"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

10 anos é muito tempo #22







SHELLAC
1000 Hurts
[Touch and Go, 2000]





O hiato de tempo, eventualmente motivado pelas inúmeras solicitações para "produções" de discos alheios, que separa o estreante At Action Park (1994) e Terraform (1998) não parece ter sido benéfico para Steve Albini e seus associados. Deste último, unanimemente considerado o mais desinspirado dos discos com a chancela Shellac, o trio redimiu-se volvido um par de anos com 1000 Hurts, notório passo evolutivo relativamente à corrosão gratuita que assinalou o contundente álbum de estreia.
Antes que nos demos conta do investimento numa sonoridade mais depurada, próxima do minimalismo rock, 1000 Hurts exibe, nas letras, o regresso do vitríolo dos tempos dos Big Black e dos Rapemen que valeu a Albini acusações de misoginia e homofobia. Em jeito de provocação, o tema inaugural é "Prayer To God", no qual, por entre riffs cortantes e repetitivos, Albini invoca o Criador para pedir a mais cruel das mortes para uma ex-companheira desleal e, em particular, para aquele que tomou o seu lugar. Um vociferado "just fucking kill him / I don't care if it hurts" é suficientemente esclarecedor. Como sempre com Albini, a violência verbal tem de ser entendida como uma forma distorcida de sarcasmo. Em 1000 Hurts tal é facilmente perceptível pelos inúmeros vestígios de uma ironia mais tangível: o trocadilho de geek de estúdio do título; o discurso em voz off com as especificidades técnicas que antecipa o primeiro tema; o delírio non-sense de um declamatório Bob Weston em "New Number Order", capaz de ombrear com os devaneios de um Mark E. Smith nos seus dias sim; ou o decreto "this is a sad fuckin' song / we'll be lucky if I don't bust out crying" na abertura de "Squirrel Song", uma canção sobre uma praga da espécie animal que lhe dá o nome. Neste tema, a guitarra espasmódica, o baixo metódico, e a bateria contusa são a evidência do aprumo técnico dos Shellac neste estádio do seu desenvolvimento. Tal como "Mama Gina" (mais crueldade explícita), que evolui de um segmento instrumental profusamente bluesy e esquelético, atinge o quase silêncio na parte vocalizada, e explode com o trio numa cavalgada capaz de fazer estremecer o esqueleto. Momento de maior ortodoxia, "Song Against Itself" experimenta um groove inaudito, muito por culpa do baixo propulsivo de Weston, que também lhe dá voz. Tal como começa, 1000 Hurts encerra com um número atonal, desta vez a cargo da descarga de metal cortante do monstruoso "Watch Song".


"Prayer To God"


"Squirrel Song"


"Song Against Itself"

5 comentários:

eduardo disse...

O meu preferido!
Já agora, caso não saibas, a "Squirrel song" é inspirada nos cartazes do Jay Ryan (Dianogah) que inunda os seus posters com os pequenos roedores. Não é por acaso que o livro de ilustrações tem por titulo "100 posters.134 squirrels".

M.A. disse...

Desconhecia em absoluto, Edu. Isto, estamos sempre a aprender... ;) Merci!

Shumway disse...

Não me consigo decidir entre este e o "At Action Park".
Enfim... dois grandes discos.

Abraço

Gravilha disse...

sim, é muito dificil decidir entre este e o at action park.
a proposito, saiu um excelente documentario - you weren't there, chicago punk 77-84 - com o impriscindivel testemunho do mestre albini. deve estar disponivel no youtube, ou entao aqui: http://www.regressivefilms.com/
abraço,

M.A. disse...

Eu inclino-me ligeiramente, mas muito ligeiramente, para o "At action park". Vou seguir a dica, Mr. Gravilha. Gracias!

Abraços.