"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

segunda-feira, 18 de junho de 2007

A BÍBLIA DE GREEN

No seguimento do comentário de um estimado camarada bloguista a propósito de um post recente, esclareço que não tenho qualquer animosidade contida em relação aos Arcade Fire. Quem me conhece sabe que fui um entusiasta da banda canadiana desde que Funeral me chegou aos ouvidos, já lá vão dois anos e meio. No entanto, e como ninguém é perfeito, acho que Neon Bible é mesmo muito fraco (eu fiz um esforço para gostar, acreditem). E também acho que só mereceu tamanho destaque por vir de onde vem.

Segundo um post publicado pelo grande Simon Reynolds, Green Gartside, o galês que há quase trinta anos dirige de forma intermitente os desígnios dos Scritti Politti (ainda no ano passado, perante a indiferença geral, editaram o mui recomendável White Bread, Black Beer), traduz de forma perfeita a minha opinião acerca de Neon Bible. Passo a citar:

People who enjoy this album may think I'm cloth-eared and unperceptive, and I accept it's the result of my personal shortcomings, but what I hear in Arcade Fire is an agglomeration of mannerisms, cliches and devices. I find it solidly unattractive, texturally nasty, a bit harmonically and melodically dull, bombastic and melodramatic, and the rhythms are pedestrian. It's monotonous in its textures and in the old-fashioned, nasty, clunky 80s rhythms and eighth-note basslines. It isn't, as people are suggesting, richly rewarding and inventive. The melodies stick too closely to the chord changes. Win Butler's voice uses certain stylistic devices - it goes wobbly and shouty, then whispery - and I guess people like wobbly and shouty going to whispery, they think it signifies real feeling. It's some people's idea of unmediated emotion. I can imagine Jeremy Clarkson liking it; it's for people in cars. It's rather flat and unlovely. The album and the response to it represent a bunch of beliefs about expression and truth that I don't share. The battle against unreconstructed rock music continues.

NOTA: A citação transcrita acima faz parte de uma série de entrevistas levadas a cabo pelo jornalista Paul Lester para o jornal The Guardian. Na peça que podem ler na íntegra aqui, diversas personalidades do mundo da música são convidadas a fazer a sua apreciação de um disco que consideram sobrevalorizado. E digo-lhes que é, no mínimo, hilariante... principalmente quando são abordados discos que temos em boa conta.

6 comentários:

strange quark disse...

Não é a minha primeira visita, mas é o meu primeiro comentário, por isso começo por saudar o autor do blog pelo mesmo e desejar a continuação de bons posts.

Gostei deste post! Segui os links e li rapidamente os diversos contributos para a desgraça dos ilustres nomeados (uma maravilha!). Acho que todos nós veremos ali diversos pontos com os quais nos identificamos e outros com os quais não concordamos de todo. No entanto, devo realçar que, acima de tudo, devemos ser fiéis às nossas opiniões e à capacidade de ouvir os outros e termos a abertura de espírito suficiente para darmos a mão à palmatória quando é o caso.

Mas o post encerra diversos pontos para reflexão, o primeiro dos quais é que na música, seja qual for o género, encontramos muitos traços de tribalismo, ou seja, uma ideia concebida de que apenas certas formas de expressão fazem sentido num dado grupo. Faz lembrar a maldição de personagens como Philip Glass ou John Cale para mencionar dois exemplos em campos diferentes (erudita e pop/rock): ambos são demasiado levianos para os eruditos e demasiado eruditos para o pop/rock. Esse aspecto é por demais evidente em várias das contribuições, em que alguns dos discos acabam por ser julgados fundamentalmente pela sua filosofia, ou forma de encarar a música num dado género, que por razões mais objectivas. Em segundo lugar, e este parece-me mais interessante, é obrigar-nos a recontextualizar as nossas próprias concepções e opiniões, fazendo-nos lembrar que elas não são nem mais nem menos objectivas ou com autoridade que aquelas que foram expressas, apesar de aquelas personalidades terem a sua opinião divulgada pelo mundo inteiro e esta pequena discussão ter consequências para uns quantos interessados no assunto (mas infinitamente menos que os outros). De resto, só quem não ouve com atenção é que pode afirmar que a voz de Nico é boa (eu diria que nem razoável é), ou que o simples facto de gostarmos de uma banda implica que os seus elementos são excelentes executantes musicais (ainda não há muito tempo essa discussão apanhou os Joy Division pela frente no blog da Radar, e apesar de gostar, e muito, deles não deixam de ser executantes musicais banais). E também assino por baixo o que é dito sobre os The Strokes, o Neon Bible dos Arcade Fire ou o Nevermind dos Nirvana (e ainda acrescento os Franz Ferdinand). Quanto à questão do valor das bandas, creio que será sempre assim: umas serão sempre sobrevalorizadas e outras o inverso, porque depende, em última análise, de meras leis de mercado, seja económico ou até intelectual. Quantas bandas não existem, com qualidade superior em perpétuo anonimato para o Mundo? No fundo, cada um de nós tem, e terá, a sua opinião mas o mais importante que tudo (mesmo que uma sumidade venha dizer que a banda X é uma treta pegada ou que o álbum Y é um embuste completo) é que aquilo que ouvimos nos dê prazer. No fundo, é disto que estamos a falar, não é?

Um abraço

M.A. disse...

Sim. É mais ou menos isso. No essencial estamos de acordo (e acho que foi bastante oportuna a tua referência aos Joy Division).
Como eu já disse no próprio post, acho a peça delirante, mesmo gostando muito da maioria dos discos que trata. É que, apesar da nossa veneração, não existirão discos perfeitos e é sempre muito salutar ver alguém (com algum sentido de humor)apontar os defeitos dessas mesmas obras.
A revista Magnet (de que já falei por aqui várias vezes)tem uma coluna regular intitulada "Where's the street team?" onde se desanca de forma corrosiva em discos que estão na ordem do dia. Costuma ser das coisas da revista que leio em primeiro lugar. Escusado será dizer que, por norma, essa coluna gera cartas bastante iradas dos leitores.

Um abraço e volta sempre

Joe disse...

Meu caro m.a., obrigado pelo "estimado camarada". Gostei da sonoridade :) O meu comentário foi, como sabes, na brincadeira, apesar de aparentemente gostar mais do que tu dos AF e deste disco (mesmo claramente inferior ao Funeral, acho que está longe de ser fraco).
Indo ao que mais interessa, o artigo que linkaste é demais, e (ao contrário de muita gente) adoro ouvir dizer mal de coisas que goste ou que não goste. Tenho uma rubrica na C70 dedicada a falar mal de quem não gostto, que tenho que reactivar. Achei especial piada ao kapranos a malhar nos Television (!!!!!!), e no cuidado especial colocado na hilariante crítica ao "VU and Nico" ("the viola on Venus In Furs sounds like a Tom and Jerry sound effect"... LOLOLOL!!!). Só falta ali alguém a dizer mal dos U2...
Se há coisa que aprendi desde que comecei a ouvir música, é que os gostos se discutem sim senhor, mas é perda de tempo tentar explicá-los. Toda a gente malha no novo dos Bloc Party, eu acho que está genial. Toda a gente adora a Joanna Newsom, eu não a posso ouvir. E acho que não vou deixar de falar a ninguém por causa disso :) Como dizia a minha avó, o que seria do amarelo se não houvesse mau gosto?
Abraço!

M.A. disse...

Caro Joe:
Como leitor da Uncut que eu sei que és, decerto ainda te lembrarás daquela rubrica que eles tinham que era o Sacred Cows. Seguia mais ou menos esta lógica e tenho muita pena que tenha sido extinta.
Uma vez que estás numa de reactivar a tua rubrica de escárnio, e se me permites, lançava dois nomes muito "in" que gostava de ver "mimados" pela tua verve: Patrick Wolf e Rufus. E pode também ser a Joanna Newsom, de quem eu gosto muito.
Com elevada estima, subscrevo-me
M.A.

Joe disse...

Ontem reactivei mesmo a rubrica em questão, mas reservei a honra para quem já há muito a merecia :)
E por acaso gosto do Rufus, embora já me comece a encher um bocado. Mas é o tipo de figura que facilmente pode despertar "pet hates". Quanto ao Patrick Wolf, acho-o tão irritante que nem tento ouvir as coisas que faz.
Foi de facto uma pena a Sacred Cows ter acabado. Ainda me lembro de algumas hilariantes descargas de fel sobre gente por mim tão respeitada como os Joy Division e os Primal Scream.

M.A. disse...

Já vi que sim! E deste-lhes forte!
Lembro-me perfeitamente dessas "Sacred Cows" e também da dos Clash...
Olha que eu tb gosto do "Poses" e do 1.º do Rufus, mas desde que lhe deu para aquela pop barroca perdi a paciência.