"Please don't think of us as an 'indie band' as it was never meant to be a genre, and anyway we are far too outward looking for that sad tag." - Stephen Pastel

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Equally cursed and blessed


Foto: Tom Sheehan

Para além da excelência da obra discográfica, uma das principais características das melhores bandas é a escolha do momento para sair de cena, ainda que temporariamente, antes que a decadência assome. Esses são ambos predicados dos britânicos The Coral, que estão presentemente em banho-maria e por tempo indeterminado, enquanto os seus elementos se dedicam a projectos pessoais. Os atributos desta malta era já algo reconhecível aquando da edição do homónimo álbum de estreia, em 2002, mal tinham os rapazes saído da adolescência. Em plena vigência do chamado "novo rock", demasiado estilizado segundo conceitos post-punk facilmente reconhecíveis, os The Coral distinguiam-se por ir beber a fontes difusas de sessentas, algo inesperadas em gente tão jovem: dos Love a Captain Beefheart, dos Byrds a Morricone. Vários outros discos se seguiram, pejados de referências marítimas, na melhor tradição de Liverpool e arredores (Echo & The Bunnymen, The La's, Shack), num seguro e notável processo de crescimento que os fez, muito provavelmente, a banda pop/rock mais consistente deste novo século. A ter de indicar um ápice em tão equilibrada carreira, aponto para The Invisible Invasion (2005), produzido por Geoff Barrow e Adrian Utley, e no qual os The Coral procuraram nos músicos dos Portishead o apoio para consumar um depuramento da sua sonoridade.

O agrado da banda com o resultado daquele quarto álbum foi ao ponto de partir de imediato para estúdio, acompanhada da mesma dupla de produtores e com o intuito de registar um sucessor que obedecesse às mesmas premissas. Porém, os temas que ficaram registados foram então abandonados, alegadamente porque os The Coral temeram a repetição de uma fórmula em discos sucessivos. Alguns anos volvidos, uma dúzia dessas novas-velhas canções vê finalmente a luz do dia no recente The Curse Of Love, álbum que, na pior das hipóteses, serviria para matar uma sede de novidades que dura já desde 2010. No entanto, depois de o ouvir, rapidamente chegamos à conclusão de que este é muito mais do que um álbum que sirva apenas para evitar o esquecimento durante o hiato, evidência de que as "sobras" dos The Coral devem fazer inveja à obra "regular" de muita boa gente. Refira-se que o propósito inicial é conseguido, já que The Curse Of Love é o disco mais "despido" da banda, e também o de atmosferas mais densas. No entanto, essa densidade não descai para a gravidade exacerbada, já que é devidamente contra-balançada pelo sentido melódico habitual. Óptimo exemplo da dicotomia up/down são as duas versões do tema-título, que abrem e encerram o álbum: a primeira, e definitiva, num registo sea shanty funéreo; a última, e em estado primário, é uma espécie de valsa relativamente arejada. Pelo meio, a dezena de temas restante joga nesta duplicidade, com uma simplicidade assinalável, mas que deixa a nu a riqueza melódica intrínseca de qualquer canção dos The Coral. Por último, é de referir o desempenho da voz amadurecida de James Skelly, num registo bastante próximo da referência Ian McCulloch dos melhores dias, e tal como este a sublinhar o romantismo da gente jovem que carrega o peso do mundo sobre os ombros.


[Skeleton Key, 2014]

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