"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

segunda-feira, 18 de junho de 2012

10 anos é muito tempo #35









SONIC YOUTH
Murray Street
[Geffen, 2002]




A deriva experimentalista levada ao limite perto do final do milénio, como que em reacção consciente às aproximações pop da primeira metade de noventas, levou muitos devotos dos Sonic Youth à beira de um ataque de nervos. As pazes foram seladas com Murray Street, que, não sendo propriamente um disco de fácil assimilação, reintroduziu o termo "canção" no léxico das velhas raposas novaiorquinas. Gravado no rescaldo do 11 de Setembro, é também o mais reflexivo dos dezasseis ábuns da discografia "regular dos Sonic Youth, aqui a tecer considerações ambíguas sobre como tal acontecimento mudou irremediavelmente a cidade que os viu nascer. A maior evidência salta à vista logo na capa, que nos mostra os dois filhos de Kim Gordon e Thurston Moore protegidos por uma rede, numa clara alusão à paranóia pela segurança que desde então alastrou pelos quatro cantos do globo.

Como grande novidade, Murray Street traz a integração de Jim O'Rourke como membro da banda a tempo inteiro. Ao contrário do que havia sucedido com os Smog ou com os Wilco, que com ele se aventuraram na experimentação, o envolvimento com o "mago" (também responsável pela mistura final) trouxe uma maior contenção e uma especial atenção ao detalhe. A dar o mote, o inaugural "The Empty Page" envereda por um via melancólica, com Thurston Moore num registo vocal próximo das mais recentes aventuras a solo. Tema de uma beleza rara no cancioneiro dos Sonic Youth, caracteriza-se pela leveza das guitarras que, no entanto, não enjeitam as possibilidades do desalinho no segmento instrumental intermédio. Embora donos de uma maior carga eléctrica, "Disconnection Notice", "Rain On Tin", e "Radical Adults Lick Godhead Style", todos igualmente cantados por Moore, seguem uma lógica semelhante, com os longos dedilhados a alternar com as partes cantadas. O longuíssimo "Karen Revisited" pode não recuperar a fantasmagoria do tema que evoca ["Tunic, de Goo (1990)], mas concede a melhor performance vocal de Lee Ranaldo - num registo mais próximo do canto do que do habitual quase-spoken word panfletário - em toda a carreira dos Sonic Youth. Peça central do disco, "Karen Revisited" tem ainda tempo e espaço para uma progressão do quase silêncio à descarga ruidosa que uns tais Godspeed You Black Emperor! não desdenhariam. Disco atípico no que à alternância das vozes diz respeito, só no par de temas finais Murray Street permite a aparição da voz de Kim Gordon. No curto "Plastic Sun" ela desunha-se pelo meio das guitarras incisas, enquanto que no significativamente mais planante "Sympathy For The Strawberry" recupera aquele tom de gata assanhada que lhe deu fama.

Nos seus escassos sete temas, a maioria deles com durações muito para além do convencional, Murray Street é, um pouco à semelhança do magistral Daydream Nation (1988), uma espécie de meio caminho entre o rigor formal e os impulsos de rebeldia punky, sem compromissos com qualquer das partes. Se me permitem a "heresia" de tal comparação, permitam-me ainda de eleger Murray Street o último trabalho relevante da discografia dos Sonic Youth, a última ocasião em que, de facto, desbravaram fronteiras. Perdoem-me a provocação os inúmeros acólitos do mui propalado Rather Ripped (2006), que apesar de considerar um óptimo disco (como quase todos da banda), mais não será do que uma súmula de fórmulas já anteriormente usadas com alguma insistência.

 
"The Empty Page"

Sem comentários: