou não fosse o músico californiano um habitué nos pequenos palcos deste país. A empatia, quase a roçar a reverência, fica bem patente na intensidade dos aplausos ao fim de cada música. E merecidos, diga-se, pois além da delicadeza das peças, apesar da exigência técnica tocadas com um desprendimento alarmante, Chasny ainda brinda o público com tiradas de um humor refinado. Menos virtuoso que alguns dos seus aparentados (James Blackshaw ou o malogrado Jack Rose, por exemplo), investe mais na criação de ambientes, normalmente de uma melancolia a roçar o sombrio. Para tal, recorre mais abundantemente aos tons graves e usa o trunfo da voz que, sem ser de excepção, tem uma expressividade assinalável numa escala que vai do murmúrio tímido ao exuberante falsetto. No final, e de ambas as partes, fica a sensação de um pequeno pedaço de serão bem passado entre amigos de longa data.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Thank you for the days, those endless days, those sacred days you gave me














Seja em conversas propriamente ditas, seja em "fóruns virtuais" em que participe, e sempre que a ocasião se proporciona, não perco o ensejo de louvar as qualidades dos Real Estate. Se bem se lembram, foram estes quatro rapazes de Nova Jérsia que, há coisa de dois anos, nos proporcionaram um primeiro álbum - homónimo - que é espécie rara nos tempos que correm. Disco de combustão lenta, em tons sépia e com aromas de Verão mais dado ao ócio que ao buliço, Real Estate é daquelas peças musicais que se vão entranhando gradualmente até à rendição total. E para essa, refira-se, também teve forte contributo o trio de concertos a que tive o prazer de assistir (dois deles em dias seguidos!), todos eles testemunhos de uma banda que sente a música que executa com sentimento mas sem maneirismos exibicionistas.

Ainda que no meu círculo de conhecimentos os esforços se mostrem algo inglórios, apraz-me registar que noutras partes do mundo alguém reconhece o potencial da simplicidade dos Real Estate. É o caso da gigantesca independente Domino Records, que recentemente os resgatou à pequena mas influente Woodsist. Já será pela editora londrina que sairá, em meados de Outubro próximo, Days, o tão esperado segundo álbum. Mais abaixo está disponível o primeiro avanço, uma pequena pérola que, apesar de levantar ligeiramente o filtro granuloso do anterior registo, mantém intacta a pureza das melodias em círculo. Aqui e ali, as sempre redutoras comparações aos benditos regressados The Feelies vão subindo de tom. Só boas pistas, portanto...

"It's Real" [Domino, 2011]

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

TPM



















Foto: keeks' camera

Quem aqui vem com alguma regularidade, e ainda se dá ao trabalho de ler estas linhas toscas, sabe da minha devoção pelos Male Bonding, seguramente uma das mais estimulantes bandas da "cena" britânica actual. Já que volto a falar neles, aproveito para recomendar o novíssimo Endless Now, excelente álbum menos dado aos impulsos punky de outrora e mais reminiscente do melhor indie-rock de noventas. Quem procura esse lado mais incisivo do trio londrino, ou de parte dele, pode localizar Kevin Hendrick e John Arthur Webb, respectivamente guitarrista e baixista, ambos vocalistas, como integrantes dos PRE, banda prévia em que ainda militam. Na mesma formação pontifica Akiko Matsuura, a japonesa emigrada que conhecemos como líder dos incendiários Comanechi e como baterista de palco dos sobre-valorizados The Big Pink.

Ultimamente menos activos devido às actividades extra dos seus membros, os PRE contam já com dois álbuns e um bom punhado de singles no currículo. A receita é uma música acelerada, com temas curtos e incisivos, situada numa nebulosa onde se intersectam punk, noise e atitude riot grrrl. Normalmente, o ritmo fustigador é movido por um baixo monstruoso, ao qual se juntam as guitarras afiadas como lâminas e os guinchos possessos. Porém, rezam as crónicas que a verdadeira essência dos PRE se liberta em palco. É neste habitat que a pequena nipónica, também conhecida pelo sugestivo cognome Exceedingly Good Keex, se assume como uma das mais endiabradas mulheres do rock actual. Consta que, no meio da berraria, as performances da dita incluem muito suor e doses massivas de stage diving e crowd surfing com poucos ou nenhuns adereços (leia-se roupa). Depois desta descrição, já vos imagino a sentir saudades dos primeiros tempos de uma tal Karen O... Não?! Então vejam o imaginativo vídeo, tendo presente que a música propriamente dita só começa lá para os 2'40'':

"Teenage Lakes" [Skin Graft, 2009]

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Mil imagens #22


The Stone Roses - Manchester, 1989
[Foto: Kevin Cummins]

Razões para sorrir















Reza a lenda que, durante as gravações daquilo que deveria ter sido SMiLE, Brian Wilson não aguentou a pressão das expectativas criadas depois do magistral Pet Sounds (1966) e meteu o projecto na gaveta. Iniciava-se assim uma espiral de debilidade mental, até ao quase total desaparecimento das lides musicais, e nascia o mito do mais célebre "disco perdido" de sempre, o mais desejado por milhões de melómanos. Mesmo tendo em conta que muitas das faixas previstas tenham surgido em álbuns posteriores dos Beach Boys e que o próprio Brian Wilson, renascido e renovado, nos tenha presenteado, em 2004, com aquela que poderia ser a "versão acabada" do disco que tinha imaginado conjuntamente com Van Dyke Parks.

E eis que, com o Verão provavelmente ainda para durar, mas já com o mercado de Natal no horizonte, a Capitol anuncia para 31 de Outubro a edição das chamadas The SMiLE Sessions. Afinal de contas, é destes produtos atractivos, que recuperam a memória, que a indústria musical se vai alimentando nesta era da música para todos e sem qualquer custo. Consta que, no "polimento" das gravações originais estiveram envolvidos os sobreviventes Wilson, Al Jardine e Mike Love. Como é hábito, a coisa surge em diferentes formatos. O mais convencional, e mais acessível para a maioria das carteiras, é a edição em duplo CD (ou duplo LP) que, segundo os envolvidos, pretende ser uma versão muito próxima do álbum intentado acrescido de um bom número de extras. Depois há o inevitável boxset, o mais apetecível, mas provavelmente a preços proibitivos, que vem envolvido numa caixa capaz de deixar os olhos com água-na-boca. Lá dentro estão cinco CDs, dois LPs, dois 7" (Heroes And Villains e Good Vibrations), e um livro de 60 páginas. Os realmente endinheirados, dispõem ainda da possibilidade de adquirir umas dos exemplares da edição deluxe da "caixa", autografada e acompanhada de uma longboard semelhante à da foto. Vá lá, deitem essa coisa feia que é a inveja para trás das costas e libertem essas boas vibraçoes...


"Good Vibrations" [Capitol, 1966]

sábado, 3 de setembro de 2011

A festa do pijama
















Hoje com 53 anos, o neozelandês Neil Finn já dedicou três quartos da sua vida à causa da música popular. Ainda juvenil, juntou-se aos Split Enz, o combo com pretensões arty liderado pelo irmão Tim que, em matéria de criatividade, deixa boa parte dos new-wavers ocidentais contemporâneos a milhas de distância. Já como timoneiro, integrou os bem conhecidos Crowded House, grupo de artífices pop que só não tem maior reconhecimento por causa da aversão que parte da geração de oitentas, presa no negrume bacoco, parece ter ao sucesso. No campo das actividades paralelas, refira-se que foi um dos responsáveis, juntamente com a esposa Sharon, pela reactivação da lendária Flying Nun Records, editora que estabeleceu aquele arquipélago do Pacífico como o autêntico paraíso indie.

Segundo o próprio, com a saída dos filhos de casa (relembre-se que o mais velho, Liam, tem carreira musical bastante consolidada), o casal ficou com demasiado tempo livre. Vai daí, convocaram os amigos Sean Donnelly, com vasta obra publicada sob a sigla JBS, e Alana Skyring (The Grates) e, juntos, fundaram os Pajama Club. O nome original da banda, nascida já no decorrer deste ano de 2011, era Pajama Party mas, por imperativos leagis, viu-se obrigada à pequena mudança. Nos escassos meses junto, o quarteto gravou já um álbum homónimo, com lançamento europeu previsto para dentro de duas semanas. Por aí já circulam uns quantos temas avulsos, e que revelam uma pop canónica e melodiosa, mas rica em pormenores. Este, por exemplo, não esconde a incurável reverência do mais sonante dos membros dos Pajama Club pela mestria pop dos fab four, ao mesmo tempo que faz a ponte com o que de melhor se fazia há perto de vinte anos.

"From A Friend To A Friend" [Lester, 2011]

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Supremos idiotas encaixotados
















Hoje perdidos nas páginas do tempo, os Supreme Dicks são uma banda essencial para a compreensão das orientações da música dita "alternativa" dos últimos 30 anos. Oriundos de Amherst, Massachusetts, a mesma cidadezita que pariu os Dinosaur Jr., iniciaram actividades ainda em alvores da década de 1980. Nesse período, e apesar da considerável obscuridade, tiveram forte impacto em bandas como os citados Dinosaur Jr. (Lou Barlow foi, inclusive, um membro não permanente) e Sonic Youth, e consequentemente na explosão altern-rock de inícios da década seguinte. Apenas aqui, já com o underground virado do avesso e amadurecidos como banda atípica para quaisquer parâmetros, chegaram aos álbuns, que editaram em número de dois, ambos com selo da histórica Homestead Records: The Unexamined Life (1993) e The Emotional Plague (1996). Contrário ao consenso geral, prefiro o primeiro, um disco incatalogável que mistura estilhaços de folk pastoral, kraut, pop esquizóide, noise, e o que mais vier à rede. Já o segundo, talvez até mais dado à experimentação, mergulha mais profundamente nas questões existencialistas, no surrealismo beefheartiano, e também nas raízes do americana. Ambos foram fonte de inspiração para largo espectro da música popular leftfield que lhes sucedeu, seja o post-rock menos estandardizado, seja a neo-psicadelia que tem aflorado na última década e meia, ou ainda boa parte dos integrantes do colectivo Elephant 6.

Para os curiosos e para os saudosistas, e atendendo a que os discos dos Supreme Dicks estão há muito indisponíveis no mercado, parece haver boas notícias. Consta que, lá para meados de Outubro próximo, por iniciativa da Jagjaguwar, toda a discografia da banda estará disponível através do boxset Breathing And Not Breathing. Ao todo, são quatro CDs que, além dos dois álbuns de estúdio, reúnem ainda a compilação de temas dos primórdios Workingman's Dick (1994), originalmente editada apenas na Europa, e o EP This Is Not A Dick (1996), acompanhado de um bom número de inéditos. Em simultâneo, ocorrerá também a reedição do par de álbuns em vinil. Agora, vá lá, não sejam dicks e tratem de ouvir. Depois vão escrever ao Pai Natal...


"Jack-O-Lantern" [Homestead, 1993]


"Swell Song" [Homestead, 1996]