"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Há 20 anos era assim #6









SMASHING PUMPKINS
Siamese Dream
[Hut, 1993]




Certamente ainda se lembrarão do período que se seguiu ao boom dos Nirvana, e do sem número de bandas que beneficiaram em exposição com o acaso, que a dada altura nos eram impingidas a um ritmo incessante e sem qualquer espécie de crivo qualitativo. Curiosamente, e pelo menos cá pelo burgo, os Smashing Pumpkins necessitaram das primeiras manifestações de megalomania do líder Billy Corgan para serem notados por um número vasto de jovens de noventas, apenas depois da rotação massiva dos singles do álbum Mellon Collie And The Infinite Sadness (1995). A história foi bem diferente lá pelas Américas, onde o debutante Gish (1991) já fora caso de culto considerável, e o subsequente Siamese Dream expôs a banda às massas. Ainda me lembro de desfrutar de ambos, quase na clandestinidade, e de me deliciar com a doce melancolia do primeiro, e depois com a descarga catalizadora da adrenalina dos nossos 20 anos do segundo.

No hiato compreendido entre o lançamento dos dois discos que realmente interessam da banda de Chicago, muito mudou tanto na estética como na abordagem às influências setentistas. Nesse espaço de dois anos perdeu-se quase em absoluto o elo de ligação às sonoridades dream-pop e shoegaze que ecoavam de Inglaterra, mas refinou-se uma identidade que, sem qualquer pudor, colhia ensinamentos das escolas progressiva e do heavy metal, então pouco ou nada identificáveis com o universo indie-rock. Por conseguinte, Siamese Dream contém uma mão cheia de descargas de electricidade, misto de fúria e desepero, propícias à velocidade de cabelos ao vento, isto no tempo em que a nossa massa capilar ainda era algo densa. O par de temas de abertura - "Cherub Rock" e "Quiet" - é demolidor nesse propósito, com cavalgadas, riffs, e solos vistosos que vão claramente beber à obra dos Black Sabath. Seguindo uma linha próxima, "Rocket" realça ecos de psicadelismo, enquanto "Geek U.S.A." adensa o peso na rapidez das batidas e numa das vocalizações mais furiosas da carreira de Billy Corgan. Ainda nesta categoria, "Today" é melódico, feliz, e ensolarado o suficiente para espelhar as raízes indie da facção ruidosa dos Smashing Pumpkins. Por oposição a este grupo de temas mais enérgicos, a banda oferece quase idêntico número de temas calmos, quase essencialmente acústicos. Se "Spaceboy" e "Disarm" têm já alguns indícios do sinfonismo que haveria de tornar a banda numa autêntica abjecção, com episódio zero no pouco modesto e desequilibrado Mellon Collie..., "Sweet Sweet" é delicioso na recuperação do soft-rock de setentas, outra das simpatias indisfraçadas que faziam dos Pumpkins aves-raras face aos contemporâneos. Melhor ainda, o derradeiro "Luna" e sua guitarra preguiçosa inscrevem-se numa linhagem anestesiante do psicadelismo. Vivendo da dinâmica daquelas sonoridades antagónicas, talvez Siamese Dream tenha os seus melhores momentos quando elas se alternam, normalmente nos temas mais longos. Com uma variação de texturas, ora a descarga eléctrica, ora a calma planante, temos o relativamente homogéneo "Hummer" e o crescendo de "Soma". Contudo, no lote destacam-se as quebras inebriantes de "Mayonaise" e os mil e um rodopios do avassalador "Silverfuck".

Pertencendo aquele grupo de discos que já não se ouvem porque já estão completamente alojados numa parte recôndita do nosso cérebro, Siamese Dream mereceu uma boa meia dúzia de audições antes de vos escrever estas linhas. Depois de lhe retirar o pó, concluo que, em termos de resistência ao tempo, fica claramente a perder para Gish. Os principais motivos para tal talvez se prendam com a produção lustrosa de Butch Vig, e sobretudo com a mistura final de Alan Moulder. O trabalho deste, caracterizado pela colagem dos instrumentos como um todo, que facilmente impressionava na altura, soa hoje datado, para não dizer algo artificial, neste tempo em que se volta a privilegiar a pureza em detrimento do aparato. Não obstante a constatação desta erosão, deixem-me dizer-vos que a experiência não deixou de ser motivo para um bom número de arrepios de nostalgia.



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