"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

domingo, 18 de maio de 2014

Esplendor de cores















Desculpem-me a insistência, mas hoje voltamos a denunciar a incapacidade da "música de guitarras" actual em criar algo de verdadeiramente refrescante a partir da herança do passado de seis décadas. Admitindo a inevitabilidade da eterna regressão, o que me desilude é a tendência generalizada para o decalque descarado de tiques e truques, muitas vezes gastos. Ainda não há nada, éramos bombardeados pelo revivalismo garage com cheiro a mofo e por uma imensidão de xonices de inspiração shoegaze. Mais recentemente, os adjectivos psych e kraut passaram a servir de rótulo a qualquer sub-produto vendido aos incautos como a mais radiosa novidade. Neste deserto de ideias brilham com mais intensidade as honrosas excepções, aquelas propostas assumidamente mergulhadas no passado, mas com o olhar fixo no presente e nas possibilidades do futuro. Portanto, hoje mais que nunca, é um trabalho redobrado o de separar o trigo do joio. 

Deste campo tomado pelas ervas daninhas, gostava de extrair os norte-americanos Quilt que, depois do interessante mas algo difuso debute homónimo em 2001, superam as expectativas mais optimistas com o novo Held In Splendor. Toda a retórica introdutória faz sentido porque este trio formado em Boston não disfarça sequer a inspiração nas sonoridades da segunda metade dos sixties, aquelas que têm nos The Byrds e The Mamas & The Papas figuras tutelares, e se estendem à brigada que fazia da Rickenbacker, do Farfisa, e do abuso da reverberação, ferramentas predilectas. Ao contrário da maioria da concorrência, porém, não se confinam ao mimetismo localizado, baralhando a bel-prazer as múltiplas referências dispersas com o propósito atingir aquele limbo em que os conceitos "pop" e "folk" se confundem. O grande trunfo reside, no entanto, no engenho para escrever canções escorreitas e altamente coloridas, não obstante por mais que uma vez arrisquem a mutação de forma dentro do mesmo tema, mas sem perder o sentido de linearidade. Substancialmente menos dado às harmonias vocais conjuntas que o antecessor, este segundo álbum é mais ou menos democrático na repartição das vocalizações separadas de Shane Butler e Anna Fox Rochinski. Produzido por Jarvis Taveniere, dos parentes próximos Woods, Held In Splendor ganha na dicotomia boy/girl uma variedade que não ameaça a coesão do todo. Assim, nos temas "dele" vagueia-se na encruzilhada entre a pop ensolarada da west coast e a sujidade garage, enquanto os temas cantados por ela, normalmente mais luminosos, têm a dose trippy e sexy da Grace Slick dos melhores tempos, evocando em simultâneo o encanto das "divas" psych-folk britânicas. Com discos destes servir de suporte sonoro, o Verão já podia começar amanhã.

 
"Arctic Shark" [Mexican Summer, 2014]

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