"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Discos pe(r)didos #64










SUGAR
Beaster
[Creation, 1993]



Lambidas as feridas do fim tumultuoso dos Hüsker Dü no quase predominantemente acústico Workbook (1989), disco de estreia a solo, Bob Mould estava pronto, à entrada da década de noventas, para nova investida nos mares da electricidade à frente de uma nova banda. A altura não poderia ser a mais indicada, pois as guitarras furiosas que ecoavam pelos quatro cantos do planeta tinham, invariavelmente, carimbo da obra de Mould enquanto integrante dos huskers. Neste propósito de reclamar os louros junto dos jovens discípulos formou os Sugar, mais um trio que, alegadamente, deve o nome a uma tirada do próprio, recuperada pelo baixista David Barbe, relativamente as intenções musicais do projecto - "some of the songs would be like sugar and others like spice".

Se o lado "açucarado" ficou demonstrado com Copper Blue (1992), o magnífico álbum de estreia com um inesperado sentir pop que rendeu airplay em concordância com a aclamação crítica, o lado mais negro e angustiado de Mould ficaria reservado para a meia dúzia de temas que compõem Beaster. Gravado em simultâneo com o anterior registo, este mini-álbum é um autêntico bestiário que faz jus ao título. Os dedilhados suaves de "Come Around" ainda fazem crer na esperança de alguma luminosidade mas, já neste, a submersão da voz com uma letra minimalista deixa antever o sufoco que se avizinha. As certezas chegam com a cavalgada vertiginosa de "Tilted", com aquela rispidez na voz de arame farpado que traz à memória os melhores momentos dos Hüsker Dü. A cantilena de pregador que encerra este tema, pelo meio de assombros de distorção, denuncia as questões de fé e de culpa com que se debate Beaster. A expiação dos demónios prossegue com "Judas Cradle", exercício de riffs monstruosos em regime pára-arranca e de berraria lancinante. Numa espiral descendente ao âmago do inferno interior, "JC Auto", a peça central deste pequeno compêndio de fustigação sónica, opõe momentos relativamente melódicos à velocidade trepidante que acompanha o suposto refrão, basicamente um "I know, I know, I know" descarregado com toda a fúria que os pulmões de Mould permitem. Num primeiro contacto, "Feeling Better" pode enganar pelo título e pela incursão dos sopros, mas logo que os riffs elípticos agudizam o ritmo, o equívoco é desfeito e somos de novo arrastados numa maré negra de emoções. A meia hora de calvário só tem término com "Walking Away", semi-redenção a golpes de órgão de igreja atonal e vocalizações afogadas em distorção. Embora não totalmente apaziguador, o tema de encerramento funciona como uma subida aos céus depois da violência sónica e emocional a que estivemos expostos. 


Este e os restantes discos dos Sugar, que além de Copper Blue editaram ainda o segundo e derradeiro álbum File Under: Easy Listening (1994), acabam de merecer reedição remasterizada e pejada de extras. É pois ocasião imperdível para (re)descobrir uma banda que, apesar curto período de vida e da obra escassa, deixou marca indelével na produção rock de há duas décadas.

"Tilted"

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