"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Discos pe(r)didos #33


















SCRITTI POLITTI

White Bread Black Beer
[Rough Trade, 2006]

Imagino que, por esta altura, muitos dos meus confrades se debatam com a árdua tarefa de escolher os melhores discos da década prestes a findar. Como não me vou prestar a tal esforço, proponho algo de diferente com a recuperação de um dos grandes discos esquecidos desta mesma década, daqueles que dificilmente constarão de qualquer lista, precisamente o único álbum editado sob a marca registada Scritti Politti nos últimos dez anos.
Fundados na cidade inglesa de Leeds em 1978, os Scritti Politti consistem hoje em nada mais que o alter ego do seu mentor: o galês Green Gartside. Daqueles primeiros tempos libertários do pós-punk orientados sob um restrito manifesto marxista, que incluía viver numa comuna em condições precárias, resta actualmente apenas a memória. Farto da vida miserável que lhe ia custando a vida, e com a rendição às várias expressões da música negra, Green decidiu-se por almejar o sucesso. Para tal, desenvolveu uma fórmula pop elegante e sensível. Como consequência, durante a década de 1980, tornou-se figura de adoração junto de uma vasta franja de um certo público adulto, letrado e sofisticado. Na década seguinte e até aos dias de hoje, com as escassas edições discográficas e as raríssimas aparições em palco, o nome Scritti Politti é sinónimo de um culto restrito a um diminuto número de melómanos esclarecidos.
Embora resultado de gravações caseiras, nas quais a guitarra, a voz aveludada de Green e uma dose moderada de sons sintetizados constituem os ingredientes quase exclusivos, este White Bread Black Beer continua a exibir afincadamente a marca autoral do nosso white soul boy: uma produção cuidada e opulenta a transpirar charme por todos os poros. Sendo a soul branca de alto teor de sacarina ("The Boom Boom Bap", "Throw", "Road To No Regret") a receita básica, os temas de maior pendor sintético ("After Six", "E Eleventh Nuts", "Mrs. Hughes"), tal como anteriormente aflorado pelos esquecidos Pigeonhed, recuperam o funk futurista e inigualável do Prince da melhor safra. Mas, se o pequeno génio de Minneapolis é todo ele lascívia, imagina-se o nosso bom Green como amante monogâmico e dedicado ao alvo dos seus afectos.
Entregue a temáticas mais triviais na canção pop, não se pense que Green Gartside deixou de lado os ideiais políticos que nortearam a sua juventude. Em White Bread... são diversas as referências "esquerdistas" camufladas pelo clima de mel dominante: o desejo expresso de um estado republicano à mistura com metáforas culinário-amorosas ("Cooking"), o recado aos senhores governantes desta aldeia global sob a forma de declaração de amor ("Petrococadollar"), ou a distribuição mais justa da riqueza comparada à partilha numa relação a dois ("Robin Hood").
Dias de chuva e vento como o de hoje, em que não apetece nada sair de casa, pedem luz suave, boa companhia, e Scritti Politti...


"Throw"


"After Six"

1 comentário:

strange quark disse...

Nem imaginava que estes ainda mexiam...