HAPPY MONDAYS
Lazyitis
[Factory, 1989]
Longe de imaginar que se iriam tornar nos porta-estandarte da união de facto da pop com a dance music, no "movimento" que ficou conhecido como Madchester, os ainda obscuros Happy Mondays dos dois primeiros álbuns anunciavam já um corte com o passado da lendária Factory Records. Apesar de ainda não denotarem um espírito hedonista tão vincado como sucederia a posteriori, esse par de discos, e em particular o segundo, possibilitaram um novo fôlego a uma editora com pouco mais para se vangloriar do que as glórias passadas. Com efeito, Bummed (1988) é um daqueles discos que, apesar da recepção inicial refreada, tem merecido uma reavaliação constante em termos de relevância histórica. Contando com Martin Hannett na cadeira de produtor, tem deste um trabalho exemplar, ao nível daquele que prestou para os Joy Division, embora completamente diverso. Assim, se no caso da banda de Ian Curtis Hannett sublimou uma frieza monolítica, com os Happy Mondays proporcionou um caleidoscópio de cores e pontas soltas que nos emerge num estado alucinatório a cada audição.
Não sendo propriamente o disco afecto à dança desenfreada que o frenesim acid house da época proporcionava, Bummed serviu, no entanto, de matéria prima para progressivas contaminações da tendência vigente. Como tal, uns Happy Mondays cada vez mais rendidos às linguagens dançantes sujeitaram vários dos seus temas a remisturas, e com efectivo sucesso. De todas, a mais brilhante será a do tema "Lazyitis", este com descaradas pilhagens a canções de The Beatles, Sly & The Family Stone, e David Essex. Levada a cabo por Paul Oakenfold, quando este já trabalhava na co-produção do festivo e definitivo Pills 'n' Thrills And Bellyaches (1990), a intitulada "One-Armed Boxer Remix" é um autêntico hino ao ócio, bem como a afirmação definitiva do vocalista e letrista Shaun Ryder como o poeta de rua para os novos tempos. Mais do que sublinhar com subtileza o pendor dançante da versão original, a remistura editada em single é na verdade um tema praticamente novo, na medida em que conta com a voz convidada do esquecido Karl Denver, veterano que tinha sido uma lenda country Made in Britain nos idos de sessentas. Dando luta, o velhote, qual percursor de um Mark E. Smith, bate-se de igual para igual com Shaun Ryder numa lenga-lenga rica em calão e onomatopeias surreais. Numa medida inteligente, Oakenfold optou por não incrementar em demasia o teor enérgico da remistura, antes realçando a letra, e com isso fazer de "Lazyitis" não só tema indicado para fim de noite de glória hedonista, como indicativo para o espírito do início da década que se aproximava.
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